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Flutuantes amazônicos: tradicionais vs. modernos

Flutuantes fazem parte da vida do ribeirinho amazônico e nos rincões distantes não chegam a ser um problema, porém, se essa tradicional moradia chega à capital de um Estado, pode gerar muita confusão, ainda mais quando proliferam à velocidade de uma praga como vem ocorrendo nos últimos anos, principalmente no rio Tarumã, na capital amazonense. Os proprietários dos restaurantes flutuantes mais antigos e icônicos de Manaus não estão gostando nem um pouco do que estão vendo, pois são ‘colocados no mesmo balaio’ dos flutuantes mais novos, acusados de “enfear” e poluir as águas, e utilizados apenas para lazer, inclusive localizados no meio do rio.

“Meu flutuante foi um dos primeiros a ter uma E.T. (Estação de Tratamento) de resíduos, em 2003. Para se ter idéia, aqui foi testado o protótipo de uma E.T., hoje aperfeiçoada e obrigatória em todos os flutuantes”, revelou Iolene Barreto, proprietária do flutuante da Tia. Iolene alugou o flutuante em 1999 e o comprou em 2000 e afirma que não é fácil manter um flutuante.

“Temos que obedecer a normas da Marinha que eu considero absurdas. Nestas normas os flutuantes são tratados como se fossem balsas. Um exemplo: eles calculam a nossa capacidade de receber pessoas, digamos que na Tia seja de 120 pessoas, e temos que ter 120 bóias, como se de uma hora para outra o flutuante fosse afundar e todos precisassem de uma bóia”, lamentou.

“Sem falar que são normas confusas. A Marinha fala uma coisa, aí vem o Ipaam (Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas) e fala outra. Este ano o flutuante completa 24 anos sob a minha direção e, por incrível que pareça, os problemas que as autoridades detectam em alguns flutuantes mais novos acabam afetando a todos, inclusive os mais antigos, que sempre trabalharam direito”, desabafou.

Área totalmente preservada

A paulista Ana Scognamiglio é a proprietária do restaurante flutuante mais antigo de Manaus, o Peixe Boi, que este ano completa 35 anos no Tarumã.

“Iniciei numa casinha, em 1988, que eu comprei para passar férias, mas as pessoas, a bordo de lanchas, começaram a parar perguntando se eu vendia comida, foi quando vi que poderia ser um bom negócio, então construí o flutuante na frente da casinha. Essa casinha já era documentada, tinha uma inscrição exigida pela Marinha, pois era considerada um flutuante”, lembrou.

“Naquela época não existiam outros restaurantes flutuantes, por isso não havia muitas exigências, mas à medida que foram surgindo mais estabelecimentos, o movimento de embarcações de pequeno, médio e grande porte foi aumentando consideravelmente, bem como as exigências de extintores, bóias, coletes por parte da Marinha, e de outros órgãos de inspeção como Ipaam, Vigilância Sanitária, prefeitura (Alvará de Funcionamento) e Ibama, com as quais eu concordo plenamente, senão vira bagunça”, declarou.

Junto com o flutuante da Tia, o Peixe Boi foi um dos primeiros a testar uma E.T.

“Virgílio Viana, então secretário de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável do Estado, me propôs testar o protótipo de uma E.T. que estava sendo desenvolvida na Fucapi. Testei e desde 2003 temos E.T., muito embora, já na época da casinha nós usássemos uma caixa de ferro onde os resíduos dos banheiros eram despejados”, informou.

Ana foi presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do rio Tarumã Açu, que reúne instituições e órgãos de pesquisa ligados a situações do meio ambiente e por vários anos coordenou um mutirão de limpeza para manter preservada a área do entorno do flutuante Peixe Boi. Até hoje essa área é totalmente preservada e sem poluição visual.

Normam 11

Até o ano passado calculava-se que, só no rio Tarumã, existiam 900 flutuantes, talvez mais de mil este ano. Como num estalar de dedos, muita gente começou a mandar construir essas casas sobre o rio para explorá-las comercialmente, alugando-as para o lazer de fim de semana de amigos e famílias, e outros simplesmente para morar tranquilamente próximo às águas do Tarumã. Em poucos meses a situação fugiu do controle. Seria o surgimento de uma nova Cidade Flutuante, agora com mais organização, porém, da mesma forma causando desequilíbrio ao meio-ambiente do belo rio? Assim como aconteceu com a Cidade Flutuante, que começou na década de 1930, com um flutuante, na frente da cidade, e durou até 1967, quando quase dois mil deles foram colocados abaixo pelo governo estadual, as autoridades atuais fizeram ‘vista grossa’ para a situação. Em 2001, uma ação civil pública junto ao Ministério Público do Amazonas, pedia uma solução para o ‘inchaço’ no número de flutuantes no Tarumã. Naquela época, eles eram apenas 40. Somente em 2004 uma sentença do juiz Adalberto Carim, determinou a remoção dos estabelecimentos irregulares (aqueles que faziam o lançamento de resíduos na água, sem tratamento) e adoção de medidas para disciplinar a atividade dos que já atuavam dentro das normas da Marinha (Normam 11). A sentença não foi cumprida e, em maio do ano passado, a situação voltou ao noticiário quando a juíza Etelvina Lobo Braga mandou novamente que os flutuantes irregulares fossem retirados da região. Até agora, um ano depois, os donos dos novos flutuantes fizeram ‘ouvidos de mercador’.

Para a Marinha, os flutuantes são embarcações sem propulsão que operam em local fixo e determinado. Enquadram-se nesta definição as seguintes estruturas: postos de combustíveis, hotéis, casas, bares ou restaurantes e similares flutuantes, e devem seguir as mesmas normas das embarcações.

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Evaldo Ferreira

é repórter do Jornal do Commercio
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