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Do recrutamento destraçado de um escritor (04)

Bosco Jackmonth*

Nos artigos anteriores (01 e 03) postos aqui mesmo nesta estação de escritos semanais, anotou-se que na provável hipótese de que o livro Mundo Mundo Vasto Mundo da autoria de Carlos Gomes, já citado como consagrado contista, não tivesse sido inteiramente lido por acentuado números de leitores, voltavamo-nos então, a abordar alguns dos diversos contos anotados no Sumário, o que iniciamos por Bumbá, com as notas a respeito de um festejado boi brincante das festas juninas “que se fizera pelas mãos de Severino, preto velho maranhense; um boi de madeira o esqueleto, carne de algodão e pano velho, de couro de um veludo tão negro que azulava, a luz refletindo nele. Na testa uns chifres de verdade; entre eles a mancha lembrando uma estrela branca.” E outros pormenores, já adiantados nos outros textos.

Assim sendo, partimos para o conto seguinte “Rebolo”, cujo significado prendia-se a um dos moleques presentes que fosse alcançado para ter seu traseiro supostamente amolado para cortar a língua do boi já que a faca do Pai Francisco, se mostrava cega e sendo o organizador de toda a festa, além do matador do boi pois era o encarregado de cumprir essa ordem do amo, apresentando a língua do boi para vender para o dono da casa que contratara a dança   em frente da sua residência, onde se dava a matança do boi, sendo que a propósito, seu Afonso além de padrinho, pagava bom preço pela prenda, mais  fartura de comida. 

O ambiente então restava tomado de regozijo, enquanto se aguardava a presença do boi, que vinha a caminho pelas diversas ruas. Enquanto isso, preparava-se o terreiro, que era capinado para a festa, cortando-se salsa e matapasto, urtiga, jurubeba e outros espécimes da flora agreste, amontoando-se tudo, formando um monturo de mato seco, onde no terreno limpo ardia-se uma enorme fogueira cuja fumaça provocava lágrimas nas pessoas ao passar por perto.

Mas antes de começar a quermesse, digamos assim, os moleques punham-se a toda sorte de folguedos, como estalar foguetinhos, atirando-os uns sobre os outros, cuja prova de coragem era riscar as bombinhas e segurá-las até próximo de estalarem. Já outros punham-se a prender os estalos dentro de latas de leite condensado vazias e vê-las subir até bater nos galhos da mangueira. Quer ver, só? Indagavam em desafio… 

Enquanto as meninas, por seu turno riscavam “traques-de-velha” nas poucas calçadas, ou, quando não as punham em cima de pedras; batendo uma na outra, quando as “velhas” de pólvora soltavam sonoros “traques”, com pequeninas faíscas de fogo passageiro. Por outra também voltavam-se para adivinhações, a saber se casariam. Com quem? Passavam a toda sorte de sortilégios para ver surgir quem sabe a letra do nome do pretendente ou coisa assim. Casariam com quem? Como se chamaria ele?

Inúmeras outras “brincadeiras” se davam, a partir de “passar a fogueira”, onde se celebravam vários compadrios entre os conhecidos. Por exemplo, seu Afonso, rico que era, já tinha dezenas de afilhados, enquanto sua mulher D. Felícia também e compadres aos montes: “São João disse, São Pedro confirmou, que havemos de ser compadres, pois Jesus Cristo mandou.”, eram os dizeres de saudação.

Por fim, ouvia-se a batucada do boi, preste a dobrar a esquina, dois quarteirões próximos. Não surgira ainda o grupo, mas já o povo corria para o terreiro, para pegar bom lugar. Quem nâo queria? Os moleques é que não se importavam. Partiam mesmo era ao encontro do boi, pois buscavam sim avançar dançando, já que a cantoria das toadas mexia com eles.

Eram vistosos os brincantes que chegavam. Tomavam o terreiro de cores berrantes, portando vestimentas de lamê barato, arminho, espelhos, miçangas e penas coloridas. Bonito de se ver a exibição caprichada. Mas o episódio da matança não se dava em todas as casas, pois só quem pagasse bem teria exibição com matança. Por exemplo, seu Afonso, já se disse que além de padrinho pagava bom preço pela língua do boi, sem falar na fartura de comida. Assim era uma exibição com matança especial.

Uma vez morto o boi, Pai Francisco jocosamente indagava: Quem quer chifres? A partir do que deflagrava-se toda uma enxurrada de indiretas, envolvendo os casais presentes, sendo que os moleques começavam a se entreolhar, pois bem sabiam que se aproximava a hora de passaram baixo na apresentação: – Chico tira a língua! – A faca tá cega!. É que havia que amolar a faca e ouvia-se o rumor: – Olê, olê, olá, pega rebolo para amolar… Era gozação que só! 

Advogado (OAB/Am 436). Ex ger.BEA; Ex func.B.Brasil Man/Rio, desig.Fisc.Bcos.p/B.Central junto ags. locais volt.p/oper.moedas estrang. Curs.Direito, Com.Soc.(Jorn.), Contabilidade, Lecionou Hist.Geral. @boscojackmonthadvogados.com.br. Tel.99294-8544

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