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Natal nas páginas do JC

Natal nas páginas do JC

Fizemos um passeio ao longo dos 117 anos de publicações do Jornal do Commercio e descobrimos que as pessoas mudaram, o mundo mudou, mas a essência do Natal continua a mesma, e olha que a humanidade passou por cada situação nesses pouco mais de um século, iguais ou piores à atual pandemia do coronavírus. E o Natal se manteve lá, tocando o coração de muitas pessoas.

No primeiro Natal do JC, em 1904, um pequeno texto intitulado ‘Natal’, tem escrito em seu último parágrafo que ‘essa festa de hoje é de todos os corações catholicos, ou, por outra, é a manifestação da alegria mais intensa da alma universal’. Mais em baixo, na mesma página, outro texto intitulado ‘Natal dos pobres’ diz que ‘faremos hoje, das 9 horas da manhã em diante, a distribuição do bodo de Natal aos nossos pobres’. Bodo, que ninguém hoje em dia sabe mais o que significa, é a distribuição de alimentos (roupas e dinheiro) aos pobres em dia festivo. E lista as doações (algumas anônimas) recebidas pelo JC: de quantias em dinheiro, a paneiro de farinha, peças de chita, caixa de sabão, um bilhete de loteria e até vinhos importados do Porto.

Em 1918 o mundo vivia a epidemia da gripe espanhola, parente distante da atual covid e uma notícia no JC intitulada ‘A hespanhola’, no Natal daquele ano dizia que ‘fomos informados de que a epidemia da gripe vae declinando, sensivelmente em Porto Velho e outros pontos adjacentes’. Chama a atenção, porém, um texto bem maior intitulado ‘O Dia de Natal’ pela forma como é escrito: ‘É o dia de Natal, o dia dos presepes e das lapinhas, em que se entoam hymnos ao Messias festejado á esse tempo remotíssimo em que os pastores, pendendo rumo as estrellas, através de soutos e desertos foram encontrar em Bethlém o templo de sua adoração ao menino Jesus’. E esse é só o primeiro parágrafo.

Alegria com o fim da guerra

Em 1938 o Brasil já vivia a ditadura do governo Vargas, imposta um ano antes através do Estado Novo, mas em Manaus parecia tudo normal, tanto que, na coluna ‘Boas festas’ o interventor federal Álvaro Maia aparece por primeiro na lista de ilustres que enviaram cartões, calendários (chromos), blocos de anotações, e até vidro de perfume para a redação do JC. Sobre o interventor, o jornal publicou: ‘o dr. Alvaro Maia, interventor federal, distinguiu-nos com um cartão de cumprimentos e votos de boas festas e feliz anno novo’.

Infelizmente nossos arquivos não dispõem dos exemplares das edições dos Natais de 1939 e 1944, anos em que começou a Segunda Guerra Mundial e que o Brasil entrou no conflito, respectivamente. Seria interessante saber o que os manauaras estavam sentindo naqueles dois tristes momentos da história do mundo, em datas tão festivas, mas tem a edição de 1945, ano em que as batalhas na Europa e Ásia encerraram em definitivo.  

Depois de seis anos consecutivos sem ter motivos para comemorar o Natal, naquele ano de 1945 o JC estampou, no dia 25, a manchete ‘A família brasileira desfruta, depois da guerra, um Natal em paz!’, e logo em seguida, também em destaque: ‘O time verde-amarelo conquistou a Copa Roca’, ou seja, mesmo em tempos de guerra o futebol já alegrava o coração dos brasileiros, e melhor ainda porque a vitória foi sobre os argentinos.

No Natal de 1958, aparentemente, o mundo vivia alguma tranquilidade, mas na ‘Mensagem de Natal’ do JC parecia não ser bem assim. Dizia o texto: ‘sombrio é o momento histórico que o mundo atravessa. Dúvidas, apreensões e incertezas inquietadoras toldam de neblina os horizontes da humanidade, mas ainda cremos firmemente nas energias eternas e taumatúrgicas do Evangelho, cujas luzes redentoras podem espancar todas as trevas que se acumulam sobre o mundo…’.

Não conseguimos entender o que de tão ruim no mundo assustava o editor do JC. Talvez uma das manchetes esclareça a dúvida: ‘Otan reafirma a decisão de resistir às ameaças russas em Berlim: represália atômica se preciso’. Era a guerra fria e o mundo vivia o medo de uma Terceira Guerra Mundial agora com o uso de armas atômicas.

Natal e AI-5

Em dezembro de 1964 já vivíamos sob o poder dos militares, mas avesso à situação, o Natal encheu as páginas do JC sob as mais variadas manchetes: ‘Arthur Reis cumpriu o prometido – inaugurada ontem a iluminação da cidade’, ‘Natal do Deus menino’, ‘Almoço dos jornalistas será realizado amanhã no H.A.’. H.A. era o Hotel Amazonas ainda no auge do glamour. ‘Boas-festas ao JC’ e ‘Mensagem de Natal’, esta, mandada por Arthur Reis, o governador indicado pelos militares. E esta era só a primeira página do jornal. Nas restantes, mais e mais textos sobre a data. Seria para amenizar a situação tensa que a política enfrentava no país?

Quatro anos depois, Natal de 1968, o país já vive as trevas do AI-5, mas praticamente todas as manchetes da capa do JC lembram a data festiva: ‘Apolo chega à Lua com o Natal’, ‘Natal de Jesus’, ‘Paulo VI fala do Velho e do Novo’, enquanto as autoridades locais fingem que não sabem da situação política tensa. O arcebispo de Manaus, Dom João de Souza Lima escreveu que ‘uma luz brilhará para todos’, o prefeito Paulo Pinto Nery enviou uma ‘mensagem de Natal’ ao JC e os funcionários da prefeitura mandaram rezar uma missa em ação de graças pela data genetlíaca do prefeito. Já o então governador, Danilo Duarte de Mattos Areosa mandou publicar uma ‘saudação ao povo amazonense’ na qual escreveu: ‘neste Natal de bênçãos e de luz, em que o amor e a esperança eclodem como Seara e como Messe…’. Enquanto isso, um pequeno texto, no canto superior da página tem a seguinte manchete: ‘o Exército garante o povo’.

Nos anos seguintes o Brasil, e o mundo também, conheceriam dias negros e difíceis.

Nota

Lógico que é impossível escrever sobre os 116 Natais noticiados pelo JC, então fizemos uma escolha aleatória apenas para mostrar algumas curiosidades sobre os anos escolhidos. Detalhe: em nenhum dos materiais pesquisados apareceu a figura do Papai Noel e foi dada ênfase ao nascimento de Jesus.

Para a chegada de um novo ano o ‘Fazendo História’ trará mais manchetes do JC.     

Evaldo Ferreira

é repórter do Jornal do Commercio
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