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Cogumelos, riqueza amazônica quase inexplorada

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O que são cogumelos? Quando crianças, em histórias infantis, aprendemos que eles são casas de sapos encantados. Cogumelos são fungos, muitos deles comestíveis, e a floresta amazônica é rica de cogumelos esperando para ser explorados comercialmente.

“Fui influenciada pelo meu avô Nobuo Komagome. Ele dedicou os seus últimos 20 anos de vida ao cultivo do cogumelo shiitake (Lentinula edodes), no distrito de Maravilha, em Londrina/PR. Eu tive o privilégio de crescer participando de todos os processos do cultivo do cogumelo e sempre com a mesa farta deles. Só com cerca de 15 anos entendi que cogumelos não eram nada comuns na mesa da maioria das mesas brasileiras. Mas foi nos estágios de iniciação científica que me apaixonei pelas pesquisas sobre estes fungos”, falou a bióloga do Inpa (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia), Noemia Kazue Ishikawa.

Ao fazer doutorado na Universidade de Hokkaido (Japão), Noemia foi questionada sobre os cogumelos comestíveis do Brasil, “e eu não sabia nada sobre os nossos cogumelos nativos”, contou.

Na volta ao Brasil, Noemia já veio pensando em estudá-los.

“Na época de faculdade o Dr. Warwick Kerr (ex-diretor do INPA) havia me contado que os yanomami consumiam vários cogumelos. Tal informação me instigou a vir conhecer a Amazônia e os yanomami. A experiência foi decisiva para eu vir para Manaus morar e trabalhar no Inpa, o que aconteceu em 2004”, lembrou.

Não se deve comer qualquer cogumelo

Há 28 anos Noemia Kazue pesquisa cogumelos
 

Quinze anos depois, Noemia já conseguiu listar 42 espécies de cogumelos comestíveis.

“Eles podem ser encontrados nas florestas e capoeiras, mas até dentro do Bosque da Ciência, em Manaus, podemos observar diversas espécies como Lentinula raphanica, Pleurotus djamor, Favolus brasiliensis, Cookeina tricholoma, e Auricularia delicata”, listou.

Os cogumelos são uma ótima alternativa principalmente para pessoas que optam por alimentação vegetariana ou vegana, e são fontes de proteínas com diversidade de aminoácidos. A maioria possui todos os aminoácidos essenciais ao ser humano, aqueles que não conseguimos produzir e precisamos obter pela alimentação.

“Os cogumelos podem ser incluídos em qualquer tipo de pratos: saladas, pizzas, molhos, risotos, cozidos, sopas e onde mais se imaginar. Eu gosto mesmo é refogado com um pouco de alho e cebola”, ensinou.

Mas não se deve sair comendo qualquer cogumelo que se encontrar. Há espécies que, mesmo consumidas em pequenas quantidades, podem levar a pessoa à morte.

“Isso acontece no mundo todo, todos os anos, principalmente quando existe uma espécie venenosa muito parecida com uma que é comestível. Assim, alerto para que a população não saia coletando e consumindo os cogumelos sem a identificação de um especialista”, avisou.

“O indicado é procurar a Hutukara Associação Yanomami, que tem uma parceria com o Instituto Socioambiental. Eles comercializam cogumelos colhidos e desidratados na região de Awaris, Terra Indígena Yanomami, em Roraima. Hoje são 22 comunidades envolvidas na comercialização dos cogumelos nativos da Amazônia com cerca de 400 coletores. Em Manaus conseguimos comprar cogumelos nos restaurantes Moquém e Banzeiro, e na Galeria Amazônia”, indicou.

“Por isso, o conhecimento etnomicológico dos yanomami é tão valioso, pois eles conhecem a floresta como ninguém e as espécies comestíveis. Esse conhecimento é passando de geração para geração. Em 2016 eles me procuraram para incluir um nome científico no livro escrito por eles, ‘Ana amopö – Cogumelos’, que recebeu o prêmio Jabuti, em 2017.

Uma espécie nova para a ciência

No final do mês de junho foi lançado o livro ‘Përisi – o fungo que as mulheres yanomami usam na confecção de cestaria’, sobre o qual Noemia sabe uma história bem curiosa.

“As mulheres yanomami usam um fio preto retirado da floresta para enfeitar as cestarias. O fio preto chegava a desvalorizar o produto, pois muitos compradores achavam que era plástico. Eu tenho duas cestinhas na minha cozinha, desde 2002, e não sabia o que era aquele enfeite preto. Chamei a minha equipe, incluindo o Jadson Oliveira, especialista em grupos de fungos que formam rizomorfos, e fomos falar com as yanomami, na Reserva Adolpho Ducke, para tentar encontrar o material”, contou.

“Então as mulheres nos convidaram para ir conhecer o local onde elas coletavam o fio preto. Ao analisarmos o material, verificamos que se tratava de um fungo, e de uma espécie nova para a ciência. O fungo foi nomeado de Marasmius yanomami, em homenagem ao conhecimento das mulheres yanomami. Esperamos que com o livro todos entendam que o fio preto é um fio de fungo (rizomorfo) de uma espécie nova e valorizem cada vez mais o trabalho das yanomami”, pediu.

“De minha parte tenho que admitir que, mesmo estudando nas melhores universidades, eu não sabia que tinha uma espécie nova de fungo enfeitando a minha cozinha, mas felizmente ao unir o conhecimento das yanomami com a do taxonomista Jadson Oliveira, agora não canso de mostrar a cestinha, de 17 anos, e rir da minha ignorância”, finalizou.

Redação

Jornal mais tradicional do Estado do Amazonas, em atividade desde 1904 de forma contínua.
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