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 “Os cidadãos devem fazer a diferença em relação ao lixo”

Este mês encerrou, em Brasília, a Semana Embaixada Verde, evento que agora será anual, sempre com temas relacionados a práticas sustentáveis. Um dos principais palestrantes do evento foi Rossano Ercolini, presidente do Instituto Lixo Zero Itália. A Itália é pioneira e líder mundial na coleta seletiva de resíduos do Programa Lixo Zero. A embaixada do país, em Brasília, é a única credenciada Lixo Zero do mundo, destinando corretamente mais de 90% de seus resíduos de forma sustentável. Em entrevista ao Jornal do Commercio, Rossano Ercolini deu mais detalhes sobre o assunto.

Jornal do Commercio: Desde quando a Itália tem esta política de Lixo Zero?

Rossano Ercolini: A primeira experiência Lixo Zero da Itália e da Europa foi no município de Capannori, província De Lucca, nos anos de 1990. Atualmente, são 325 cidades envolvidas em todo o país, impactando positivamente mais de sete milhões de habitantes. Devemos especificar que na Itália a ‘popularidade’ e a eficácia da estratégia Lixo Zero se deve principalmente à sinergia entre a sociedade civil e a realidade dos municípios, e especialmente dos prefeitos. Muitas vezes são as comunidades locais e os municípios que promovem sinergias bem-sucedidas na implementação dos ‘10 passos para o Lixo Zero’, em vez de políticas ‘de cima para baixo’. A democracia a partir de baixo e a democracia das instituições municipais são a base do sucesso que na Itália está tornando o ‘Modelo Lixo Zero’ cada vez mais atraente tanto em termos de ‘narrativa’ quanto de desempenho numérico concreto.

JC: Por que a Itália é hoje considerada líder mundial em Lixo Zero?

RE: A Itália hoje é sem dúvida um dos países mais comprometidos em nível internacional em promover boas práticas de gestão de resíduos sólidos. Desde o final dos anos de 1990, a Itália já tinha municípios com taxas de coleta seletiva de resíduos acima de 75%, como no caso do pequeno município milanês de Bellusco (7.000 habitantes). Posteriormente, como resultado da terrível ‘crise do lixo de Nápoles’, com o lixo abandonado nas ruas, entre a população italiana houve evidentemente uma forte sensibilização na questão da separação do lixo. Se considerarmos também que a Itália é o segundo país mais importante da UE em termos de sua indústria manufatureira, é fácil entender por que as pessoas se deram conta de que existe realmente uma ‘mina urbana’ de grande valor ecológico e econômico na lixeira.

JC: Quais são os resultados obtidos em termos numéricos?

RE: A Itália é o primeiro país da Europa para a aplicação de modelos circulares em modelos de produção e o segundo em termos de coleta separada com um excelente 63% de coleta seletiva em escala nacional com picos atingidos em muitos municípios, não muito pequenos, até 90%. As estatísticas nos dizem que para cada mil habitantes atendidos com o modelo de coleta domiciliar de porta a porta, gera-se um emprego para a economia local. Por exemplo, na área da província de Lucca, onde começou a primeira experiência de Lixo Zero na Europa, com o primeiro município de Capannori e depois com o de Lucca, foram criados mais de 160 novos empregos em uma população de cerca de 150.000 habitantes.

JC: Em Manaus, um projeto piloto realizado em um bairro tem dado resultados satisfatórios. O segredo do sucesso é começar bairro por bairro, até chegar a toda a cidade?

RE: É sempre complicado transferir experiências de um país para outro. Em comparação com o Brasil, a Itália é um ‘país pequeno’, portanto, a comparação de resultados deve ser sempre tratada com cautela. Entretanto, podemos dizer que quando se demonstra na prática (como em Manaus) que resultados significativos podem ser obtidos mesmo em um contexto limitado, ‘abre-se o caminho pelo exemplo’ para futuros desenvolvimentos que até então eram considerados utópicos. Este também foi o caso em Capannori quando, diante do ceticismo daqueles que afirmavam que os cidadãos não eram suficientemente maduros para a coleta diferenciada de resíduos, em 1997 foi registrado um percentual de 77% de apenas 4.000 habitantes. Percebeu-se que este modelo também poderia funcionar em uma área maior e assim foi. No Brasil, onde mais da metade dos resíduos é composta de matéria orgânica, é possível obter resultados superiores a 75% de coleta seletiva imediatamente.

JC: A parte mais complexa de alcançar o Lixo Zero é aumentar a conscientização das pessoas?

RE: Sim, e cabe ao poder público sensibilizar os cidadãos, especialmente envolvendo a sociedade civil, as categorias produtivas (especialmente restaurantes) sem esquecer as escolas, a começar pelas crianças.

JC: Como o cidadão deve proceder com os resíduos sólidos produzidos em casa?

RE: Para começar, não misture os diferentes fluxos de resíduos. O lixo só existe se você misturar os resíduos todos, caso contrário se recuperam frações orgânicas, celulósicas, vidro, metais, polímeros plásticos e tecidos. A natureza não produz lixo. Só temos que aprender com ela.

JC: Além dos cidadãos, os prefeitos são os principais responsáveis pelo funcionamento da política de Lixo Zero?

RE: Sim, os prefeitos são a referência de ‘proximidade’ dos cidadãos e podem realmente impulsionar as boas práticas do Lixo Zero. Mas também devemos pedir aos fabricantes que façam sua parte, reduzindo drasticamente as embalagens, começando por aquelas feitas com plástico descartável. Lixo Zero só ganhará se nos unirmos e nos capacitarmos. Os cidadãos devem fazer a diferença, mas não devem ser deixados sozinhos.

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Evaldo Ferreira

é repórter do Jornal do Commercio
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