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Artistas plásticos da etnia mura levam a arte ancestral para o resto do Brasil

As primeiras notícias sobre os Mura surgiram ainda no século 17 e os descreviam como um povo de ampla mobilidade territorial, talvez, por isso, ainda hoje habitam vastas áreas nas regiões dos rios Madeira, Amazonas e Purus. Nos centros urbanos vivem principalmente em Manaus, Borba, Careiro da Várzea e Autazes. É neste último que vamos encontrar Tuniel Mura, morador da aldeia Murutinga, e Maira Mura, moradora do lago do Jauari.

Tuniel se especializou em desenhar e pintar grafismos indígenas nas pessoas. No recente Fest’Art Autazes, realizado naquela cidade, Tuniel promoveu a oficina ‘Grafismo corporal indígena’, atraindo um público adolescente.

“Antes eu fazia esses grafismos apenas na aldeia e publicava no meu Instagram @awaete_mura_oficial, até que a Thais Kokama, artista plástica especializada em grafismo corporal, viu minhas publicações e começou a me indicar para participar de eventos. Há três anos comecei a atuar profissionalmente. Aprendi muito com a parente Kian Sateré quando estudamos juntos o magistério”, falou.    

Tuniel lembra que os grafismos desenhados e pintados por ele são símbolos da ancestralidade de seu povo, específicos para várias situações da vida. Representam a força, a resistência, a cura, a sabedoria entre outras qualidades inerentes aos seres humanos. A tinta usada para a arte é extraída do jenipapo e Tuniel reforça que não se trata de tatuagem, mas pintura realizada com tala. A tatuagem pode ficar para a vida toda enquanto as pinturas feitas pelo jovem indígena vão sumindo, aos poucos, e pelos dez dias já desapareceram por completo, do corpo, podendo ser reavivadas ou desenhada uma nova.

Durante o Fest’Art Autazes, Turiel fez dez pinturas diferentes e revelou existirem outras que só podem ser pintadas em membros da aldeia. Descendente de uma linhagem de pajés, Turiel contou que não tem interesse em seguir com essa mística entre seu povo apesar de já ter recebido sinais sobrenaturais de que deveria fazê-lo.  

Os indígenas mura se especializaram em grafismos e desenhos de sua cultura

Além dos grafismos, Turiel também pinta quadros com auto retratos e paisagens.

“Minha arte é inteiramente voltada para a cultura indígena”, disse.

Turiel viaja por todo o Amazonas, e até outros Estados, levando a sua arte. Sua participação já está confirmada na 4ª edição da Feira de Artesanato Indígena, na praça da catedral de N. Sra. do Carmo, que acontece durante o Festival Folclórico de Parintins.

Roupas e biojoias

Maira Mura também esteve presente no Fest’Art Autazes onde realizou a oficina ‘Criação de biojoias’, que também atraiu, em sua maioria, um público adolescente. Durante o Festival, Maira manteve um estande onde apresentou, além das biojoias confeccionadas por ela, peças de vestuários com pinturas indígenas, também feitas por ela, inclusive as pinturas.

“Eu crio, costuro e pinto vestimentas tradicionais com grafismos e outras pinturas do universo indígena. Aprendi a costurar com minha mãe, que aprendeu com minha avó, que aprendeu com minha bisavó, e assim por diante. Comecei com 13 anos a fazer roupas e biojoias, e não parei mais até hoje”, contou.

Maira se considera uma multiartista. Ela pinta quadros, é modelo de suas roupas e dança as danças tradicionais de sua aldeia, além de promover desfiles com as coleções das roupas que cria. O mais recente desfile aconteceu no dia 19 passado, Dia dos Povos Indígenas, na comunidade Parque das Tribos, no Tarumã, em Manaus, onde mora. Nesse dia Maira apresentou duas coleções: ‘Rituais’, tendo seu filho Gustavo Mura, de 13 anos, como modelo; e ‘Natureza e Água’, sendo modelo a filha Macelly Yasmin Mura, de 16 anos. O tecido básico utilizado por Maira é a sacaria. Conhecido como tecido para guardanapos, nas mãos de Maira ele ganha outra dimensão, tanto que ela já criou até um vestido de noiva indígena. 100% de algodão, a sacaria foi desenvolvida para facilitar os trabalhos com pintura.

“Comecei a ficar conhecida, em 2018, principalmente por causa dos meus Instagrans: @maira.mura10 e @atelier_mairamura, onde divulgo os meus trabalhos. Meu ateliê é em casa, onde produzo minhas peças de roupa e as biojóias”, lembrou.

Na aldeia urbana, em Manaus, Maira é a tuxaua estando na liderança de 170 famílias Mura.          

“No Fest’Art Autazes ensinei a fazer biojoias utilizando sementes de árvores amazônicas como o açaí, o tucumã, a jarina, o murumuru, a paxiúba (a árvore que anda), e o morototó. É uma matéria-prima que está na natureza e pode ser transformada num belo acessório depois, dependendo da qualidade do produto final, ser vendido por um bom preço”, afirmou.

Maira também faz brincos com penas de arara, mas assegura não serem retiradas de aves abatidas.

“Nós vamos até onde as araras costumam se reunir, no alto das árvores, e lá embaixo caem muitas penas, principalmente das caldas. São essas penas que utilizamos”, garantiu.

Assim como Turiel, Maira é frequentemente convidada para participar de eventos por todo o país, onde apresenta sua arte.

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Evaldo Ferreira

é repórter do Jornal do Commercio
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