Qual o melhor método de pesquisa, ao se abordar um objeto que se queira investigar? No caso da educação, como aquilo de que ela trata é o conhecimento, pareceria correto começar a pensá-la por quem a faz, que é também em quem ela se apoia: o homem. Supõe-se, pois que o homem é o concreto. O que acentuaríamos é que se esse concreto não faz sentido, porque ele só ganha seu sentido quando a análise vai descobrindo suas determinações. Isto por que a educação é uma realidade que responde a certa causalidade e, assim, sua explicação só pode ser conseguida quando se apreende sua determinação.
O filósofo marxista Karel Kosik (1926* 2003†) asseverava que o conhecimento da realidade, o modo e a possibilidade de conhecer a realidade dependem, tão somente, de uma concepção da realidade, explícita ou implícita. Como se pode conhecer a realidade? É sempre precedida por uma questão mais fundamental: que é a realidade? Qual é o início? Muita leitura crítica, especialmente sobre a problemática vivida pelo pesquisador. E a primeira dificuldade, já pode ser vislumbrada: ao fazer-se a crítica, já se está construindo a escolha das determinações. É daí que parte o raciocínio para o entendimento da realidade.
Outro aspecto será não apenas tomar as determinações em si, mas colocá-las em relação umas com as outras, pois em si elas permanecerão estáticas e, portanto, incapazes de explicações da realidade. Um terceiro aspecto é explicar a realidade não somente para compreendê-la, mas para estabelecer as bases teóricas de sua transformação: a intencionalidade acrescenta ao método de pesquisa um componente político, que sendo importante não se pode deixar de lembrar sempre das possibilidades relativas que o método possui porque a teoria não muda o mundo, mas é uma das condições para sua mudança.
Quem faz a pesquisa, quando, onde e para que? São questões relacionadas ao pesquisar que fazem parte do método de pesquisa e de exposição porque contextualizam a problemática e, principalmente, esclarecem a opção pelas categorias simples inicialmente tomadas. Isso porque se a realidade não tem determinações, o mundo é um mundo de fenômenos, completos em si mesmos, que quando muito se articulam uns com os outros. Consequentemente, o estudo não pode chegar propriamente a explicações, mas somente a descrições das relações que cada fenômeno mantém uns com os outros.
Algumas dissertações e teses sobre Educação e Educação Escolar partem da totalidade que subjaz o contexto humano pesquisa, mas procuram analisá-la afastando-se progressivamente dos determinantes causais reais, por pura abstração, ou seja, esses estudos buscam relações mais simples e sem nenhuma (ou quase pouca) contradição entre os fenômenos sociais que compõe a totalidade investigada. Chegam sempre a estabelecer algumas relações gerais abstratas determinantes. São estas que conferem significado à totalidade viva que tinha sido o seu ponto de partida.
Quando a pesquisa é realizada a partir desse método estamos no âmbito da tão proclamada objetividade, que é o grande argumento do método positivista, oposto ao método materialismo histórico dialético. Esse é um ponto de vista que permeia a vida acadêmica, a ponto de se considerarem mais confiáveis os estudos que apresentam estatísticas e reflexões objetivas, no sentido de se referirem ao objeto em estudo, e não ao sujeito estudioso. Há casos em que a própria pesquisa é confundida com tabelas e quadros, como se fosse possível reduzir uma realidade pesquisada a números e percentuais.
O sentido do concreto real de que partem não é, pois, já dado, mas sim adquirido pela ação do pensamento, na abstração. Se a análise que aqueles mestres e doutores empreendem tem algum valor, este deriva da suposição, que certamente é a sua, de que as relações gerais abstratas, descobertas ao fim da análise, têm algo a ver com o real concreto do início, do qual partiram porque para esses pesquisadores, o científico seria o método capaz de partir do real e não se afastar dele, dispensando-se a contextualização histórica, especialmente a relacionada à existência do pesquisador.
Sabemos que a primazia do objeto sobre o sujeito produz não a objetividade, mas o objetivismo, tão unilateral quanto o subjetivismo. Objetivismo e subjetivismo são incapazes de alcançar a objetividade porque esta qualidade é uma relação de interestruturação que está na relação sujeito e objeto na organização do conhecimento, segundo a escola da epistemologia genética. Jean William Fritz Piaget (1896* 1980†) asseverava: não basta ter nascido para ser sujeito do conhecimento. Um sujeito é construído passo a passo, minuto a minuto, por força da ação própria.
O famoso epistemólogo suíço salientava, também, que essa ação no espaço e no tempo é ação sobre o meio social, econômico, cultural, nunca ação no vazio. O que isso quer dizer? Isto significa que antes de qualquer ação, existe um a priori: a organização herdada, porém esta mesma organização, por mais importante que seja, por mais numerosas que sejam as informações genéticas aí contidas, não é cognitiva stritu sensu, ela não constitui um sujeito epistêmico. Contudo, também não é o meio físico ou social que determinará simplesmente essa organização, em termos cognitivos.
O que queremos salientar é que a ação, como categoria central da epistemologia genética, é definida por Jean Piaget na sua relação com o pensamento: “pensar é agir sobre o objeto e transformá-lo” (como expressava Jean William Fritz Piaget). Portanto, já é possível entender, por esse recorte didático, a unidade sujeito versus objeto, pela ação de pensar. E também fazer a aproximação com a concepção de educação como sendo teórica e prática atuando ao mesmo tempo. Lembremos: nesse caso, teoria e prática é uma síntese constituída numa relação de tensão.
O pesquisador precisa fazer opções para se aproximar do objeto de estudo e que lhe darão os aspectos pelos quais ele poderia tomar esse objeto. Tais aspectos são chamados de categorias de conteúdo, o que remete agora à necessidade de uma definição de termos, já que são dois tipos de categorias que se apresentam, no trabalho do pesquisador: as categorias de conteúdo e as categorias da dialética materialista. É importante salientar que “teoria” e “prática” são categorias relacionadas tanto à totalidade quanto a contradição, que são categorias do método de exposição da pesquisa (dialética materialista).
O pesquisador que opta por usar o materialismo histórico dialético deve saber que existem dois tipos de categorias que serão usadas: (a) categorias de conteúdo são aqueles aspectos iniciais da realidade investigada, determinados pela constituição da análise crítica que fez o pesquisador, ao eleger seu objeto de estudo e ao se deparar com a dificuldade de tomá-lo por um ou mais aspectos que sua análise lhe indicou; (b) categorias do método de exposição são aquelas categorias que constituem a teoria que vai informar a maneira pela qual o pesquisador trabalha o seu objeto.
Quando o pesquisador toma um determinado aspecto da Educação ou da Educação Escolar em sua totalidade isso não significa que essa categoria do método de exposição da pesquisa tem o sentido equivocadamente atribuído de “tudo”, porque isso inviabilizaria um processo sério de conhecimento. Segundo Maria Aparecida Ciavatta Pantoja Franco, “a totalidade é um conjunto de fatos históricos articulados ou um contexto social do objeto em suas múltiplas relações, ou ainda um todo estruturado que se desenvolve e se cria como produção social do homem concreto”.
ARTIGO: Pesquisa em Educação e Educação Escolar: o materialismo histórico dialético (PARTE 1)
Redação
Jornal mais tradicional do Estado do Amazonas, em atividade desde 1904 de forma contínua.
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