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Botos da Amazônia ainda ameaçados

Evaldo Ferreira: @evaldo.am 

No próximo dia 27 é comemorado o Dia Mundial do Turismo. O Amazonas possui um grande potencial turístico, ainda pouco explorado e, em alguns casos, explorado de forma incorreta. É o caso dos flutuantes que recebem turistas para nadar junto aos botos e alimentá-los. Esse procedimento até foi regulamentado pelo Cemaam (Conselho Estadual de Meio Ambiente do Amazonas), em 2018, mas de lá até agora surgiram novos flutuantes desrespeitando as regras, conforme falou ao Jornal do Commercio, Gisele de Castro Maciel Valdevino, doutoranda em Biologia de Água Doce e Pesca Interior, do Laboratório de Mamíferos Aquáticos do Inpa (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia).

Jornal do Commercio: Os botos nos rios do Amazonas ainda correm risco de extinção? 

Gisele de Castro: Nos nossos rios temos duas espécies de golfinhos de rio, o tucuxi (Sotalia fluviatilis) e o boto vermelho (Inia geoffrensis). Desde 2018 as duas espécies estão classificadas na categoria ‘ameaçados de extinção’ pela IUCN (União Internacional para a Conservação da Natureza).

JC: Cessou a caça de botos para transformá-los em isca de piracatinga? 

GC: Após a publicação da moratória da piracatinga, e com as renovações desta proibição, a utilização da carne de boto vermelho como isca foi reduzida, entretanto, em monitoramento genético de filés de pescado vendidos em feiras e mercados de Manaus e Região Metropolitana, ainda encontramos filés de piracatinga sendo comercializados sob outras denominações. Isso significa necessariamente que a carne de boto esteja sendo utilizada como isca, porém, a infração à moratória existe e é em cima disso que trabalhamos para que a proibição continue. 

JC: A exploração turística destes animais é boa ou má? 

GC: Em janeiro de 2018 o Cemaam publicou uma resolução que estabelece regras para a execução das atividades turísticas com o boto vermelho no Estado do Amazonas. O nosso grupo de pesquisa fez parte da criação deste documento e atua junto aos empreendedores que realizam essas atividades. Em 2018 realizamos o 1º Curso de Boas Práticas para o Turismo de Baixo Impacto com Boto Vermelho. O curso contou com a participação de órgãos ambientais e de fiscalização, mais seis empreendedores que já realizavam a atividade turística. Estes foram capacitados conforme as regras propostas pelo Cemaam. Atualmente existe um maior número de flutuantes exercendo o turismo com botos, e que desrespeitam estas regras, uma delas é a de que os flutuantes devem ficar a distância mínima de 500 metros um dos outros que realizem a mesma atividade. É necessário que mais ações de fiscalização sejam realizadas para garantir o cumprimento das normas.

JC: A sra. acha que deveria haver fiscalização dos flutuantes que recebem turistas para nadar e alimentar botos, ou isso, de alguma forma, os protege, inclusive na parte de alimentação? 

GC: Sim, esta é uma demanda que foi proposta pela resolução do Cemaam. Os turistas ficam proibidos de alimentar os botos vermelhos. A alimentação deve ser realizada somente pelo facilitador da atividade, devidamente treinado no Curso de Boas Práticas para o Turismo de Baixo Impacto com Boto Vermelho. 

JC: Deu peixe, o boto se torna uma presa fácil. Seriam os animais mais dóceis da Amazônia? 

GC: O peixe ofertado é sim um atrativo e o boto vermelho, inteligente e curioso como é, pode se aproximar de quem lhes dá alimento repetidamente. Dessa forma eles são atraídos aos flutuantes que realizam esse tipo de turismo. O boto vermelho além de dócil é muito curioso e por isso se aproxima do ser humano, porém, mesmo sendo dóceis, são animais silvestres e que precisam ser manipulados com respeito e cuidado, evitando uma aproximação intensa por parte dos turistas.

JC: Em suas pesquisas com estes animais, a sra. fez alguma nova descoberta, ou já se sabe tudo sobre as duas espécies, tucuxi e vermelho? 

GC: Os golfinhos da Amazônia são animais encantadores e muito interessantes do ponto de vista científico. Seus ancestrais eram marinhos e se adaptaram ao ambiente de água doce e mesmo após muitas pesquisas, ainda temos muito a conhecer sobre essas espécies. As pesquisas contribuem para as classificações da IUCN e a tomada de decisões para a conservação da natureza. Tanto o boto vermelho quanto o tucuxi estão classificados na categoria ‘ameaçado de extinção’ devido às pesquisas que mostram os impactos que oferecem riscos à essas espécies. Mais pesquisas são necessárias para gerar novas informações.

JC: Suas pesquisas e projetos precisam de patrocínio de empresas locais?

GC: Pesquisas e projetos sempre necessitam de incentivos e patrocínios. Infelizmente, vivemos um momento de pouco investimento na ciência brasileira e com isso, muitas atividades científicas foram reduzidas e até mesmo finalizadas. Precisamos de novos patrocínios e financiamentos para dar continuidade às atividades já desenvolvidas e às novas pesquisas. 

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Evaldo Ferreira

é repórter do Jornal do Commercio
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