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A tentativa de censura à arte e cultura é histórica no Brasil

O país que hoje o mundo conhece por Brasil, antes da chegada dos portugueses, em 1500, era chamado por alguns dos povos autóctones de Pindorama, que significa “terra das palmeiras”. No momento inicial, os europeus imaginavam ter chegado a uma ilha, à qual deram o nome de Ilha de Vera Cruz, porque o comandante da expedição, Pedro Alvares Cabral, se dizia portador de um fragmento da verdadeira cruz na qual Jesus Cristo havia sido crucificado.

O primeiro ato de aproximação coletiva dos povos dos dois continentes consistiu em uma missa, na qual “índios” nus, “com as vergonhas expostas” e corpos pintados tentavam entender o que se passava, bem como descobrir se cada uma daquelas pessoas completamente escondidas em panos eram homens ou mulheres.

É bem provável que ninguém cogitasse que as pinturas corporais dos índios eram artísticas, e muito menos que 500 anos depois viessem a ser consideradas patrimônio cultural da humanidade, como efetivamente reconheceu a Unesco com a Arte Kusiwa do povo Wajãpi. Todavia, a mescla dos elementos referidos, como nudez, vestimentas, religião, valores diferentes, impregnaram desde então — e persistem até hoje — na forma como as manifestações culturais são vistas no Brasil, quase sempre tolhidas ou ameaçadas de censura.

A meteórica Constituição de 1934, sem meias palavras, prescrevia que “não será obstada a circulação de livros, jornais ou de quaisquer publicações, desde que os seus autores, diretores ou editores os submetam à censura”. A Constituição de 1937, não teve cerimônias em termos censórios, ao estabelecer que “todo cidadão tem o direito de manifestar o seu pensamento, oralmente, ou por escrito, impresso ou por imagens, mediante as condições e nos limites prescritos em lei”, o que incluía “a censura prévia da imprensa, do teatro, do cinematógrafo, da radiodifusão, facultando à autoridade competente proibir a circulação, a difusão ou a representação”.

Essa mesma fórmula foi reiterada pelas duas Constituições do regime militar, ou seja, pela Constituições de 1967 e de 1969, com a diferença de que a repressão foi intensa e transbordou todos os limites do razoável e do que estava normativamente estabelecido, pois além de uma estrutura reforçada de censura oficial havia as perseguições clandestinas, que compreendiam prisões, exílios e até mortes de artistas.

A Constituição de 1988, a primeira efetivamente elaborada a partir de um processo democrático, no capítulo relativo aos direitos fundamentais, estabeleceu que “é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença”. Todavia, um simples cálculo aritmético faz perceber que o novo regramento constitucional não é pacificamente aceito na vida brasileira, afinal, são 488 anos de censura contra pouco mais de três décadas das liberdades culturais. Há, portanto, um atavismo de quase meio milênio, segundo o qual as autoridades e a sociedade conviveram com a ideia de controle do conteúdo e da forma das expressões artísticas, o que reverbera até hoje e continua a gerar embaraços indesejáveis.

Foto/Destaque: Divulgação

Redação

Jornal mais tradicional do Estado do Amazonas, em atividade desde 1904 de forma contínua.
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