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Como fazer análise internacional

Breno Rodrigo de Messias Leite*

A institucionalização das Relações Internacionais no Brasil, nas últimas três décadas, é um marco digno de nota. O progresso das Relações Internacionais tem sido formidável, sobretudo na área acadêmica, nos programas de graduação e pós-graduação. Em oposição à geração anterior, fortemente marcada pela ideologia da Guerra Fria, a atual é mais consistente no emprego de métodos empíricos, no uso de instrumentos de análise de casos e na aplicação de fundamentos teóricos para explicação do sistema internacional. Além dos mais, os analistas de relações internacionais contribuem no exame de assuntos internacionais nos órgãos de imprensa e nas redes sociais. Em matéria de análise internacional, preciso dizer que estamos muito bem servidos. 

A preocupação com os assuntos internacionais tornou-se uma necessidade premente diante de um mundo tão complexo e instável. Os analistas de relações internacionais são aqueles que melhor entendem – tanto na formação acadêmica como na prática profissional – as causas estruturais e conjunturais das transformações na ordem mundial vis-à-vis os interesses nacionais dos Estados e as estratégias dos agentes privados, como empresas, ONGs, sindicatos, partidos políticos, grupos de interesses especiais, indivíduos, entre outros. Longe de corroborar com a percepção ideológica propagada pelos diferentes atores estratégicos (nacionais ou internacionais), cabe ao estudioso dos assuntos internacionais entender objetivamente a racionalidade, os interesses e as intenções dos atores dentro de um quadro mais ou menos estratégico de curto, médio ou longo prazos.

Um dos instrumentos mais utilizados pelos analistas internacionais é a análise de conjuntura. (Sem deixar de lado, é claro, a importância das análises de risco político, hoje, tão em voga dos estudos de política internacional). Por definição, a análise de conjuntura é uma ferramenta essencial para compreender tendências e eventos os quais moldam o cenário político, econômico e social de uma comunidade nacional ou das relações internacionais como um todo. A análise de conjuntura busca ainda examinar as variáveis objetivas e as flutuações dos interesses em jogo, identificando fatores de convergência, de conflito de interesses e de oportunidades.

Em um mundo cada vez mais interconectado pelos mercados, pelas tecnologias e pelas relações de poder, a capacidade de coletar dados, interpretá-los e explicá-los, a fim de prever mudanças estruturais ou conjunturais é central para formulação da tomada de decisão de indivíduos, grupos sociais e organizações governamentais. A análise de conjuntura fornece, portanto, uma sistematização lógica capaz de avaliar a interação complexa entre diferentes áreas, tais como políticas públicas, movimentos sociais, agentes econômicos, mudanças tecnológicas e eventos globais em ambientes de risco e incerteza.

Uma boa análise de conjuntura utiliza uma multiplicidade de métodos e ferramentas para coletar informações, inventariar um banco de dados e explicar o caso em questão. Vale notar que as análises de conjuntura podem incluir no seu escopo pesquisas qualitativas e quantitativas; análise proveniente de órgãos de mídia; entrevistas com especialistas e com atores estratégicos (políticos, empresários, ativistas, etc.); protocolos de estatística avançada; material cartográfico entre tantos outros meios e métodos. O objetivo da análise de conjuntura é obter informações seguras, tendo em vista a compreensão global e multidimensional do objeto em questão.

Vejamos, pois, alguns pontos fundamentais – eu diria: imprescindíveis – para consecução de uma análise de conjuntura concreta. Em primeiro lugar, deve-se avaliar o ciclo político em diferentes níveis (nacional, regional e internacional), levando-se em consideração os processos eleitorais, as elites políticas, o processo decisório, os níveis institucionais, as clivagens ideológicas dominantes, as rivalidades internas e externas, as alianças diplomáticas e as suas parcerias estratégicas. Em segundo lugar, o ciclo econômico definido em termos de indicadores econômicos (PNB, PIB, processo inflacionário, taxa de desemprego, transações comerciais, política monetária), o histórico econômico do país ou da região, os acordos econômicos internacionais, o investimento externo direto, os conflitos comerciais, a ordem financeira, etc. Em terceiro lugar, o ciclo social marcado por mudanças demográficas, padrões culturais e comportamentais, estrutura familiar, mobilidade urbana e a vida nas cidades, condições ecológicas ou socioambientais, e a emergência de novas tecnologias que afetam profundamente a sociabilidade, as relações de trabalho e o mundo da educação, como a internet das coisas, a inteligência artificial ou a uberização.  

Uma robusta análise de conjuntura das relações internacionais cria as condições objetivas e intersubjetivas para tomada de decisões estratégicas em diferentes áreas, sobretudo na política internacional, nas situações de conflito, no mundo dos mercados, nos investimentos financeiros e, claro, nas políticas de desenvolvimento local, regional ou regional. São as técnicas de avaliação da conjuntura que permitem ao analista identificar riscos e oportunidades num conjunto mais ou menos organizado de tendências, cenários e flutuações. Os imperativos da conjuntura permitem-nos, portanto, montar planos de ação racional e logicamente válidos às circunstâncias presentes e futuras.

Em um mundo caracterizado pelas incertezas e mudanças constantes, a análise de conjuntura é uma ferramenta valiosa para compreender a complexidade do presente e orientar ações rumo ao futuro desejado ou concretizável para as finalidades desejadas. Ao aplicar uma abordagem analítica rigorosa e multidisciplinar, podemos desenvolver insights profundos que nos ajudam a navegar pelos desafios e aproveitar as oportunidades que se apresentam diante de nossas (múltiplas) percepções da realidade.

*é cientista político

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