27 de julho de 2024
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A Amazônia Legal no seu equilíbrio delicado, parte II

Breno Rodrigo de Messias Leite*

Na primeira parte deste texto (https://www.jcam.com.br/artigos/a-amazonia-legal-no-seu-equilibrio-delicado-parte-i/), examinei parte do conteúdo do relatório do Banco Mundial sobre a Amazônia Legal. Na oportunidade, destaquei da leitura que fiz do relatório a partir dos seguintes temas: os aspectos socioeconômicos, a inserção da Amazônia no mundo, o processo de ocupação dos espaços urbanos e rurais, a política de proteção ambiental e das comunidades tradicionais. Doravante, abordarei a segunda parte do relatório Equilíbrio Delicado para a Amazônia Legal Brasileira: um memorando econômico, organizado por Marek Hanusch, economista-sênior do Banco Mundial.

Uma das vantagens estratégicas na política de proteção das florestas está relacionada à efetividade da governança do capital natural e da aplicação das regras mediada por instituições públicas e privadas. Ou seja, a melhoria da proteção do núcleo e do complexo florestal têm como alicerces a reforma no crédito rural, a reforma dos impostos territoriais, a regularização fundiária, o cumprimento da legislação florestal e as cadeias de valor mais sustentáveis. A combinação de tais fatores, identificados pelo relatório do Banco Mundial, podem melhorar o regime de proteção de florestas das unidades subnacionais da Amazônia Legal.

Além do mais, deve-se levar em conta os mecanismos de fomento aos meios de subsistência rurais na Amazônia Legal. O estudo aponta dois possíveis caminhos para tais práticas sustentáveis. Por um lado, o apoio à bioeconomia como um meio de preservação da cobertura florestal e fortalecimento da economia local vinculada ao mercado. Cita o relatório: “os mercados para produtos florestais produzidos de forma sustentável, em oposição aos mesmos produtos produzidos em monoculturas, permanecem pequenas, mas estão crescendo. Especialmente se os produtos forem diferenciados com um selo de sustentabilidade confiável, eles podem atender à crescente demanda dos consumidores por produtos sustentáveis e oferecer oportunidades para produtores da bioeconomia.” Em outras palavras, o mercado dos produtos da bioeconomia, dada a baixa escala de produção, permanecem como nichos, mas adquirem um diferencial econômico quando comparados aos outros produtos. Por outro, deve-se destacar a necessidade de fortalecimento da proteção social, como: aposentadorias, transferências de renda e bolsas.

O arcabouço da promoção do desenvolvimento sustentável na Amazônia Legal exige a adoção de práticas inovadoras de financiamento, aponta o relatório. A balança do financiamento se justifica quando se tem na contabilidade socioambiental as seguintes variáveis: mudanças climáticas, desenvolvimento sustentável, comunidades tradicionais e proteção das florestas. Assim, “os recursos públicos podem ser motivados pelo valor de bem público global das florestas amazônicas em pé. Embora esse financiamento se concentre nos esforços para conter o desmatamento, também poderia apoiar, de forma mais ampla, um modelo de desenvolvimento mais sustentável e inclusivo.”

A agenda transnacional do relatório, na última seção, chama a atenção. Está escrito no relatório: “o desenvolvimento na Amazônia Legal é um desafio complexo, que requer ação coordenada nos níveis global, nacional e loca. A Amazônia Legal pertence ao Brasil, mas, como suas florestas geram impactos e benefícios globais, os esforços para ajudar a preservá-la também devem ser compartilhados por todos os países.”

Esforços compartilhados funcionam como uma interface que vincula os interesses nacionais e internacionais. Afinal, “no mundo todo, inclusive no Brasil e na Amazônia Legal, consumidores, empresas e governos com uma visão mais sustentável continuam a ser essenciais nos esforços para livrar as cadeias de suprimentos e o comércio global dos modos de produção que contribuem para o desmatamento.”

Outro aspecto decisivo é o timing de implementação de políticas e complementaridades. E é aqui que a agenda do Banco Mundial para a Amazônia desvela a sua propositura: “alcançar uma transformação estrutural equilibrada é fundamental para fortalecer a maturidade econômica, e essa transformação requer investimentos em produtividade, inclusive na produtividade urbana. Enquanto a pobreza rural for alta e as áreas urbanas enfrentarem dificuldades para absolver mão de obra rural, investir nos meios de subsistência rurais e fornecer serviços básicos rurais continuarão a ser particularmente importantes. As políticas devem apoiar a transformação rural promovendo práticas de produção rural sustentáveis e inteligentes em termos de clima, inclusive na bioeconomia, e também devem preparar as populações rurais para as oportunidades geradas pelo processo de transformação estrutural e urbanização. Para garantir que as comunidades tradicionais não sejam afetadas adversamente por choques econômicos (ou outros choques, como as mudanças climáticas), os sistemas de proteção social devem proteger sua renda e modos de vida sustentáveis.”

O relatório do Banco Mundo propõe uma agenda de transnacionalização da Amazônia. Tanto naquilo que é dito, quanto no que não foi dito, e, sobretudo, naquilo que ficou silenciado, é perfeitamente possível identificar a questão amazônica e pan-amazônica como uma questão global. Não se trata aqui, é claro, de entender a Amazônia à luz única e exclusivamente dos interesses nacionais (uma soberania implacável), desvinculada das questões internacionais. Mas é impossível não ver o curso da evolução de uma agenda transnacional para a Amazônia proposta pelo Banco Mundial. É algo que salta aos olhos e este não é um problema de hoje. As autoridades civis e militares precisam coordenar urgentemente medidas de proteção da região sob pena de termos, num futuro não muito distante, problemas graves no campo da segurança e defesa. Fica aqui o alerta de um cidadão da Amazônia Legal. 

*é cientista político

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