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Símbolo da cultura abandonada

Não só Manaus, mas cidades do interior do Estado também vivenciam prédios públicos abandonados pelo poder público. Um exemplo vem de Parintins, logo Parintins, a capital amazônica da cultura. Na ilha dos bumbás a Casa de Cultura Alzira Saunier permanece abandonada há quase 25 anos. Foi, sem nunca ter sido, um espaço digno de cultura. Foi porque a população levou cultura para o prédio inconcluso.

A Casa de Cultura Alzira Saunier foi um projeto idealizado para que funcionasse como espaço para realização de cursos, estudos, lazer e demais atividades artísticas. A Casa seria um prédio dotado de auditório para formaturas, núcleos teatrais, pontos culturais, bibliotecas e receberia cursos promovidos pelo Estado.

A idéia para a construção da Casa da Cultura surgiu ainda, em 1977, mas as obras só foram iniciadas em 1990, e realizadas por cerca de dois anos, até que parte do prédio original foi demolida, em 1992, para uma reforma nunca concluída. Desde então, o que seria um prédio, está abandonado, e próximo ao bumbódromo, na av. das Nações Unidas.

Como forma de protesto pelo descaso das autoridades com o prédio, a jornalista e mestra em Sociedade e Cultura na Amazônia, Sue Anne Guimarães Cursino Pessoa, acaba de lançar o livro ‘Ruína criação – relações complexas em imagens na Casa da Cultura de Parintins’.

Ruina Criação

“O livro é resultado de minha pesquisa de mestrado, concluída em 2017, pela Ufam. Nele apresento uma análise de imagens feitas na Casa de Cultura, num concurso de painéis promovido pelo movimento social Parintins Sem Fantasia”, falou Sue Anne.

Homenagem a Alzira Saunier

“O livro resulta em discurso sim de protesto contra o abandono da Casa, mas mais do que isso, quero dizer que aquele espaço é abandonado pelo poder público, mas não pelos parintinenses, pelo movimento urbano de anônimos, movimentos sociais, artísticos, acadêmicos e partidários. A Casa não é só ruína, mas vive esse fenômeno de ruína e criação”, completou.

O nome dado ao prédio foi escolhido como forma de homenagear a professora Alzira Queiroz Saunier, referência em educação tradicional, foi diretora da Escola Estadual Araújo Filho e uma das primeiras professoras do curso primário na cidade. Alzira também foi mãe de Tonzinho Saunier, nascido em Barreirinha, mas morador de Parintins. Professor, escritor e poeta, Tonzinho escreveu ‘O magnífico folclore de Parintins’, ‘Saudade da saudade’, e ‘Parintins – memória dos acontecimentos’. Atualmente o nome da professora pouco tem ligação com o que restou do prédio, que é conhecido apenas como Casa da Cultura.

“O espaço está sendo negligenciado pelo poder público há quase 25 anos porque falta interesse político para transformá-lo num lugar que a população parintinense possa usar de forma coletiva e mais digna. É uma área bem localizada e ampla, porém, não existe interesse em dar continuidade ao projeto anterior ou fazer um novo projeto”, lamentou.

Sabe-se que, em 1996, houve um convênio entre o Ministério da Cultura e a prefeitura de Parintins para a construção do prédio. Em 1997 um Relatório de Visita Técnica do Ministério afirmava que 70% da obra havia sido concluída, porém, no mesmo ano, sob nova administração, as obras restantes foram paralisadas e materiais de construção declarados roubados.

O que falta para fazerem?

A partir daí a Casa perdeu portas, pedaços de parede, telhado e nunca mais as obras de conclusão foram retomadas. Esporadicamente acontecem movimentos de ocupação cultural. Nessas atividades, grafiteiros e artistas plásticos realizam intervenções nas paredes da Casa, e os movimentos organizam falas políticas, teatros, shows musicais, feiras, exposições artísticas e aulas públicas.

“Fiz análise de imagens e da participação do movimento artístico e do movimento social Parintins Sem Fantasia, que resultou na insatisfação popular. Foi esse movimento que promoveu o concurso Natal Sem Fantasia, do qual surgiram as imagens que analisei no meu livro. A tese que defendo no trabalho é de que o lugar não é só ruína, mas sim espaço de criação. Meu trabalho é baseado nos teóricos Edgar Morin e Etienne Samain”, explicou.

Os 19 painéis analisados por Sue Anne têm aproximadamente 2m de altura por 3m de largura, pintados diretamente nas paredes do prédio, sobre os mais diversos temas. Sue Anne entrevistou todos os 19 artistas, alguns iniciantes e outros já bem conhecidos no cenário parintinense.

“A Casa de Cultura respira e inspira cultura, nas paredes, nas ocupações temporais. Teve um tempo que tinha feirinha livre com venda de artesanato, plantas e outros produtos, além de shows musicais e aulas públicas. Ultimamente não tem tido ocupações frequentes. Existe um perigo pela estrutura ser antiga e poder inclusive desabar”, informou.

“O representante político que encabeçar a construção de algo ali vai ser verdadeiramente audacioso. Não sei o que falta para fazerem algo pelo lugar”, finalizou.       

Evaldo Ferreira

é repórter do Jornal do Commercio
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