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Redação do título do estudo

Daniel Nascimento-e-Silva, PhD

Professor e Pesquisador do Instituto Federal do Amazonas (IFAM)

Não existe uma regra formal acerca de como os títulos dos estudos científicos devem ser redigidos. Isso pode ser confirmado a partir da observação dos títulos de pesquisas publicadas nos mais diversos periódicos científicos, desde os mais renomados, como a Science e Nature, quanto os mais desconhecidos. Encontram-se títulos de uma enormidade considerável de estilos, desde os mais típicos de textos de ordem literária, como os contos e romances, até os que se aproximam de documentos eminentemente técnicos, como os manuais de usuários de equipamentos eletrônicos. Também são expressivos os títulos bombásticos, que caracterizam aquelas chamadas apontados para relatos extraordinários, mas que, de fato, estão bem abaixo do que seria de se considerar ordinários, em que prometem o que não é cumprido. Também não se deve desconsiderar aqueles títulos de endeusamento, inadmissíveis na ciência, mas que muitos periódicos publicam, em que nomes de autores consagrados são utilizados com a finalidade explícita de dar credibilidade ao texto, credibilidade esta, que, na realidade, o manuscrito não apresenta. Naturalmente que não se pretende fazer julgamento de valor acerca dessas práticas. A finalidade, aqui, é mostrar que todo título precisa dar conta de algumas exigências fundamentais e, a partir disso, propor um esquema redacional que contempla todas elas.

O desafio de todo título é sintetizar todo o conteúdo de um documento. Essa regra é geral, o que abrange desde as redações escolares praticadas desde o ensino fundamental até a mais revolucionária tese científica. Diferentemente do que muitos imaginam, o título não é um tema propriamente dito, uma vez que um tema nada mais é do que a delimitação de um assunto. Também não é uma forma de atrair a atenção de leitores, como outra quantidade expressiva de autores e leitores pensa. Essas duas formas de pensamento são danosas porque desconsideram tanto a finalidade das descobertas científicas quanto menosprezam a capacidade cognitiva dos membros das comunidades de cientistas. E, no final, fazem um desserviço, porque pesquisadores experientes dificilmente vão perder seu tempo com textos com títulos dessa natureza. Geralmente, leem o título e passam adiante. Então, o que é uma síntese?

Para compreender o desafio sintético dos títulos de manuscritos científicos é necessário que se retome a lógica das investigações. O ponto de partida é uma contextualização teórica ou empírica, para cumprir a obrigação de que toda investigação científica sempre deve apresentar uma contribuição para a ciência. O ponto de chegada é, naturalmente, a entrega dessa contribuição. A ponte que une esses dois pontos é o que chamamos de objetivo geral ou hipótese central da investigação. O objetivo geral é, portanto, aquilo que se quer alcançar, quando tomado no horizonte do tempo presente, em que a investigação ainda não foi feita; se tomado sob a ótica do futuro que já se realizou (maneira esquisita de falar do presente do futuro), esse objetivo representa aquilo que foi alcançado. E o interessante é que a frase por meio da qual ele foi redigido não precisa ser mudada. Vejamos alguns exemplos.

Se um estudo teve como objetivo geral “Medir o impacto das mudanças ambientais sobre as estruturas organizacionais de instituições de ensino tecnológico”, ele vale tanto para o presente (que ainda não foi realizado) quanto para o futuro (depois de finalizada a pesquisa). É o mesmo caso da pesquisa cujo objetivo foi “Criar um mecanismo de controle do comportamento ambiental e seu impacto sobre a estrutura organizacional do instituto federal Alfa”. Ora, se o desafio de todo título é sintetizar com fidelidade o conteúdo de um manuscrito, é sobre o objetivo geral que se deve agir. Mas é preciso atenção. Qualquer alteração significativa no objetivo geral implica em mudança na descrição do conteúdo. Em termos analógicos, é o que se chamaria de fuga do tema nas redações escolares. E, nessas redações, a nota quase sempre é zero. Editores e avaliadores experientes detectam essas fugas e sempre exigem que o título seja refeito.

Tomando o objetivo geral como base, basta que se façam pequenos ajustes no objetivo geral para que ele se transforme no título do estudo. É isso mesmo: o título vem sempre do objetivo geral. Vejamos como isso se faz. Para o nosso primeiro exemplo, um suposto título poderia ser “Mensuração do impacto das mudanças ambientais sobre as estruturas organizacionais de instituições de ensino tecnológico”. Veja que foi alterado apenas o verbo (medir), que se transformou em um substantivo (mensuração), e o acréscimo da preposição “de” para formar “do”. Tudo o mais permaneceu. No segundo exemplo, um título possível seria “Criação de um mecanismo de controle do comportamento ambiental e seu impacto sobre a estrutura organizacional do instituto federal Alfa”, com transformação do verbo e acréscimo de preposição. Simples assim. Mas duas coisas precisam ser consideradas.

Se o estudo é eminentemente científico, o objetivo geral ou hipótese central vai apontar essa finalidade; se pretender gerar tecnológica, essa natureza também deve ser sinalizada. Daí advém o cumprimento da primeira regra, de que o objetivo do estudo está vinculado a um contexto e sua redação deve reproduzir essa contextualidade. Para cumprir com adequação a segunda, que diz que o título tem que sintetizar todo o conteúdo do estudo, basta que se faça a transformação do objetivo geral através da substituição do verbo no infinitivo para um substantivo. Nada, portanto, de perder tempo com reflexões, debates, discussões e outras formas de aferição da precisão da síntese do conteúdo em uma frase curta.

Algumas vezes a frase resultante é longa demais e ultrapassa os limites definidos pelos editores e periódicos. O que fazer: quase sempre utilizam-se os recursos dos subtítulos. Assim, ao invés de “Análise da percepção dos gerentes de organizações industriais sobre a satisfação no trabalho”, escreve-se “Satisfação no trabalho: a percepção de gerentes industriais”. Se olharmos linearmente, essas duas formas de escrever são equivalentes.

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