Dia 20 último foi feriado em Manaus e em outros mais de duzentos municípios do Brasil para comemorar o Dia da Consciência Negra. Comemorar? Diria que foi mais um dia de protesto. Não que a comunidade negra, ou de afro-descendentes como querem os politicamente corretos, tenha saído pelas ruas do país a promover quebra-quebra em protesto contra os trezentos e oitenta e oito anos em que vigorou a escravidão no Brasil. Quem protestou foram os empresários, os industriários e, por incrível que pareça, até boa parte da população. A ladainha era a de sempre: é válido tirar um dia específico para se comemorar a consciência negra?
É sabido que o Brasil têm feriados demais. São onze somente de caráter nacional. O Amazonas tem dois estaduais: 5 de Setembro, Dia da Elevação do Amazonas a Categoria de Província; e 8 de Dezembro, Dia de Nossa Senhora da Conceição, padroeira do Estado. Manaus tem mais dois: 24 de Outubro, data de fundação da cidade, e, agora, 20 de Novembro, Dia da Consciência Negra. Ao todo, temos quinze feriados na cidade. Quatorze deles estão diretamente vinculados à cultura dos europeus, os colonizadores, ou dos brancos, para usar um termo mais genérico. Apenas um feriado é para lembrar que a população brasileira também é composta de negros. Mas tirar um dia para comemorar a cultura africana gera protesto e prejuízos no comércio, na indústria e para o Estado, em suas três esferas, com a perda de arrecadação dos impostos. E nos outros quatorze feriados? Será que o comércio, a indústria e o Estado, em suas três esferas, obtêm lucros?
Sendo o feriado comemorado pela primeira vez, serve como atenuante o fato de as indústrias e o comércio terem trabalhado parcialmente, até porque os trabalhadores teriam de ser reembolsados em 50% pelo dia no batente. Também há de se levar em conta que a população negra em Manaus é pequena, quase nula, se comparado a outras cidades brasileiras, como Salvador e Rio de Janeiro, onde os negros formam a maioria. No entanto, fora algumas manifestações patrocinadas pela prefeitura, que bancou o feriado, o Dia da Consciência Negra passou em brancas nuvens, com todo respeito ao trocadilho, sem maiores repercussões na sociedade local. Mas, com certeza, com o feriado sendo comemorado nos próximos anos é de se esperar que a data ganhe mais repercussão, desta vez de forma positiva, e comércio, indústria e população passem a ver o Dia da Consciência Negra como algo necessário para valorizar a cultura africana, que tão pesadamente marcou a formação de todos os brasileiros. O pouco interesse em comemorar a data, alusiva à morte de Zumbi, o chefe quilombola morto em Palmares, em 20 de novembro de 1695, em parte pode ser explicado pelo racismo enrustido que existe em cada brasileiro. Já se tentou vender a idéia de que o Brasil é um sucesso da miscigenação, no qual o preconceito racial não existe. Mas neste mesmo país, quando se tenta acabar, ou simplesmente diminuir, os privilégios das elites ricas, majoritariamente formadas por pessoas brancas, até os pobres e negros protestam. É o caso da cota para negros e índios nas universidades, que recebe críticas de todas as direções, mesmo quando se comprova com números que a maioria dos alunos das entidades de ensino público é formada por quem sempre estudou em escolas particulares. Ou seja, as universidades brasileiras públicas e gratuitas abrigam os filhos dos ricos, das elites, dos brancos, mesmo em cidades como Salvador e Rio de Janeiro.
É doloroso para qualquer um a perda de privilégios. Mas é necessária sim uma política afirmativa que abra espaço para negros e índios competirem na sociedade em igualdade de condições. O Brasil sempre foi um país injusto para negros e indígenas. Foi a última nação do mundo a abolir a escravatura dos africanos. Como por aqui não existiam grandes nações culturais indígenas, como incas