Como forma de descontração tenho visto vários vídeos e postagens nas redes sociais de pessoas “desesperadas” em casa, amarrando seus filhos porque eles não param, comendo compulsivamente pela ansiedade do confinamento, fazendo piadas das brigas e desavenças agora que “precisam” passar mais tempo com seus cônjuges, e tantas outras imagens que parecem um desabafo de quem fica em casa com “quase” desconhecidos.
Certamente é uma maneira de brincar com o cenário de isolamento social, mas também pode representar um pedido de socorro sobre a dificuldade em lidar com o “ficar em casa 24 horas por dia” convivendo com as inseguranças, incertezas, medos pessoais, na medida em que também se deparam com os conflitos e ansiedades das outras pessoas da casa.
É provável que muitos estivessem em uma rotina frenética de trabalho, estudos e compromissos que não passavam tanto tempo junto com a família, e seus lares estavam mais em formato de dormitório, onde os encontros eram casuais e muitos deles em frente a TV ou passando o tempo na internet, sem tanta interação e convivência real.
Infelizmente, muitas casas não estavam em configuração de lar e muitas pessoas formavam agrupamentos ao invés de famílias. Vamos pensar juntos em qual a diferença entre casa e lar? E qual a diferença entre agrupamento e família?
Eu penso em casa como uma construção física, de madeira, de tijolo, de barro, mas lar é uma construção de relações de amor, é uma relação de vínculo por princípios, cuidados e valores.
Casa é a estrutura para nos abrigarmos da chuva, nos escondermos do sol forte, termos cômodos para realizarmos as refeições, dormirmos e afins. O lar é o ambiente emocional onde alimentamos uns aos outros de carinho, atenção, e compartilhamos sonhos com pessoas queridas. Casa é o cuidado com a parede, para não riscar, com os móveis e utensílios, para não quebrar. O lar conta histórias em cada risco no chão, e traz uma memória afetiva em cada peça inteira, ou quebrada, que vai marcando nossa linha da vida.
Quando estamos mais tempo em #fiqueemcasa estamos sendo convidados a encontrar pessoas que antes eram cumprimentadas cordialmente. Agora que estamos mergulhados todos os dias em nossa casa podemos transformar, com essa convivência, nossa casa em um lar. Com companheiros que mesmo na divergência se apoiam, se solidarizam, que se divertem e descobrem diariamente os seres humanos incríveis, que com qualidades e defeitos, formam a nossa família. Neste momento em que ficamos em casa e por muito mais tempo com as pessoas da nossa casa, o desafio é que a transformemos urgentemente em um lar. Se as pessoas de sua convivência eram apenas conhecidos que o destino lhe entregou, convido a enxergá-los como família, a criar oportunidades e explorar possibilidades de gerar conexões com estas pessoas que antes você não tinha tempo para fazê-lo.
E o que é mesmo família? Cada um de nós pode ter uma definição específica sobre o que é ser ou ter uma família, bem como a forma como ela é constituída ou a espécie de configuração que ela deve ter. Para mim, família é o amor materializado em elos onde mesmo com as diferenças pessoais possa existir a harmonia, afetos, proteção e todo tipo de apoio necessário para resolução de conflitos, problemas e dificuldades individuais ou do grupo. É o seio seguro de confiança, segurança, conforto e bem-estar. É o estado de ser único e ao mesmo tempo ser plural ao transformar-se, pela pura certeza de que juntos somos muito mais e muito melhores.
Eu não tenho uma receita de bolo para transformar casas em lares e nem um agrupamento de pessoas em famílias, mas podemos ensaiar juntos algumas ações cotidianas que gerem mais integração, união, contribuição, e o mais importante: a firme convicção de que a mudança não acontece no outro, mas em você na direção do outro.
Quais ressentimentos, mágoas e outros sentimentos tóxicos você nutriu por algumas dessas pessoas que pode perdoar hoje? Talvez você não consiga ir lá dizer que perdoa. Mas que tal fazer uma carta, mesmo que não entregue, dizendo o que você sentiu e que está disposto a deixar para trás e assim começar uma nova história? Reconhecer a sensação negativa, elaborar um novo pensamento e encontrar um sentimento nobre para a relação já é um passo muito importante.
Quais novos comportamentos está disposto a colocar em ação para mostrar-se mais presente emocionalmente e não apenas fisicamente? Lembre-se a todo instante que os resultados chegam até nós através de nossas atitudes. O que pode fazer no ambiente físico e na relação com as pessoas para demonstrar seu cuidado e seu carinho? Fazer uma faxina voluntária com alegria, zelando pela casa como alguém que ama o seu lar? Cozinhar ou aprender a cozinhar para fazer um mimo para alguém, com um prato que sabe que ela vai gostar? Ou quem sabe apenas namorar? Tenho certeza que se você desejar realmente e profundamente fazer esta transformação, terá a criatividade necessária para fazer o que melhor combinar com o seu momento.
Nossa casa pode ser nosso próprio altar, sem um templo físico externo para evoluirmos espiritualmente. Faça do seu lar um lugar de oração, de meditação, de contemplação ao seu divino Deus. Encontre em sua casa, um espaço de aprendizado para ler, estudar, ensinar e ser a própria escola. A sua casa pode ser o seu trabalho ao usar seus dons e talentos a serviço de tarefas rotineiras, e ao mesmo tempo onde as suas habilidades serão usadas e aprimoradas. A sua casa pode ser o seu lar e todas as pessoas dentro dela a sua família.
*Cíntia Lima é Psicóloga, Master Coach e Mentora Organizacional [email protected] – 92 981004470
Fonte: Cíntia Lima