Reginaldo de Oliveira*
E-mail: [email protected] / BLOG: www.doutorimposto.com.br
O fato de pagarmos a mais perversa tributação do consumo nos faz imaginar que temos um governo tirânico e opressor. Na verdade, os nossos agentes públicos são covardes, incompetentes e atabalhoados; mas também são malandros e embusteiros. A grande arte que o político deve esgrimir com maestria está na dissimulação e na cara de pau. Por outro lado, o povão é um dos mais tapados do mundo. Assim, temos a cobra cega contra o sapo aleijado. Se o brasileiro tivesse um pouquinho de discernimento e de bom senso, os políticos estariam desempregados. Os funcionários públicos fantasmas ou de salários astronômicos ou incompetentes ou apadrinhados devem agradecer a Deus todos os dias pela passividade dum povo engolidor de sapo que ainda se mata de trabalhar pra sustentar vagabundo e corrupto.
Com a corrupção pulsando freneticamente no setor público, fica claro que tudo é negociado e tudo está à venda; principalmente o legislador (a prova está no contencioso de R$5 trilhões). Por consequência, o nosso sistema tributário é um festival de esperteza, onde os mais fortes jogam o peso nas costas dos pequenos. E para comprovar a epidemia de negociatas, basta ir atrás das isenções fiscais e então descobrir que muitos beneficiários são oligarcas entranhados no poder político. O grande desafio está na abertura da caixa preta que permanece lacrada no mais profundo dos oceanos. Muitos vão dizer que vivemos numa democracia protegida por instituições de controle. O problema é que tais instituições são públicas. Precisamos entender uma coisa: O setor público é um corpo só. Desse modo, a mão não vai ferir a perna do mesmo corpo. Como certa vez me disse um conselheiro do tribunal de contas, “o poder se protege”.
Voltando à questão da malandragem, pagamos a mais perversa tributação do consumo por conta dum mecanismo chamado de “imposto por dentro”, que obriga o comerciante a embutir os tributos no produto de forma que não seja reconhecido pelo consumidor. A Sefaz, por exemplo, pode mandar prender o comerciante que pagar ICMS sobre o preço do produto sem antes esconder esse mesmo ICMS dentro do produto. Tal procedimento configura crime contra a ordem tributária por violação do parágrafo 1 do artigo 13 do RICMS/AM. Além de inventar esse mecanismo diabólico para enganar o consumidor, o funcionário público promove uma campanha difamatória que culpa a ganância do comerciante pela alta dos preços. Desse modo, os impostos em nada pesam no bolso do consumidor. Inclusive, a primeira dama fez uma declaração nesse sentido. E outras autoridades também vivem dizendo que imposto e preço não têm nada a ver um com o outro. É assim que se descobre o nível de vagabundagem daqueles que estão no setor público vivendo às nossas custas.
Nos últimos tempos, dois eventos curiosos tomaram conta do noticiário. Um deles tem a ver com a polêmica classificação de energia elétrica, combustível e telefone na mesma categoria de joias e armas de fogo. Na verdade, essa discussão é bem antiga, mas a pressão do Bolsonaro obrigou o agente fazendário a rever o assunto. Isso mostrou que o agente público fica medroso quando acuado. Mas então, entra em cena a velha malandragem que criou um clima de insegurança financeira, levando os governadores a jogar o ICMS lá pra cima. E agora, com o ICMS majorado, os malandros querem a volta da antiga carga confiscatória da energia, telefone e combustível. A prova de que os deputados amazonenses são operados por controle remoto está na Lei 6108/2022, em que ninguém viu os buracos no item 42 do Anexo XX e no item 49 do Anexo XI. Ou seja, a montoeira de funcionários da Sefaz mais os trocentos assessores dos deputados não enxergaram esses dois produtos sem MVA. E mesmo assim, e sem base legal, a Sefaz passou uns cinco meses taxando esses produtos ilegalmente. Na verdade, nem a Sefaz, nem os deputados nem funcionário público nenhum liga pra legalidade. Vivemos num ambiente de total avacalhação porque o povo é avacalhado.
Outro evento curioso tem como pano de fundo a reclamação dos clientes da Shopee, AliExpress, Shein etc., com a taxação dos produtos comprados pela internet. Ou seja, produtos baratinhos e livres do Custo Brasil revoltou o comerciante brasileiro que exigiu equidade fiscal. Começou então o chafurdo dos nossos governantes, que uma hora faz dum jeito, depois muda de ideia; e vai lá e vem cá; puxa, encolhe e por fim, inicia agora em agosto mais um sistema taxativo. O motivo de tanto rebuliço normativo está na busca por um modelo que possa aparentar uma coisa, mas ser outra totalmente diferente. Obviamente, que exercício de contorcionismo é uma especialidade dos agentes fazendários. E para acalmar o comerciante reclamão, o governo inventou várias taxações. E para acalmar o consumidor revoltado, o governo faz vista grossa sobre as manobras dos estrangeiros que declaram valores infinitamente menores que reduzem drasticamente as taxações. Pra se ter ideia, um equipamento de informática que custa R$500 é declarado por US$13 (youtu.be/UecrN29XG1c)
Essa confusão toda da Shopee nos faz perguntar por que não acontece a mesma revolta com os produtos fabricados no Brasil, em que pesam os impostos, a burocracia, a incompetência governamental, a roubalheira, a corrução, a bandidagem etc. Essa confusão da Shopee nos faz questionar se de fato os futuros IBS, CBS e IS serão mesmo cobrados “por fora”. Eu aposto que essa possibilidade apavora o fisco, como também tira o sono dos ricaços que não pagam imposto de renda. Porque, no momento em que o consumidor ver o tamanho da facada, ele vai incendiar o país. E só depois duma revolução violenta é que o governo será obrigado a implantar um sistema progressivo de tributação. Curta e siga @doutorimposto. Outros 483 artigos estão disponíveis no site www.next.cnt.br como também está disponível o calendário de treinamentos ICMS.
* é consultor empresarial, palestrante, professor do ensino superior e especialista em capacitação profissional nas áreas de ICMS Básico e ICMS Substituição Tributária.