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“LOUCURA” X “NORMALIDADE”

Já dizia Raul Seixas que “a arte de ser louco é jamais cometer a loucura de ser um sujeito normal”. E, de fato, embora a sociedade insista em dividir as pessoas em dois grandes grupos, o dos “normais” e o dos “loucos” (digamos assim, por enquanto), cabe indagar se teríamos todos a mais acertada ideia do que é normalidade. Além disso, não seria demais questionar se estamos mesmo preparados para identificar a dita “loucura” em nossos semelhantes. 

Segundo o dicionário Houaiss, loucura consistiria em “um distúrbio da mente do indivíduo que o afasta de seus métodos habituais de pensar, sentir e agir”. Partindo dessa definição, acabaríamos chegando à interessante conclusão de que o sujeito que se distancia de sua verdadeira essência, deixando de ser quem realmente é para ser simplesmente aceito, para se sentir integrante de um meio social que impõe regras de comportamento, deve ser considerado louco, não é mesmo? Porém, para a sociedade, esse é o sujeito “normal”. É paradoxal que, para se submeter ao conceito de normalidade, alguém precise, muitas vezes, renunciar à sua porção racional.

A loucura talvez esteja ligada à perda da razão, embora a compreensão do que signifique abrir mão da razão envolva considerável dose de subjetividade. É tudo uma questão de ponto de vista. Assim como nos pequenos acidentes de trânsito acreditamos que o errado é sempre o outro motorista envolvido, também costumamos entender que, nas diversas situações da vida, a razão sempre falta ao outro. Nunca a nós mesmos. Então, tudo depende do aspecto sob o qual se desenha um conceito, um paradigma.

Tão comum quanto lamentável é a associação do termo “louco”, de modo pejorativo, aos portadores de doenças mentais graves. Por outro lado, há até mesmo quem utilize a expressão sob um viés positivo, para qualificar alguém com uma conduta destacável, admirável, ousada, genial, como ocorre quando se fala em “loucuras de amor”, por exemplo.   

É certo, portanto, que os tradicionais conceitos de normalidade e loucura tendem a ser subjetivos, superficiais, por vezes utópicos e – por que não dizer – estigmatizantes. 

Do ponto de vista da psicopatologia, a ciência que estuda o adoecimento mental, o conceito de normalidade está atrelado a saúde emocional, mas não deixa de ser bastante controvertido. O Professor Paulo Dalgalarrondo, da UNICAMP, em sua obra “Psicopatologia e Semiologia dos Transtornos Mentais” (Editora Artmed, 2ª edição, 2008), bem apresenta os vários prismas sob os quais a normalidade pode ser definida: ausência de doença, sinônimo de bem estar, fenômeno quantitativo (ou seja, aquilo que se observa com mais frequência), ausência de disfunção, processo dinâmico do desenvolvimento psicossocial, percepção subjetiva do próprio sujeito em relação ao seu estado de saúde, liberdade existencial ou ainda, simplesmente, um status arbitrário, operacional, previamente definido a partir de parâmetros científicos.

Não obstante, depois de propor a enumeração em destaque, o próprio Prof. Dalgalarrondo conclui que os critérios de normalidade e de doença, em psicopatologia, variam em função dos fenômenos com os quais se trabalha e de acordo com as convicções filosóficas do profissional. Chama a atenção, também, para a necessidade de uma constante postura crítica e reflexiva acerca de tais parâmetros, por parte dos profissionais de saúde mental.

Enfim, podemos dizer que a sanidade está, essencialmente, na capacidade de respeitar o outro, de desenvolver empatia, de reagir adequadamente às situações, tudo sem precisar abrir mão de sua própria essência, de ser quem simplesmente se é.

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