14 de outubro de 2024

Duas Fábricas Sustentáveis de Hidrogênio Verde

O Hidrogênio Verde (HV) tem sido apontado nas Conferências da ONU como solução promissora para descarbonizar setores cruciais da economia. Este artigo destaca duas usinas inovadoras em operação no Japão e no Canadá, que produzem H2 a partir de fontes renováveis. Essas iniciativas pioneiras, longe de serem ainda perfeitas, estão abrindo caminho para um futuro mais equilibrando entre a eficiência energética e a conservação ambiental. 

Reduzir emissões de gases do efeito estufa, especialmente CO2, está na pauta climática global desde a primeira COP em 1995. Porém, na COP26 (Glasgow, 2021), além dos avanços da Campanha da ONU Race to Zero <https://tinyurl.com/548wa4ny>, diversos projetos, financiamentos e medidas viabilizadoras foram apresentados envolvendo o HV, tais como o Painel de Políticas de Catapulta de HV<https://greenh2catapult.com/>, o Roteiro de Medidas de Viabilização para o HV e <https://tinyurl.com/3snb2m8p e https://tinyurl.com/26e4axcn> e o Catálogo Compacto de HV. 

Além disso, na COP26 foi lançada uma Agenda de Avanços, com 41 países ou regiões <https://tinyurl.com/3xwkszpb> assumindo o compromisso de acelerar o desenvolvimento e implementação de tecnologias limpas e soluções sustentáveis nesta década tão decisiva para o clima. Infelizmente, naquela ocasião o Brasil não quis participar dessa Agenda, valendo lembrar que os representantes máximos do país (Bolsonaro e Mourão) não compareceram ao evento, em função da imagem negativa que a gestão deles tinha adquirido devido à má gestão e aos diversos retrocessos relacionados às questões ambientais.

O fato é que entre as tecnologias limpas nas quais os países da Agenda de Avanços estão trabalhando, encontra-se o HV. E abaixo há duas plantas fabris que foram construídas para testes pilotos e que estão obtendo bons resultados:

1. Fukushima Hydrogen Energy Research Field (FH2R)

Conforme publicado no JCAM o Japão foi o primeiro país a criar uma estratégia nacional para o Hidrogênio em 2017. Como resultado dessa estratégia, uma planta de HV foi inaugurada em março/20, na cidade de Namie, Prefeitura de Fukushima, perto do Oceano Pacífico, região que sofreu muito com terremotos e tsunamis no ano de 2011.

Basicamente, a planta de FH2R é resultado de um esforço nacional conjunto envolvendo a Nova Organização de Desenvolvimento de Tecnologia de Energia e Industrial (NEDO), a Toshiba Sistemas e Soluções de Energia Corporação (Toshiba ESS), a Companhia de Energia Elétrica de Tohoku, Inc. e a Corporação Iwatani.

Segundo a NEDO <https://tinyurl.com/2s3vbfu7>, FH2R é um projeto experimental que utiliza instalações de geração de energia solar de 20MW em um local de 180000 m2, junto com energia da rede para conduzir a eletrólise da água em uma unidade de produção de hidrogênio de classe 10MW movida à energia renovável. Ela tem capacidade para produzir, armazenar e fornecer até 1.200 Nm3 de hidrogênio por hora, 24h por dia (operação com potência nominal), gerando quantidade suficiente em um dia para abastecer 150 casas ou 560 veículos elétricos.

A planta tem a capacidade de fabricar anualmente cerca de 900 toneladas de hidrogênio e está sendo usada para fazer projetos experimentais que permitam ampliar a aplicabilidade e reduzir custos ao longo do tempo. Neste documento <https://tinyurl.com/2frz9yh8> há um resumo do modelo de negócios desta planta e aqui <https://tinyurl.com/5jxvhufj> há um artigo científico.

Durante a visita que realizei à NEDO em 21/10/22, conforme registrado em <https://tinyurl.com/5am3sz8a>, fui informado que seria viável reaplicar a fábrica FH2R no Brasil, por meio de uma parceria entre as autoridades governamentais e uma das empresas japonesas envolvidas com o projeto (Ex.: Toshiba ESS). Dessa forma, a empresa japonesa poderia desenvolver um projeto e submetê-lo à NEDO para análise de viabilidade técnica e financeira, com a possibilidade de apoio financeiro e técnico do governo japonês.

2. Bécancour PEM Green Hydrogen Plant
No artigo da semana passada, o nobre leitor Norberto Saggioro perguntou se seria possível uma fábrica de Hidrogênio Verde utilizar de água doce para realizar a eletrólise e a resposta é SIM e este é um exemplo.

Esta planta foi inaugurada em janeiro/21 em Bécancour, Québec, Canadá, e está próxima do Rio São Lourenço.

O projeto foi capitaneado pela francesa Air Liquide em parceria com a Hatch <https://tinyurl.com/2zenwary> e eles usam o eletrolisador PEM (Proton Exchange Membrane), de 20 MW, cujo sistema foi projetado para produzir até 8,2 toneladas de H2/dia utilizando energia renovável, eliminando cerca de 27.000 toneladas de CO2 por ano que seriam despejados na atmosfera pelo processo tradicional.

O Eletrolisador PEM utiliza uma membrana polimérica como o eletrólito para separar o hidrogênio e o oxigênio produzidos pela eletrólise da água. Essa membrana só permite a passagem de prótons, bloqueando a passagem de elétrons. Aqui vale ressaltar que a água do rio precisa passar por um tratamento prévio antes de ser utilizada, já que contém impurezas, sais minerais e sedimentos que podem afetar o desempenho e a vida útil do sistema.

Segundo a Air Liquide, a instalação de Bécancour, que é abastecida por 99% de eletricidade hidrelétrica local renovável da Hydro-Québec, está produzindo quase 3.000 toneladas anualmente, o suficiente para abastecer mais de 2.000 carros, 16.000 empilhadeiras, 275 ônibus ou 230 caminhões grandes. Essa capacidade de produção possibilita fornecer aos clientes canadenses e norte-americanos um hidrogênio descarbonizado de alta pureza, ajudando-as a reduzir sua pegada de carbono.

E para os céticos, ai vai um artigo científico <https://tinyurl.com/bdhnpxtm> e um release da Air Liquide, publicado em 24/10/23, no qual anunciou em Paris <https://tinyurl.com/2yvddvsc> um investimento de mais de 140 milhões de euros para transformar Bécancour, Quebec, em uma plataforma avançada de fornecimento de gases industriais de baixo carbono, incluindo hidrogênio, oxigênio, nitrogênio e argônio. Além do eletrolisador PEM de 20 MW do Grupo, um dos  maiores do mundo em operação, a infraestrutura criada pela Air Liquide incluirá uma nova unidade de separação de ar produzindo oxigênio e nitrogênio renováveis, bem como capacidade de armazenamento líquido, conectados por uma rede local de pipelines para melhor atender os clientes.

Diante das características singulares do Amazonas, incluindo sua exuberância solar, extensos recursos hídricos e o PIM, a região se destaca como um polo potencial para liderar a produção de energia solar e hidrogênio verde. A implementação de políticas de incentivo estratégicas poderia propiciar testes e posterior disseminação de usinas de eletrólise no PIM e em todo o interior, capacitando a produção local de um combustível totalmente limpo a partir da água e do calor do Sol. Estas iniciativas não apenas energizariam unidades fabris, frotas de veículos, comunidades remotas e a indústria regional, mas também abririam caminho para uma nova era de desenvolvimento econômico sustentável na região tropical do Amazonas.

Jonas Gomes

Prof. Dr. Jonas Gomes da Silva - Professor Associado do Dep. de Engenharia de Produção com Pós Doutorado iniciado no ano de 2020 em Inovação pela Escola de Negócios da Universidade de Manchester. E-mail: [email protected].

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