10 de dezembro de 2024

As lições de Cortella e Guimarães Rosa

*Augusto Bernardo Cecílio

O texto “Não nascemos prontos…”, de Mario Sergio Cortella, inicia citando Guimarães Rosa que dizia: “O animal satisfeito dorme”. E alerta que por trás dessa aparente obviedade está um dos mais profundos alertas contra o risco de cairmos na monotonia existencial, na redundância afetiva e na indigência intelectual.

O que o escritor tão bem percebeu é que a condição humana perde substância e energia vital toda vez que se sente plenamente confortável com a maneira como as coisas já estão, rendendo-se à sedução do repouso e imobilizando-se na acomodação.

A advertência é preciosa: não esquecer que a satisfação conclui, encerra, termina; a satisfação não deixa margem para a continuidade, para o prosseguimento, para a persistência, para o desdobramento. A satisfação acalma, limita, amortece.

O texto de Cortella é um importante alerta para qualquer sociedade mundo afora e cai que nem uma luva sobre grande parcela da população brasileira, visto que muitos estão acomodados, deixando o tempo passar, sem um olhar atento ou preocupado aos acontecimentos ao seu redor, na sua cidade, no seu Estado ou no próprio País.

Muitos acreditam que por estarem em condições confortáveis, acomodados, com bons empregos e estabelecidos no mercado de trabalho e na sociedade já é o bastante. Mas não é! Tudo faz parte de uma engrenagem onde os demais também interessam, e muito, para que os frutos desse País sejam compartilhados entre todos, na medida certa, a fim de que a coletividade se sinta alcançada, beneficiada e feliz.

No tocante à participação popular na vida da Nação, outro fato importante e necessário, alguns acham que só votar já basta, e muitos só vão votar obrigados, para evitar multas. A participação vai muito além do voto, que deve ser consciente e responsável. Exige do cidadão um olhar atento sobre tudo que esteja ocorrendo aqui e lá, em qualquer lugar do Brasil, pois tudo está interligado.

Estar atento passa por participar da arrecadação tributária e acima de tudo acompanhar a qualidade dos gastos públicos, para ver se o que foi arrecadado está sendo bem aplicado em obras e serviços públicos de qualidade, que é a razão da existência do Estado brasileiro, em busca do bem estar da coletividade.

Para que haja uma participação efetiva da população nesse processo de transformação da sociedade, é fundamental conhecer o funcionamento do Estado, os direitos e deveres dos cidadãos, os poderes constituídos, a Constituição de 1988, enfim, que os brasileiros tenham informações básicas de como o Brasil funciona. De posse dessas informações, os brasileiros poderão agir com firmeza e com a certeza de que estarão fazendo a coisa certa, podendo exigir e não pedir esmolas e agrados de políticos.

Quando vemos pessoas vendendo os seus votos ou trocando por pequenos favores, ou quando vemos brasileiros fechando os olhos para os desmandos e tantas coisas erradas, aí temos a certeza de que ainda temos muito a avançar, a progredir, a evoluir.

É fundamental, por fim, que as pessoas sejam mais solidárias e não pensem somente em si. Sociedade evoluída é aquela em que governantes e governados se respeitam e onde ninguém é deixado para trás, pois ninguém pode ser considerado feliz tendo um vizinho “vivendo” ou sobrevivendo abaixo da linha da pobreza.

*Auditor fiscal e professor

Augusto Bernardo

é auditor fiscal de tributos estaduais da Secretaria de Estado da Fazenda do Amazonas e educador. Foi um dos fundadores do Programa Nacional de Educação Tributária (atualmente nomeado de Educação Fiscal).

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