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O continente da esperança

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PEÑA ESCLUSA, Alejandro. O Continente da Esperança. Tradução de Graça Salgueiro. São Paulo: É Realizações, 2006.

Alejandro Peña Esclusa uma figura única na vida pública e intelectual da América Latina. Venezuelano, formado em engenharia, empresário, católico e mestre em karatê, Peña Esclusa tornou-se um dos mais destacados inimigos políticos do regime bolivariano, liderado por Hugo Chávez e Nicolás Maduro, que tomou de assalto o regime democrático de seu país. A sua prisão trouxe à tona a radicalização do regime e evidenciou ainda mais o nível da violência do regime contra os seus opositores – agora, tratados como seus inimigos.

Em sua obra, O Continente da Esperança, é um agradável libelo à liberdade e ao Estado de Direito Democrático com todas as contingências de nosso tempo. Peña Esclusa examina os principais problemas do continente sem perder de vista o desejo de superar as barreiras do atraso e da irracionalidade, principalmente do mal que atingiu o seu país, o chavismo.

O “continente da esperança”, nos dizeres de São João Paulo II, é a América Latina. Apesar de encontrar-se afundado em pobreza, subdesenvolvimento e outras assimetrias estruturais, o continente latino-americano pode significar uma esperança e fonte de otimismo para a humanidade, pois é um oásis de riquezas e belezas, mas que merece despertar um sono – ou talvez um pesadelo? – de uma ordem psicossocial desajustada e marcadamente pré-moderna. A superação dessa barreira pode ter como signo próprio a combinação daquilo que é tradicional e moderno sem perder as suas raízes, sem sacrificar o seu futuro em nome do progresso.

Bem diferente do resto do mundo, o comunismo ainda é uma ameaça na América Latina. Mesmo depois da queda do Muro de Berlim, advento da globalização e terceira onda de democratização, Fidel Castro e Luiz Inácio Lula da Silva conseguiram articular o Foro de São Paulo e Fórum Social Mundial. Ambos cumprem funções específicas na grandes estratégia de expansão do comunismo no continente. O Foro de São Paulo, em especial, é a congregação de partidos revolucionários, movimentos guerrilheiros e narcotraficantes que formula uma agenda dualista: em defesa da democracia e de Cuba; das liberdades, mas sem condenar o terrorismo das FARC; na defesa da soberania, mas condenar as ditaduras. Nas palavras, de Peña Esclusa, o Foro de São Paulo “desde sua fundação esteve marcado por uma série de contradições, as quais se aprofundaram com o tempo” (p. 19). Se o comunismo ainda goza de força e vitalidade na América Latina muito se deve a estratégia continental do Foro de São Paulo.

Liberalismo e marxismo também passam pela crítica de Peña Esclusa posto que bebem da mesma fonte. Marxismo e liberalismo são movimentos políticos revolucionários, materialistas (não acreditam na capacidade transcendental do homem) e tampouco numa relação conflitiva entre o bem e o mal, caindo ambos no indiferentismo. Marxismo e liberalismo levam o relativismo moral às últimas consequências sem medir os efeitos perversos para a sociedade. As duas doutrinas políticas trazem consequentemente o indiferentismo, o relativismo moral e a apostasia à medida que combatem a fé em nome do laicismo. A Doutrina Social da Igreja combate esses desvios baseados na luta de classes e no mercado como equação dogmática. A Igreja defende, na avaliação de Peña Esclusa, uma terceira via crítica dos modelos, porém capaz de aproveitar o que os modelos têm de melhor. 

A terceira via também sugerem um modelo econômico realista. O capitalismo industrial e produtivista norte-americano e alemão, teorizados por Alexander Hamilton/Henry Carey e Friedrich List, pode ser um caminho de desenvolvimento seguro para a América Latina. Nas palavras de Peña Esclusa, alguns passos são importantes: a) mapear o potencial físico da nação, as suas reservas minerais e vegetais, sua geografia e potenciais riquezas; b) potencial humano; c) potencial de produção e seus desafios logísticos; d) focar nas maiores obras e maiores geradoras de empregos; os custos de produção e suas consequências; e) factibilidade econômica é a consecução da riqueza em si, com o desenvolvimento e a redução da pobreza. No sistema produtivista, o Estado assume um papel estratégico, pois é o órgão responsável pelo planejamento e desenvolvimento da nação em consórcio com a iniciativa privada. Rompendo os padrões impostos pelo marxismo e liberalismo, afirma Peña Esclusa, “o Estado deve se encarregar dessas funções, porém a execução e administração devem ficar nas mãos da iniciativa privada”.

Finalmente, história cultural e memória social da identidade ibero-americana são temas centrais no exame de Peña Esclusa, à medida que toda a sua perspectiva valoriza o homem, seus significados e sua espiritualidade. A compreensão plena das raízes ibérico-americanas pode ajudar a entender a substância do cognitiva e suas formas de sociabilidade, hoje tão esquecidas pelas torrentes da modernidade. Desfazer o engodo da “lenda negra e recuperar a identidade ibero-americana” possibilita refazer os contatos e os elos de identidade ora atormentados e tão confusos: “para corrigir a velha cadeia de ofensas, é necessário começar desde o princípio, retomando nossa verdadeira identidade histórica”; e o autor vai além, “graças ao legado da hispanidade, nossos povos são herdeiros dos conceitos mais profundos e avançados na civilização cristã ocidental” (p. 79).

O livro de Peña Esclusa é um diálogo profundo sobre o que somos e o que deveríamos ser. Sem proposta utópicas ou apocalípticas, Peña Esclusa aponta caminhos seguros para esse continente da esperança, hoje tão inerte e desesperado.

*Breno Rodrigo de Messias Leite é cientista político

Breno Rodrigo

É cientista político e professor de política internacional do diplô MANAUS. E-mail: [email protected]
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