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Contos do povo dessano

Evaldo Ferreira: @evaldo.am

Fotos: Divulgação

É costume entre os indígenas, os velhos da aldeia contarem as histórias de seu povo para os jovens, transmitindo os elementos culturais como a mitologia, os rituais e os costumes. No Brasil, existem cerca de 220 etnias indígenas e, em grande parte delas, a figura do ancião é valorizada como um arquivo vivo.

É esse costume que agora está impresso no livro ‘Um conto nunca contado’, do escritor indígena dessano, e antropólogo, Jaime Diakara, da Editora Valer.

“O livro é de literatura infanto-juvenil, apresentando uma linguagem cósmica de contos do meu povo, do grupo wahri diputiro porã. São contos contados para os jovens ao cair da noite”, falou.

Os dessano são uma das etnias indígenas que habitam a região do alto rio Negro. Seu território se estende do Brasil à Colômbia. Estima-se que a população dessano no Brasil seja de mais de 1,6 mil pessoas. Falam o tukano. Os dessano se auto-intitulam umukomasã, que significa ‘gente do universo’. Segundo o ISA (Instituto Socioambiental), existem aproximadamente 30 divisões entre os dessano, entre chefes, mestres de cerimônia, rezadores e ajudantes. São conhecidos pelas habilidades com a cestaria e pelas tradições xamânicas.

“Pertenço ao povo dessano, integrante do grupo wahri diputiro porá. O livro relata, no conto, como o povo dessano tem ligação com o não humano, tendo como referência mítica, parecida a uma metodologia pedagógica de ensino e aprendizagem a partir da história vivida e vivenciada com a natureza humana e não humana”, explicou.

O livro é o primeiro a ser publicado, dos 20 escolhidos pela Valer, do Concurso Frauta de Barro – 2023, sem custo para os autores.

Currículo extenso

‘Um conto nunca contado’ traz uma história provinda dos tempos ancestrais, tempos que se perdem, rodopiam e retornam, cumprindo o eterno retorno do mesmo. Com a obra, ouvimos a voz de outro povo, o dessano; de um mundo no qual o homem escuta e busca conselhos com a natureza, no qual os vivos não se distanciam dos seus deuses e dos seus ensinamentos. Além disso, o livro tem ilustrações produzidas pelo autor”, disse Neiza Teixeira, coordenadora editorial da Valer.

“Ao ler o livro, não é preciso ser um profundo conhecedor dos povos indígenas brasileiros para adentrar no universo que colide com a sabedoria dessano”, completou.

“O conto nunca contado é um conto contado pelo meu pai Diakuru, que tem uma personagem viva, com a linguagem da ancestralidade, como o mundo indígena explica a presença do outro humano entre o meio ambiente”, explicou Jaime.

Sobre as ilustrações do livro, Jaime revelou.

“Sou um pouco de cada, contista, escritor, ilustrador, sou interdisciplinar. As ilustrações criam um personagem ancestral dando-lhe a vida com cores e grafismos cósmicos da ancestralidade”, informou.

O currículo literário de Jaime Diakara é extenso. Ele já venceu o prêmio Tamoios/2012, recebendo menção de honra pela obra literária indígena, na Feira Nacional de Literatura Infanto-Juvenil, no Rio de Janeiro; venceu o prêmio Coleção Proarte de Literatura, de 2013, da Secretaria de Cultura do Estado do Amazonas; é autor do livro infanto-juvenil ‘Yahi Puíro Ki’ti – a origem da constelação da garça’, publicado pela Editora Valer; e ‘Waímũrã Ki’tyãkã – historinhas de animais’, publicado pela Secretaria de Cultura do Estado do Amazonas; participou da antologia Letras, da Universidade de São Carlos/SP; lançou o poema Desâna, publicado na Alemanha; o livro infanto-juvenil ‘Wahtirã – lagoa dos mortos’, recentemente publicadas pela editora Autenticam; é autor do calendário lunar do povo dessano; participou da obra ‘La primiėre femme du monde – contes indiens et chamanes du Brésil’, publicado na França; participou da antologia de literatura de indígena ‘nós’ e ‘Gaapi – uma viagem por este e outro mundo’.

Daniel Munduruku 

“Busco contar para jovens indígenas, e não indígenas, a história a partir da movimentação das constelações, acompanhando o calendário indígena dessano. Cada época tem seu guia. Guia são personagens, seres invisíveis, que nos orientam no círculo da vida social”, detalhou.

‘O conto nunca contado’ tem a apresentação do escritor, ativista e ator indígena Daniel Munduruku.

“Me senti completo, trafegando pelo mundo inominável do mistério e adentrando nele com a inocência de quem precisa contemplar o Todo para sentir-se completo. Foram todos esses sentimentos que eclodiram em mim quando tive a oportunidade de conhecer a obra deste grande antropólogo Jaime Diakara. Ele consegue ser este contador de histórias, sábio, profeta que nos remete ao princípio sem precisar explicar absolutamente nada porque a história basta a si mesma”, afirmou Daniel.

O livro pode ser encontrado no site www.editoravaler.com.br ou solicitado pelo WhatsApp 92 9 9613-1113.

Evaldo Ferreira

é repórter do Jornal do Commercio
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