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Brasil, independência e morte!

É vital que os jovens compreendam porque, passados dois séculos, o Brasil central continua de costas, de cócoras para o Norte, e nos considera cidadãos sem rosto, sem alma, vivendo na Amazônia esfumaçada que a nação resiste em proteger/abraçar e a ela se entregar”.

Por Alfredo Lopes (*) Coluna Follow-up (**) 

A independência do Brasil demorou muito a ser unanimidade nacional. Sete Setembro, até nossos dias, ainda questiona essa insurreição mediante a paisagem de um país apartado por desigualdades regionais tão gritantes. Aliás, a unidade da nação brasileira é um paradoxo que se baseia na cultura, economia e decisões políticas predominantemente exercidas a partir do Sudeste, Sul e Centro-Oeste do país. 

O grito e o blefe

Na Amazônia, formalmente, ela foi oficializada no grito e no blefe, um ano depois do vaporoso episódio do Ipiranga. Províncias do Norte e Nordeste estavam muito desconfiadas daquela sublevação, sobretudo porque as notícias oriundas das Corte, onde bombavam as Folias Cariocas, retratavam um governo imaturo e inconsequente. Há curiosidades picantes registradas nos subterrâneos dessa estória. E a recusa de submissão à Coroa verde-amarela encontrou seu último bastião de resistência exatamente na Província mais excluída, a do Grão Pará e Rio Negro, que só assinou – compulsoriamente – o Termo de Adesão ao novo Império para salvar a integridade de sua população e negócios no grito e no blefe.

Grão-Pará e Rio Negro

Aqui já se destaca a “diplomacia” autoritária e eticamente aloprada, que ganhou status efetivo no referencial de princípios do Brasil nascente. Qualquer coincidência com os tempos atuais não é mera coincidência. Dom Pedro I, atento à importância do Grão-Pará e Rio Negro – nome pomposo da Amazônia de então – despachou para Belém um navio de guerra com a missão de comunicar seu ultimatum imperial: ou assina a submissão ou uma esquadra poderosa viria tomar posse da região, e obviamente de suas imensuráveis riquezas e com requintada violência. Não tardou! Independência, às margens do Igarapé do Ipiranga, não excluiu a morte, foi construída em cima dela.

Cabanagem, a memória  do genocídio

A não-adesão ao novo governo se fundamenta em duas situações bem distintas. A primeira diz a respeito aos governantes e elite econômica, sobretudo comercial do Grão-Pará. Eles estavam permeados de figuras ligadas à Lisboa, oficiais, políticos e homens de negócio da antiga Corte. Era mais fácil e proveitoso  interagir comercialmente com Lisboa e vizinhança do que iniciar novos negócios com a capital da nova matriz, o Rio de Janeiro. Dizem os historiadores que até os ventos sopravam mais generosamente no ir e vir de Belém a Lisboa. A segunda razão estava nas condições desumanas das populações excluídas do baile dos bacanas da época. Eram os cabanos, habitantes de moradias extremamente miseráveis na beira dos rios e igarapés em torno de Belém. Habitavam os tapiris,  ou casas de palha, e eram constituídos de negros, índios e mestiços, o que se chama hoje de cabocos, a heróica cabucada! Viviam em regime de escravidão e sabiam que aderir ou recusar a nova cidadania petrolina – e nada –  era a mesma coisa. Ou seja, eles seriam escravizados ou vitimizados pela violência escravagista em qualquer cenário. 

Opressão e resistência 

Os novos governantes trataram, pois, de reprimir as frequentes revoltas, muitas delas apoiadas e assumidas por militares de baixo escalão e servidores públicos com soldos minguados. Depois de 15 de Agosto 1823, as coisas só fizeram piorar para os esquecidos. E foi justamente essa adversidade que construiu um espírito de resistência que vai explodir em 1835, por toda a Amazônia a partir de Belém, com a Revolta dos Cabanos. O império brasileiro não tardou em sufocar de forma violenta e implacável este movimento – A Cabanagem- uma revolta que está ausente da maioria dos livros de história no ensino médio do país. O genocídio se assemelha aos crimes mais hediondos da história da humanidade, mais de 60.000 mil cabanos, a maior parte do sexo masculino, dizimados sem clemência ou apelação.

Sem rosto e sem alma

No bicentenário da independência, em 2022, certamente não será celebrada qualquer homenagem às vítimas do genocídio Cabano, a não ser que os gestores da educação regional resgatem essa mancha histórica. É vital que os jovens compreendam porque, passados dois séculos, o Brasil central continua de costas, de cócoras para o Norte, e nos considera cidadãos sem rosto, sem alma, vivendo na Amazônia esfumaçada que a nação resiste em proteger/amar e  ela se entregar. 

(*) Alfredo é consultor do CIEAM, editor do portal BrasilAmazoniaAgora e coordenador editorial da   Coluna Follow-up
Foto/Destaque: Divulgação

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