Esqueçam tudo! Tudo que já leram, ouviram ou escreveram sobre guerras. Filmes, séries de TV ou quadrinhos, livros de história ou romances. Por favor, sigam a desumana e deliciosa sugestão de Pirro, o filósofo, naturalmente – não o general – e suspendam o juízo (epoché) sobre tudo o que até aqui se entendeu sobre a arte de matar inimigos em conflitos armados.
A guerra é um dos comportamentos humanos mais constantes na história. A epopeia dos grandes conflitos está registrada no inconsciente coletivo: Shiva, Ares, Odin, Ogum. Em suma, destruição para a regeneração e recriação da humanidade.
Estrategista militar prussiano Carl von Clausewitz, em sua obra Da Guerra, assim sentencia: “a guerra é a continuação da política por outros meios”. Mutatis mutandis, a guerra híbrida inverte tal preceito: agora, digo eu, a política é a continuação da guerra por outros meios.
A guerra híbrida é uma estratégia militar amoldada aos novos tempos e as novas tecnologias civis, especialmente àquelas da indústria da informática e das mídias sociais.
Assim, a guerra híbrida é, por definição, um mix de luta política (rivalidade ideológica, guerra cultural, competição eleitoral-partidária, propaganda política, etc.) e guerra convencional conduzida por grupos militares regulares vinculados aos Estados nacionais e irregulares, como as guerrilhas, narcotraficantes, etc.
Alguns conceitos da guerra híbrida já estão presentes no ecossistema político nacional, a saber: lawfare (guerra jurídica e o emprego da lei como arma política), fake news (desinformação, poder viral, o emprego da notícia como arma política), intervenção estrangeira em assuntos eleitorais domésticos, assassinato de reputações, entre outros.
A guerra híbrida é intencionalmente ardil e multifacetada. É uma ameaça simultaneamente física, psicológica e virtual. Sangue, suor e lágrimas juntam-se à lógica fria da criptografia, bitcoins e algoritmos. Nesta guerra, jovens soldados foram substituídos por jovens crackers que invadem softwares dos serviços de segurança do mundo inteiro em guerras cibernéticas que raramente vêem a luz do dia ou ganham os noticiários dos jornais.
Em 2018, em pleno período eleitoral, a guerra híbrida tornou-se a estratégia dominante amplamente usada pelos grupos políticos. As duas forças políticas ativeram tempo e recursos financeiros. Os mecanismos eleitorais convencionais (recursos financeiros vultosos e tempo de TV) foram substituídos pela ameaça híbrida em rede: as guerras cibernéticas e as mídias sociais viraram o novo campo de batalha.
A hiperconectividade das redes sociais e de informação conectadas à web facilita definitivamente à propagação de mensagens dos grupos políticos organizados interna e externamente. WhatsApp, Twitter, Instagram, Facebook, YouTube, etc. são espaços de conquista e arregimentação de militância que luta em prol da causa.
A invasão criminosa dos smartphones do ex-juiz Sérgio Moro e do procurador Deltan Dallagnol e a sua divulgação de suas conversas numa tentativa desesperada de tentar anular o julgamento do ex-presidente Lula é só mais uma batalha dessa guerra híbrida que aterrissou de vez aqui no Brasil. Formem suas tropas!
Por fim, é sempre bom lembrar-se da sabedoria por trás da frase do poeta Ésquilo: “na guerra, a primeira vítima é a verdade”.
*Breno Rodrigo é cientista político