A modernidade forjou uma nova sacralidade: o culto ao ego. A substituição das liturgias convencionais, que no caso do Ocidente, oriundas da ortodoxia católica, pelo apego à individualidade leiga, na expressão luterana condensada nas premissas da sola scriptura, pode ser um interessante ponto de partida para entendermos a natureza da psique dos intelectuais modernos.
Rasgado o véu da tradição espiritual, a emergência da modernidade deu voz e autoridade ao homem comum, ao intelectual. Em outras palavras, o intelectual aparece como a verdadeira força da criação do mundo – inventores, literatos, cientistas, estadistas, etc. –, de tudo o que existe, da própria estrutura da realidade. Os humanistas da renascença, bem como os revolucionários da atualidade, são percebidos ainda hoje como os reais artífices do mundo tal como ele o é.
Desde então, o papel do intelectual foi decisivo nas múltiplas concepções da modernidade, pois o intelectual passou a ser o técnico do saber prático; um indivíduo competente na sua área de conhecimento, articulado à erudição, ao refinamento social e à cultural. O intelectual é, em suma, o grande empreendedor, o agente da revolução ou da reforma por excelência.
O militante comunista italiano Antonio Gramsci, em seus trabalhos na prisão fascista, destacou a função dos intelectuais como, primeiro lugar, intelectuais tradicionais, isto é, intelectuais preocupados com questões gerais, abstrata e devaneios; e, em segundo, os intelectuais orgânicos, estes sim, intelectuais espiritualmente vinculados às classes sociais em luta quer do lado dos exploradores, quer do lado dos explorados. O intelectual gramsciano é um apóstolo da revolução, preocupado com a moral, a espiritualidade e a educação da sua militância.
Jean Paul Sartre, o mais conhecido filósofo francês do século XX, inspirado em sua própria experiência, falou de um intelectual público. Um intelectual que deve pensar e opinar sobre todos os problemas de seu tempo. Daí a importância da liberdade, como uma categoria filosófica central no pensamento satreano. A condenação do homem à liberdade, nas palavras da Sartre, o faz pensar a realização de sua existência no engajamento.
O contraponto à filosofia sartreana, certamente é Michel Foucault, pensa sobre os intelectuais específicos, em outras palavras, um intelectual despreocupado com as meta-narrativas – como a luta de classes, por exemplo –, mas está profundamente preocupado com questões particulares do seu tempo. Problemas ambientais, ideologia green, abortismo, racialismo, feminismo, ativismo gay, etc., são manifestações dessa tendência a pensar os conflitos sociais na esfera local – na microfísica do poder – tentando perde de vista as mudanças gerais da história humana, seguindo as profecias das grandes ideologias da modernidade: positivismo, hegelianismo, liberalismo e marxismo.
Os intelectuais exercem um tipo peculiar de poder: o poder intelectual é o mais instigante dos poderes, à medida que antecede e muito os conflitos sociais, políticos, culturais e espirituais do nosso tempo. O poder intelectual é um meio seguro para se entender as veredas do mundo.