11 de dezembro de 2024

O ônus da prova

Quando falamos de situações, temos o costume de generalizar e colocar todos os envolvidos no mesmo patamar. Infelizmente, a corrupção grassa em muitos setores. E todos concordam que ela maior em setores do governo, nos três poderes. Um amigo costuma dizer: Saudades do tempo em que perguntávamos “qual o político é honesto?”. Hoje precisa incluir: ”qual o juiz é honesto?” A dúvida deste amigo está sendo a pergunta de muitos. Com determinada injustiça, descobrimos que a pergunta que poucas vezes é expressa é: ”qual funcionário público é honesto?” Comparações sempre são odiosas e colocar todos os gatos num mesmo saco é horrível.

Quando vemos algum político, funcionário até do segundo escalão, ou mesmo um fiscal ou policial ostentar sinais visíveis de riquezas, como contribuintes temos o direito de perguntar se os ganhos são lícitos. Quem leva uma vida social espartana e tem bons proventos pode poupar e ter uma situação invejável, sem corrupção. Normalmente a melhoria social vem acompanhada de alguma ostentação em carros, roupas ou aparições em lugares públicos caros.

Contudo, a lei diz que o ônus da prova é de quem acusa. Pode se chamar de acusação um pedido de esclarecimento sobre a fonte de riquezas? A resposta clássica que “tudo foi aprovado” não satisfaz o leigo. O leigo sabe que direito e correto nem sempre são sinônimos. Quando se afirma que algo é legal, embora seja imoral, a sensação que se tem é que há uma falha na lei. Não existe moral para quem é amoral. Nem há leis que consertem a falta de vergonha na cara. O vendedor de remédios com preços adulterados em época de pandemia pode ser chamado de desonesto por se aproveitar da miséria alheia? Não seria uma boa coisa o rico justificar sua riqueza ao invés de apenas declará-la? Muitos nem fazem isso para não pagar imposto. 

O que causa espanto é ver colegas calados ante o favorecimento de um corrupto. Quando são colocados no mesmo patamar do corrupto, costumam se defender dizendo: “Eu não fia nada, eu não participei”. Justamente o crime está em “não fazer nada”. Quando flagrei um desvio de mercadoria numa empresa em que era gerente, um colega do flagra disse: “Eu já sabia disso há muito.” Fez uma cara de espanto porque foi demitido junto com o colega ladrão, justamente por não o haver denunciado. Se os colegas denunciassem um corrupto, a corrupção seria muito menor.

No Brasil, onde o termo “empresário” era visto com maus olhos. Como se todo empresário fosse um mercador de sangue e suor alheios, a bajulação aos ricos não é diferente que em qualquer lugar, mesmo quando a riqueza vem, comprovadamente, de desvios de dinheiro público. A tolerância com o corrupto afasta qualquer questionamento sobre a origem da riqueza. Talvez fosse necessário perguntar por que as pessoas de bem agem assim? Será que não estão apenas esperando a sua vez de chegar ao pote para também refestelar-se? 

É muito bonito ver alguém que muito trabalhou colher os benefícios. Contudo, deveria ser vergonhoso bajular aquele que ganhou seu dinheiro ilicitamente. É como reconhecer a vitória de um atleta dopado. Como este, aquele também deveria passar por um exame. Talvez então tivéssemos a propalada inversão do ônus da prova.

Luiz Lauschner

é empresário

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