27 de julho de 2024
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O nó na reforma tributária e a Bike Clandestina

Poucos admitem, mas o principal nó que amarra o avanço da Reforma Tributária no Congresso é a eliminação de um complicador que só existe em nosso Sistema Tributário. E esse complicador foi criado na promulgação de nossa Constituição em 1988.

Antes disso, os municípios não tinham competência tributária sobre relações de consumo. Com a criação do ICMS, os Constituintes decidiram conferir aos municípios a capacidade de cobrar o Imposto Sobre Serviços, o ISS.

A partir daí esse nó aperta cada vez mais a capacidade do Brasil atrair investimentos, alimentando conflitos de competências, disputas políticas por pura vaidade e muita, muita burocracia que afasta empreendedores que têm interesse em abrir negócios no Brasil.

Explico o motivo de algo que parecia simples gerar tanto problema. Se você distribui competência para tributar consumo entre União (via IPI, PIS e COFINS); Estados e DF (via ICMS) e Municípios e DF (via ISS), ocorre algo que podemos classificar como uma completa balbúrdia Tributária.

Para muito além da sobreposição de entes tributantes, já que União, Estados, Distrito Federal e Municípios acabam legislando sobre as mesmas operações comerciais, há um elemento “surpresa” que causa a maior de todas as complicações, não só para o empresário, mas principalmente para o próprio fisco, autor de mais de 5.4 Milhões de alterações legislativas tributárias por ano, entre 1988 e 2017, segundo matéria divulgada*1 pelo site Consultor Jurídico.

Esse elemento surpresa se desdobra em dois (Claro! Se é possível complicar, pra que facilitar?). Trata-se da distinção entre o que é “Bem” (e aí tributado, em regra pelo ICMS) e o que é “Serviço” (objeto de tributação, em regra pelo ISS). Digo em regra porque no Brasil, tratando-se de tributo, não sabemos mais o que é regra ou exceção. E há sempre um “talvez”. A partir daí, no âmbito, principalmente do ICMS, temos uma nova complicação, que é a “Classificação Fiscal”. Pronto! O nó cego está bem amarrado.

Essas classificações fiscais são brechas que permitem às empresas que querem fugir da tributação, usar a complexidade do sistema para argumentar em função das diferentes aplicações de seus produtos, visando inseri-los nas que resultem a menor carga possível.

Esse nó se agrupa a outro, que é a diversidade de alíquotas que o sistema opera. Na faculdade estudamos que há menos que 10 alíquotas de ICMS, por exemplo. Ocorre que na prática, a multiplicidade de Regimes Tributários, travestidos de Termos de Acordos; Regimes Especiais; Protocolos; Convênios e tantas outras nomenclaturas criam uma infinidade de constelações de alíquotas, cada uma com seus diversos sóis, luas, satélites, cometas e asteroides.

Para o leigo pode parecer algo difícil de entender, mas se o Fisco tem que tributar, por exemplo, um calçado, primeiro deve se certificar que aquilo é realmente um produto e não um serviço. Sim! Até porque em tempos de impressão 3D, isso vai ficar cada vez mais complicado!

Decidido que é um calçado, aí vem outra pendenga: é calçado para profissionais de saúde (que pela sua aplicação e essencialidade, tem tratamento tributário favorecido, com redução de carga); é calçado para prática de atividades esportivas (que devido à sua necessidade intermediária, ganhou um regime diferenciado, com um crédito presumido); ou é um calçado social (que devido à sua aplicação supérflua, teve a alíquota majorada). Nota: usei uma situação hipotética, mas verossímil, até porque há 27 legislações de ICMS no Brasil e nenhum ser humano pode afirmar que conhece pelo menos uma dessas.   

No caso do calçado, na década de 1990 ia tudo bem até que alguém teve a insana ideia de inventar o “sapatênis”, que fez o Sistema Tributário Nacional entrar em parafuso (risos..).

Para quem quiser começar a entender um pouco dessa bagunça, sugiro que assistam ao vídeo da “Bike Clandestina”*2. Basta procurar no Google e você terá uma noção incipiente, mas paradigmática, do que é o pandemônio tributário no Brasil.

E porque é tão difícil eliminar uma simples classificação entre o que é Bem e Serviço e a partir daí, tributar todas as operações negociais, sejam lá qual forem? Temos que perguntar ao diversos atores envolvidos, que – para as câmeras bradam: “precisamos de uma Reforma Tributária que simplifique o sistema”, mas que nas trincheiras que cavam no Congresso, brigam pela manutenção do status quo.

Ou seja, queremos mudança, desde que seja para que paguemos menos tributos, não importa o que se faça.

A simples eliminação das classificações entre Bens e Serviços, alinhada com a implantação de uma única alíquota, cobrada no destino, eliminaria 99% das distorções de alocação de negócios, burocracia e complexidade tributária.

Seria algo como: vendeu? Não importa o que foi. É tributado em X%. Pronto!

Porque é difícil? Olhe em volta e veja o mar de pessoas (as mais pobres) que pagam tributos. E agora mire para o Olimpo. Veja, lá no alto aquelas grandes corporações e os bilionários que impõem ao Estado a forma de tributar seus negócios e rendas.

Se eu acredito na Reforma? Você pode me perguntar algo mais fácil? Como falar de cor a legislação dos 27 entes Estaduais e dos mais de 5.500 municipais?

Eu poderia responder com algo do tipo: se as grandes corporações e bilionários abrirem mão de seus privilégios tributários, é claro que sim!

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