As lacunas históricas das atitudes dos Imperadores Romanos são de fazer “cair os queixos”. Passam por atear fogo a Roma, matar ou determinar a morte dos pais, irmãos e mulher, o que já nos oferecem um “prato feito” para aquilatarmos o grau de insanidade do ser humano na face da terra, apesar de sabermos que tais afirmações carecem do atributo chamado certeza histórica. Diz o ditado, porém: “onde há fumaça, há fogo”.
O passar dos tempos não nos afastou do cometimento de outros tipos de atrocidades que confirmam a possibilidade de veracidade daquelas. A afirmação de que o nosso planeta era redondo, achatado nos polos e não plano, contrariando o que se tinha como verdadeiro à época conhecida como Inquisição, por muito pouco não levou à morte um grande cientista. Obrigado a se retratar, capitulou mas escondeu seus estudos para a posteridade.
O que se conta nos livros oficiais sobre as descobertas da América e a do Brasil peca em seus pormenores, principalmente, em nosso caso particular, no que diz respeito ao proclamado por alguns historiadores como “massacre dos indígenas brasileiros”, aos quais conferem a “propriedade natural da terra”, por serem os mais antigos habitantes conhecidos.
Parte divergente de estudiosos de nossas raízes afirma que a realidade é bem outra, e apresenta uma segunda tese, na qual as lutas tribais pelo domínio da terra e a sanha pelo poder, sempre o poder, induziram alguns caciques a aliar-se aos europeus para dizimar e escravizar os inimigos de outras tribos e etnias, assassinar os guerreiros mais valentes sobreviventes às lutas, beber o seu sangue e comer a sua carne para agregar a si as virtudes do oponente trucidado.
O tempo não admite barreiras à sua frente. Caminha inexorável para além do infinito, apresentando fatos que nos atropelam, independentemente da aquiescência e da ação humana. A incapacidade de enumerar todos os desvarios nos impulsiona para selecionar alguns deles, iniciando pelas “guerras napoleônicas”, a “revolução francesa”, os tempos épicos do “faroeste americano” e as “lutas internas entre o Norte e o Sul estadunidense”, além do surgimento da visão radical de grupos que ainda hoje se intitulam detentores de uma verdade racial plena.
Tudo é relativo, diria Einstein, ornado da simplicidade dos sábios. Vivemos no Brasil um processo dos mais cruéis de colonialismo, escravidão, dilapidação de riquezas e de degradação dos valores morais e éticos. Houve os tempos de Império, o grito de Independência, a Abolição da Escravatura e a Proclamação da República, com traições e todos os requintes de luta pelo poder, cujos detalhes somente poderiam ser contados pelos que os viveram e, infelizmente ou não, já realizaram sua viagem no trem construído com cadeira cativa para cada um de nós.
A Amazônia Brasileira viveu seus momentos áureos durante o “ciclo da borracha”. Pagamos um preço elevado pelo progresso na região. Fomos colônia como no Império, agora sem perceber. As riquezas naturais foram criminosamente surrupiadas e contrabandeadas pelas nações mais ricas, feito doce ou esmola que se dá ao menino de rua para escamotear a ausência brutal da oferta ao direito à educação, no mais lato sentido, onde a escolaridade constitui, provavelmente, um dos importantes fatores, mas tão somente parte do processo.
Vivemos a Primeira Guerra Mundial e o holocausto da Segunda. Tudo pelo poder, em nome de uma pretensa liberdade que impingiria uma forma diferente de escravidão. Paradoxalmente, em ambas, conhecemos seres de luz exemplares, que deram suas vidas ou atuaram heroicamente para salvar outras tantas. A tirania, o poder e a redenção, impondo suas presenças históricas permanentes.
Individualmente, há muito o que se falar: “Jack, o Estripador”, a “Fera da penha”, o “Assassino do parque”, o conhecidíssimo caso de um cirurgião plástico, psicopata e matador nato, casos de filhos assassinando pais ou destes matando filhos. Inúmeras são as ocorrências envolvendo verdadeiros dramas dignos de filmes e novelas, cada um com características específicas de suas épocas, com o ponto convergente de que todos denotam a vulnerabilidade e a fragilidade interior de cada um de nós, chamados humanos.
A nossa infinita bondade e o maquiavélico poder de destruição que nos caracterizam não encontram limites e barreiras os impeça de manifestar-se e menos ainda obstáculos para que se instalem no seio de quaisquer das profissões ou titulações definidas pelas sociedades existentes, do mais humilde trabalhador e dos magnatas até o mais dedicado religioso. Todos nós, indistintamente, somos capazes de transitar pelas esquinas do bem e do mal, ambas moldadas pelas incoerências de nossas inseguranças.
Simples assim. E estarrecedor. Vivemos tempos modernos. Em suas ondas esquecemos que a toda ação corresponde uma reação contrária e de igual intensidade, exemplificada no velho adágio popular do “aqui se planta, aqui se colhe”. Insistimos em colher maçãs em videiras. Drogas já não são mais produto farmacêutico, vendido em drogarias, para curar doenças, mas o instrumento pelo qual muitos jovens e adultos foram levados à destruição moral e física, quando não, e quase sempre, à morte.
Criamos um sem número de analfabetos diplomados em Faculdades e Universidades, que mal sabe somar, dividir, subtrair e multiplicar ou escrever frase em uma linha sem cometer erros crassos. Os pais correm o risco de submeterem-se às barras da Justiça por uma reprimenda aos filhos, mas ao pedófilo se pretende conceder a benesse da descriminalização do ato, caracterizando-o como doença de quem o praticou, transformando o infrator em inimputável.
Os curiosos de plantão perceberam que tal tipo de desvio comportamental ocorre, sistematicamente, no âmbito de classes bem aquinhoadas pelo poder financeiro ou diretamente atinge “personalidades com reputação e idoneidade à toda prova”. Descobriu-se, ainda, que existe, nos países com regime totalitarista, um forte viés capitalista. A diferença é que os investimentos são executados sob tutela do Estado e os empreendedores são cooptados como parte integrante do “stablishman” coator, escravos da corrupção e opressores da classe servil.
Olhos arregalados, surpresos, indignados e quase impotentes, observamos o passado se fazer presente com as artimanhas do hoje, onde Reis, Religiosos, Nobres e Plebe cumprem o seu papel rigorosamente, nem sempre aplaudidos por aquele que, há dois mil e vinte anos atrás, ousou qualificá-los como hipócritas.
A história se repete no fortalecimento econômico-financeiro de uma classe social dominante, denunciada satiricamente por Erasmo de Roterdã em “Elogio da Loucura”, uma das mais célebres obras filosóficas do Renascimento e por outros tantos, ao longo dos tempos, e no enfraquecimento moral e intelectual de uma chamada plebe, comparada ao que hoje se chama povo, reduzida à condição de manada, mantida viva enquanto útil à classe superior, pronta e disponível para o abate, a tempo e hora definidos.
O que vemos acontecer atualmente nos meios políticos e jurídicos institucionais nos envergonha e a realidade denuncia a imensa fragilidade humana, corroborando a certeza de que somos capazes de toda a sorte de impropriedades, nos transformando em delinquentes e crápulas, cuja prerrogativa não pertence aos menos favorecidos economicamente ou aos pouco aquinhoados em coeficiente de inteligência. Dizia o sábio: “os canalhas também envelhecem”.
A humanidade, literalmente, perdeu-se em meio às suas incoerências? Acredito que não. Percebemos que a maioria de nós não aprova o que se tem e, individualmente, alguns conseguem sobrepor-se aos paradigmas e se notabilizam, independentemente dos títulos que porventura ostentem e dos que venham a lhes outorgar “post mortem”, como verdadeiros seres do bem, denunciando a existência de um processo evolutivo passível de ser alcançado por todos nós: esta a nossa sincera esperança no futuro do Brasil.
Assim, os conflitos não seriam meramente instrumentos de discórdia, mas de amplas possibilidades, capazes de robustecer e redimensionar propósitos, o que permitiria a depuração paulatina do ser e a esperança na possibilidade de sonhar e tornar real o sonho.
Nas desatenções do dia a dia, porém, devemos permanecer atentos às nossas personalíssimas incoerências, vaidades e egoísmos, que nos cegam, para agir, se necessário for, destarte acreditar na redenção pacífica como o melhor caminho, que nos permitirá emitir o raio de luz apascentador, próprio dos seres iluminados.