22 de outubro de 2024

E o amor?

Todos sabem que no período de 1822 a 1898 o Brasil viveu um regime monárquico, governado por dois imperadores, D. Pedro I e D. Pedro II. Com a criação do partido republicano em 1870, a abolição da escravidão e a insatisfação de militares com o império a monarquia enfraqueceu e em 15 de novembro de 1898 ocorreu a proclamação da República. Quatro dias depois foi oficializada a bandeira do Brasil com a expressão “Ordem e Progresso, forma abreviada do lema positivista formulado pelo filósofo francês Auguste Comte. Porém parece que faltou algo.

A doutrina positivista foi fundada no século pelo francês Auguste Comte com o pensamento de que os fatos da vida cotidiana são sempre explicáveis pela ciência através de experiencias e observações. Para o positivismo o progresso humano pode ser explicado por meio da química, física, biologia, matemática, astronomia e sociologia. Essas seis ciências formam a ciência positiva de Comte e coloca o homem no centro de tudo.

Segundo o positivismo de Comte os métodos científicos, que serviam para explicar os fenômenos da natureza, poderiam ser usados para mapear os fenômenos na sociedade humana e quando todas as condições fossem mapeadas poderiam ser previstas e regulamentadas. Ao atingir esse estágio de entendimento cientifico do seu comportamento a humanidade atingiria seu estágio positivo, o que dava origem ao nome “Positivismo”.

Claramente o positivismo foi influenciado pelo Iluminismo, movimento intelectual europeu que surgiu na França no século XVII, tendo como principal característica o pensamento de defender o uso da razão para solucionar os problemas da sociedade. O Iluminismo surgiu para contrapor o Absolutismo que dominava a Europa e sustentava os poderes e regalias das monarquias absolutistas e igrejas católicas, através da cobrança exorbitante de tributos pagos pela população mais pobre.

Segundo Rafael Bandeira de Mello, doutor em Políticas Pública e Formação Humana pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro, no Brasil o positivismo cresceu de forma heterogênea através do Apostolado Positivista do Brasil e de grupos distintos de republicanos, dos quais se destacaram o grupo da juventude militar da capital federal, o grupo da Escola Positivista do Recife e o grupo dos positivistas federalistas do Rio Grande do Sul. Todos aplicavam os ensinamentos positivistas conforme a sua realidade regional e a formação individual de seus integrantes.

Esse pensamento positivista, que permeava o mundo, influenciou diretamente ações politicas e militares que causaram o fim da Monarquia no Brasil e a proclamação da República em 15 de novembro de 1898. O Atlas Histórico do Brasil, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), diz que a proclamação da república brasileira é considerada o ponto de inflexão da atuação dos militares no cenário político do país, ato tido como um golpe militar perpetuado por uma fração especifica do Exército. Dos oficiais que participaram da “proclamação” somente o general Manuel Deodoro da Fonseca estava presente, além do tenente-coronel Benjamin Constant Botelho de Magalhães, professor de matemática na Escola Militar.

Os militares que participaram do golpe de 1898, em maior número, foram os oficiais de patentes inferiores do Exército, os alferes-alunos, tenentes e capitães, todos que possuíam educação superior ou “cientifica”, adquiridas durante os cursos realizados nas Escolas Militares, relata a FGV. Era a “mocidade militar”, denominação da época, que estava embebida pelos conhecimentos e teorias propostas pelo pensamento do positivismo que passava a atuar na política brasileira.

Com os direcionamentos positivistas dos articuladores da proclamação da República a nova bandeira brasileira apresentou uma divisa “Ordem e Progresso”, idealizada a partir do lema de Auguste Comte: Amor por princípio, Ordem por base e Progresso por fim. A bandeira inclusive foi idealizada por Raimundo Teixeira Mendes e desenhada por Décio Villares, ambos positivistas.

Os positivistas “brasileiros” usaram parte do lema de Comte, mas decidiram não incluir a palavra “amor”, usada no sentido da necessidade de uma manifestação espontânea de sentimento e afetividade relacionadas a inclinações de benevolência e respeito à humanidade. O “Amor” de Comte implicava em um altruísmo desinteressado, capaz de ir capaz de ir além do ensinamento bíblico que encontramos no mandamento do Levítico: “Amarás o teu próximo” ou no do Evangelho segundo Mateus: “Ama os teus inimigos”.

Sem esmiuçar os motivos da exclusão da palavra “Amor”, na época da proclamação da República, podemos dizer que hoje ela faz muita falta para nossa sociedade. Por isso a pergunta: “e o Amor?”.

Moisés Hoyos

Analista-Tributário da Receita Federal do Brasil

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