26 de julho de 2024
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Aspirante a poeta e aprendiz de escritor

Prezado leitor e estimada leitora, para celebrar o Dia do Escritor, que se comemora hoje, 25 de julho, vou compartilhar com vocês o fato que me levou a escrever o meu primeiro texto e a trilhar o caminho da escrita. 

Foi no distante ano de 1999. Naquela época eu morava no seminário e estudava para ser padre. Era noite e fazia muito calor em Manaus. O padre diretor me pediu que eu escrevesse uma carta imaginando como seria a minha vida como Salesiano de Dom Bosco.

Acontece que, por volta das vinte e duas horas, depois das orações, quando eu caminhava para o dormitório, por um corredor longo e solitário, um homem de barba branca e longa, apareceu-me.

— “Eis aqui o teu amor”. 

Numa das mãos ele tinha o livro sagrado dos cristãos e na outra uma agenda e uma caneta reluzente.

— “Toma, escreve!” — ordenou-me com voz firme e atroadora aquele homem.

Confesso que na hora fiquei assustando e até um pouco apavorado. Como aquele homem não se parecia com nenhum dos padres que moravam no seminário, cheguei a pensar que estava vendo visagem, mas ele insistiu: 

— “Somos aquilo que escrevemos” — dizendo isso, aquele homem desapareceu.

A temperatura caiu bruscamente, e um vento forte varreu o dormitório. Olhei para os lados e não vi mais qualquer pessoa, somente as estrelas no firmamento e o silêncio que reinava absoluto. 

Àquela hora da noite, os meus colegas seminaristas já estavam todos dormindo e os padres, nos seus quartos, preparando suas orações e palestras do dia seguinte. 

Por horas, fiquei na minha cama orando em silêncio através da letra da música “Cálice” de Chico Buarque: “Pai, afasta de mim esse cálice \ Pai, afasta de mim esse cálice \ Pai, afasta de mim esse cálice \ De vinho tinto de sangue”.

Num misto de choro e resignação à vontade divina, comecei a indagar-me: — “Quem eu sou? Eu sou um cristão ou um ateu? Um artista, um filósofo ou um poeta?”.

No meio desses questionamentos apareceu-me, novamente, o homem da barba branca e longa e disse-me:

— “Haverá dias que tu serás um poeta. Haverá dias que tu serás paixão. Haverá dias que tu serás escritor. Haverá dias que tu serás solidão”.

No seminário eu sempre me acostumei a colocar Deus em primeiro lugar, atitude que carrego comigo até hoje. E assim, depois de rezar por dezena de vezes o “Pai Nosso” e a “Ave Maria”, abro a Bíblia no Salmo 23 e começo a ler:

“O senhor é o meu pastor, nada me faltará. Deitar-me faz em verdes pastos, guia-me mansamente a águas tranquilas. Refrigera a minha alma; guia-me pelas veredas da justiça, por amor do seu nome. Ainda que eu andasse pelo vale da sombra da morte, não temeria mal algum, porque tu estás comigo; a tua vara e o teu cajado me consolam. Preparas uma mesa perante mim na presença dos meus inimigos, unges a minha cabeça com óleo, o meu cálice transborda. Certamente que a bondade e a misericórdia me seguirão todos os dias da minha vida; e habitarei na casa do Senhor por longos dias”.

Os padres salesianos quando viram e ouviram que eu estava arando sozinho, me disseram: — “Venha orar conosco na capela. Aqui, o que acontece com um irmão acontece com todos. Somos uma família. A Família Salesiana de Dom Bosco”.

Juntos, entoamos belas canções de louvores a Deus e aos anjos, formando, assim, um verdadeiro coro celestial. 

Na manhã seguinte, à aflição tomava conta de mim e por mais que eu tentasse encobrir, não passou despercebida ao padre diretor.

— “O que ocorre com você, meu filho?”.

Calado estava calado fiquei.

— “Não minta para mim, jamais”.

Não sei de onde encontrei forças, mas comuniquei a minha decisão aos padres com lágrimas nos olhos: 

— “Eu sou um sonhador, sou muitos em um só, que sonha ser escritor”.

O padre diretor, repetindo uma frase de dom Bosco, disse-me:

— “Deus nos colocou no mundo para sermos felizes”.

Não obstante a menção saudosista àquele período, o tempo passou e hoje quando me olho no espelho tenho orgulho de quem eu sou (e quem eu sou?): “Sou um aspirante a poeta e aprendiz de escritor”.

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