Os centros mundiais de investigação climática não conseguem prever fenômenos como El Niño e La Niña… apenas, monitoram, diariamente, as variações de temperatura das águas oceânicas, neste caso, do Pacífico. Os relatórios do NOAA-CPC (National Oceanic and Atmospheric Administration, Climate Prediction Center) apontam tendências.
Confirmadas, estando sob o efeito La Niña, há 95% de chance de haver precipitação acima da média na bacia hidrográfica amazônica, ampliando as expectativas de mais uma cheia de magnitude elevada nos nossos rios.
O Amazonas deve se preparar… mas, como?
Conversando com especialistas, entre eles, o Prof. Dr. Rodrigo Augusto Ferreira de Souza, coordenador do Curso de Meteorologia da Universidade do Estado do Amazonas (UEA), algumas pistas me foram reveladas.
Primeiro, é preciso continuar monitorando o La Niña, torcendo pelo arrefecimento da sua força, que poderia significar menos chuvas a partir de março.
Mas, provoca Tom Jobim: “São as águas de março fechando o verão / É a promessa de vida no teu coração…”
Será necessário, também, ter o olhar clínico focado nas cabeceiras dos nossos principais rios – Negro, Solimões, Juruá, Purus e Madeira. Um valor crítico da cota do rio, medido nas estações telemétricas de referência, antecipará, em dias, o comportamento da bacia hidrográfica a jusante, notadamente, onde haverá maior população atingida.
A Agência Nacional das Águas e Saneamento Básico (ANA), o Serviço Geológico do Brasil (CPRM) e Estados federativos mantêm, em parceria, uma robusta Rede Hidrometeorológica na Amazônia, que monitora o ciclo das águas (cheia e vazante) da mais importante bacia hidrográfica planetária. O tratamento das informações da Rede permite, por exemplo, a emissão de alertas de cheia, como os emitidos pela CPRM para Manaus, no final dos meses de março, abril e maio de cada ano.
A propósito, recebi do geólogo José Luiz Marmos (CPRM), leitor do Jornal do Commercio, o seguinte comentário pessoal sobre o último artigo: “pelo jeito, a cheia de 2022 vai ser muito grande. O rio Negro já chegou até Porto Velho (nome de uma estação instalada no rio Negro)”, compartilhando um informe intitulado – Rio Negro apresenta níveis atípicos em Porto Velho: o último boletim hidrológico do Serviço Geológico do Brasil (SGB-CPRM), divulgado no último dia 4. Tal boletim mostra que todas as estações monitoradas do rio Negro apresentam níveis atípicos, com valores acima do esperado para a época. Essa característica é mantida em função dos acumulados de chuvas em praticamente toda a bacia. Saiba mais: https://bit.ly/RioNegroCota.”
Infelizmente, o Amazonas enfrentará a cheia de 2022 com perdas sensíveis em sua estrutura de monitoramento.
Desde 2015, quando o tema água passou a ser tratado como um apêndice da política estadual de meio ambiente, das 22 estações telemétricas instaladas sob a responsabilidade do Sistema Estadual de Informações dos Recursos Hídricos, restam, apenas, cinco (05) operando. É lastimável reconhecer que as outras 17 estações foram e continuam desativadas ‘por falta de investimentos em manutenção’!
É importante ressaltar, por último, que os fenômenos climáticos La Niña e El Niño não atuam sozinhos na região amazônica e no Brasil. Há outros Sistemas importantes (a “ZCAS – Zona de Convergência do Atlântico Sul”, a “ZCIT – Zona de Convergência Intertropical”, a “AB – Alta da Bolívia”), que devem ser acompanhados pelos meteorologistas e especialistas de plantão. Suas informações serão preciosas e mui esperadas.
A partir dos sinais cada vez mais evidentes, importante iniciativa será o governador Wilson Lima convidar os principais entes federais responsáveis pelos levantamentos meteorológico e hidrológico básicos para uma avaliação coletiva e situacional da cheia que se aproxima.
A boa preparação e enfrentamento perpassarão pela coordenação de ações estruturantes, nas esferas federal, estadual e municipais, que nos conduzam ao reconhecimento territorial das áreas de risco no Amazonas, e, suas populações ‘anfíbias’, ansiosas por uma comunicação pública direta, responsável e preventiva, que as auxilie na mitigação dos naturais prejuízos econômicos futuros.
Pela condução científica do tema, não custa reiterar: até quando vamos continuar “não olhando para cima”?