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Uma antiga visão das estratégias

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Os cientistas desenvolvem um esforço muito grande para compreender e explicar os fatos e fenômenos do mundo. Não querem ser deuses, como imagina a mente daqueles que desconhecem seus meandros. A intenção é tornar o mundo (e a natureza, como muitos dizem) mais amigável, mais amistoso. Sabendo como o mundo funciona é possível que possamos agir em conformidade com seus mecanismos em busca de uma vida mais promissora para todos. No entanto, como o mundo muda (e muitas vezes muda com uma velocidade muito grande), as explicações que conseguimos gerar sobre o seu comportamento ficam defasadas, o que leva à necessidade de atualizações, também cada vez mais constantes. Essa dinâmica se aplica também às realidades institucionais e gerenciais. As explicações que antes funcionavam razoavelmente hoje podem ser problemáticas, mas isso não significa que não sejam válidos os seus fundamentos. Neste sentido, este ensaio tem como objetivo mostrar uma visão antiga do funcionamento das estratégias institucionais, mas que ainda podem ser de muita utilidade hoje.

A primeira formulação integrada das estratégias institucionais foi uma arquitetura mecânica assentada sobre os três níveis gerenciais. Estamos chamando de formulação integrada a conjunção dos esforços de um nível desdobrados nos esforços do outro com quem se interliga. Os esforços relativos ao topo institucional se interliga apenas com o que lhe é imediatamente inferior; de forma similar, os esforços do nível inferior se coaduam apenas com os esforços do que lhe é superior; enquanto que os esforços do nível intermediário se conectam simultaneamente com os de nível superior e inferior. Para que as conexões se mantivessem funcionais eram necessários muitos elos conectivos, representados por subunidades gerenciais táticos, o que ajudava a explicar o fato de que esse nível estratégico fosse muito mais dimensionado estruturalmente que os superior e inferior.

Ainda que os estudos científicos e as práticas gerenciais e institucionais não reconhecessem oficialmente, cada nível de estratégia tinha missões específicas sob essa visão. O nível de topo, chamado simplesmente de estratégias organizacionais, tinha a missão de cumprir as responsabilidades da instituição em relação ao ambiente externo. Para que isso fosse feito a contento, a amplitude de controle e supervisão dos executivos deste nível abrangiam toda a organização, mas sempre com o cuidado de sua autoridade não interferir nas dos níveis subalternos. Isso implicava na transferência de grande parte do poder de supervisão e controle para os gestores de nível intermediário e da base. De fato, o poder desses dois níveis era uma extensão da autoridade do topo.

As estratégias táticas ou intermediárias representam o desdobramento das estratégias institucionais, globais, sistêmicas. Como esses gestores são quase sempre mais especializados do que os de topo, sua missão é traduzir as decisões e esquemas decisórios superiores em fluxos operacionalmente possíveis. Trabalham com os executivos estratégicos para alinhar as interpretações das decisões a partir de suas exequibilidades, que, na verdade, são seus desdobramentos em novos fluxos estratégicos. É como se a estratégia definida pelo topo representasse o grande fluxo institucional em direção ao futuro pretendido e as interpretações intermediárias fossem as sinalizações, alertas, redução e aceleração de velocidade, rotas alternativas, vias de escapes e outras facilidades para que aquele fluxo maior seja mais proveitoso.

De posse dessas interpretações, as estratégias operacionais se encarregam de especificar como cada interpretação será executada. Enquanto topo determina como a instituição deve “capacitar o corpo funcional” e a intermediária define o corpo a) docente, b) técnicos administrativos e c) profissionais de laboratório para o domínio de metodologias ativas, as estratégias operacionais definem pelo menos que metodologias serão o alvo, quem serão treinados, como, quando, onde, duração, por que e o custo do treinamento. Como o próprio nome diz, são as estratégias operacionais que permitem a execução da decisão institucional. Assim como não deveria haver projetos operacionais (que é o nome técnico de como as estratégias da base são desenhadas) sem vinculação às estratégias táticas, não deve haver estratégias organizacionais sem seus correspondentes táticos e operacionais.

Essa visão é ainda muito utilizada atualmente. Funciona razoavelmente bem em muitas situações; noutras, apresenta problemas irreversíveis. Como se pode notar, há a tendência de superdimensionamento do nível tático, o que gera, na prática, um número excessivo e explosivo de interpretações e desdobramentos das estratégias institucionais. O nível intermediário é quase sempre muito maior estruturalmente do que os níveis superior e inferior justamente por isso: tendem a multiplicar interpretações e desdobramentos. E muitas vezes, essas interpretações são conflitantes e conflituosas e os desdobramentos geram custos elevadíssimos para os resultados pretendidos. Não foi por acaso, por exemplo, que décadas atrás houve o aparecimento de um esforço planetário para eliminar o máximo possível das intermediações feitas pelos estrategistas táticos institucionais, no movimento da reengenharia.

A partir do sucesso (e inúmeros fracassos) desses movimentos redutores da intermediação estratégica outras configurações estratégicas foram propostas. Na verdade, são inúmeras as propostas existentes, mas todas elas têm, em maior ou menor grau, o esquema lógico fundamental dessa visão antiga: demandas do ambiente externo são traduzidas em uprimentos, em que um grupo de indivíduos lida com o lado de fora da instituição, enquanto outros se preocupam com mais vigor e atenção na produção do suprimento, ainda que haja quem faça intermediações, as interpretações e desdobramentos são feitos pelos grupos de indivíduos de captação de demanda e produção de suprimentos. A forma como isso é feito também é muito diferenciada, o que tem produzido novos formatos e estruturas organizacionais, indo desde diferenciações matriciais a sistemas em redes. É o antigo se transformando em novidades.

*Daniel Nascimento-e-Silva, PhD, professor e pesquisador do Instituto Federal do Amazonas (IFAM)

Daniel Nascimento

É Professor e Pesquisador do Instituto Federal do Amazonas (IFAM)
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