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Triste sina de um monumento

Triste sina de um monumento

Semana passada o ‘Fazendo História’ contou um pouco da história de Frederico José de Sant’Ana Nery, o intelectual paraense que, na segunda metade do século 19, morou em Paris, mas sempre foi um apaixonado pela Amazônia, e o Amazonas, e está enterrado em Manaus.

Agora vamos seguir em busca da história do belo monumento que foi construído post mortem, em sua homenagem, no início do século passado, foi mudado de lugar por um prefeito e barbaramente destruído por outro.

“O monumento foi construído e inaugurado, em 1904, pelo empresário Sebastião Diniz, acredito eu, que a pedido do então governador Silvério José Nery (1900/1904), que era irmão de Sant’Ana Nery por parte de pai, o major homônimo Silvério Nery”, contou o historiador Ed Lincon Barros.

No seu local original, ainda com o gradil

Segundo Durango Duarte, em seu livro ‘Manaus, entre o passado e o presente’, Sant’Ana Nery morreu em Paris, em 3 de junho de 1901, e seu irmão governador providenciou que seus restos mortais fossem trazidos para Manaus, o que aconteceu a bordo do vapor italiano Colombo. Sant’Ana Nery foi enterrado em 11 de outubro de 1901, no cemitério São João Batista.

Mudou de lugar

O monumento foi inaugurado em 7 de setembro de 1904, quando Constantino, o outro meio irmão de Sant’Ana, já era governador. Tratava-se de um pedestal de pedra com o busto, de bronze, de Sant’Ana Nery no alto. Logo abaixo uma musa de mármore oferecia um ramalhete ao homenageado. O pedestal ficava sobre uma base que o tornava ainda mais alto. Calculando-se pelas fotos antigas junto às pessoas, deveria ter uns cinco metros de altura. Cercando o monumento, gradis de ferro fundido, comuns na época, instalados em 1905. De acordo com Ed Lincon, o monumento foi fixado na então praça 15 de Novembro (anteriormente Largo da Imperatriz. A mudança de nome, e quando houve a mudança, são óbvios) próximo ao prédio do seminário São José, que a partir de 1928, e até hoje, é ocupado pelo Banco do Brasil.

Até onde se sabe, o monumento foi doado ao município por Sebastião Diniz, um dos empresários pioneiros na construção da então estrada Manaus/Rio Branco, atual BR 174, segundo Mário Ypiranga, em seu livro ‘Negritude & Modernidade’, até porque, ainda de acordo com Ypiranga, o empresário morreu e não conseguiu sequer receber o pagamento pelas obras na estrada. Teria mandado construir o monumento como forma de agrado aos irmãos governadores Silvério e Constantino Nery para ver se pagavam o que lhe deviam? Se assim foi, não adiantou. A viúva de Diniz também tentou receber cerca de quatro mil contos de réis do governo, mas morreu e não viu a cor do dinheiro.

Mas a triste história do monumento estava apenas começando. Pelos 30 anos seguintes ele serviu ao seu mister de homenagear o intelectual que muitos manauaras, com certeza, não deveriam sequer conhecer, até porque o busto ficava numa posição muito elevada e não havia inscrição alguma indicando quem ele era.

Em 1934, o prefeito Pedro Severiano Nunes (1934/35), em pouco mais de um ano à frente da administração de Manaus, e não se sabe por que, resolveu mudar o monumento de sua posição inicial para outro lugar, mais adiante, no Jardim Jaú, a estação dos bondes, hoje o conhecido, e abandonado, complexo da Booth Line. A segunda agressão sofrida pelo monumento foi o sumiço do gradil que o cercava já nesta mudança. E naquele local o monumento ficou por longos 41 anos, vendo a deterioração dos prédios e do lugar à sua volta.

Apenas o busto

Em 1975 Manaus conheceu um dos prefeitos mais atuantes do período do governo militar, o coronel carioca Jorge Teixeira de Oliveira, o ‘Teixeirão’ (1975/79). As obras preferidas por ‘Teixeirão’ eram o alargamento de ruas (a av. Djalma Batista talvez tenha sido a mais representativa delas), não se importando em reduzir praças, ou mesmo acabar com elas, como aconteceu com a praça 15 de Novembro, então denominada praça Oswaldo Cruz.

Numa grandiosa ‘mexida’ que ele promoveu no Centro, na região do hoje terminal de ônibus, ‘Teixeirão’ mandou derrubar as mangueiras que ficavam em frente ao Banco do Brasil; arrancou o Pavilhão Universal, transferido para a praça Artur Bernardes, atual Ribeiro da Cunha; derrubou o famoso Tabuleiro da Baiana (originalmente parada dos bondes, com dois bares nas laterais); e colocou no chão o monumento a Sant’Ana Nery respeitando apenas o busto que, num outro pedestal, bem mais tímido que o anterior, foi levado para próximo do Relógio Municipal. Não se conhece registro fotográfico do monumento neste espaço.

“Na década de 1990 cheguei a vê-lo lá. Era um pedestal revestido de lajotas pretas, com o busto no alto”, recordou Ed Lincon.

“O busto chegou a ser roubado, mas foi recuperado e levado para o Centro Cultural Palácio Rio Negro, onde se encontra até hoje, mas quem o vê lá, dificilmente saberá quem foi Sant’Ana Nery”, concluiu Ed.

Evaldo Ferreira

é repórter do Jornal do Commercio
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