Esse estudo se passa em torno de um assunto emergente. Os debates realizados pela parcela mais politizada do terceiro setor, no Brasil, apontam para a necessidade de construção de parceria com o Estado para qualificar e fortalecer sua missão de fomentar o bem-estar social dos trabalhadores desse setor. O terceiro setor não visa substituir as ações do Estado, ao contrário, busca a construção de um novo modelo de desenvolvimento que não assuma nem a linha do Estado e nem a do capitalismo sendo, portanto, uma terceira via. Reis (1991) vê no terceiro setor um outro modelo de desenvolvimento que supera a dicotomia entre estatismo/ liberalismo. Esse autor defende a necessidade de que as bem-sucedidas experiências de desenvolvimento local se interrelacionem para mobilizar solidariedades locais, em prol de um novo projeto de sociedade, que se realiza com menos Estado, mas não sem ele.
A criação do conceito de terceiro setor potencializou a organização das ONGs em redes temáticas de atuação mundial. Hoje existe fórum de políticas públicas, fórum de economia solidária, coletivo de mulheres, de negros, de indígenas e um número extraordinário de conselhos dos mais diferentes segmentos da sociedade. Conforme Wallerstein (1997), “el poder colectivo de los individuos está siendo ahora reenplazado por el poder particular de las colectividades”. Com efeito, a necessidade de se mobilizar as solidariedades locais para a construção de um modelo de desenvolvimento mais amplo, mundial, encontra barreiras no processo de globalização que acentua as desigualdades entre países centrais e países da periferia.
De acordo com Wallerstein (1997), “siempre que en las regiones más favorecidas del sistema-mundo se dan pasos para aumentar de algún modo la demanda efectiva (aumento de los niveles salariales y de los sistemas redistributivos de salario social controlador por el estado), también se han dado pasos em otras partes del mundo para aumentar el número de productores com salarios bajos”.
Os salários dos trabalhadores brasileiros, comparados com muitos outros países, são baixíssimos. Segundo o Dieese (1996 – 1997), o custo da mão-de-obra na indústria brasileira de US$ 2.68/ hora é cerca de seis a oito vezes mais baixo do que os trabalhadores dos países centrais, a saber: US$ 16.40/hora nos EUA; US$ 19.26/hora na Áustria; US$ 24.87/ hora na Alemanha. Por outro lado, na Coréia do Sul os trabalhadores são pagos a US$ 4.93/hora; em Portugal, US$ 4.63/hora e, no México, US$ 2.41/hora. De acordo com Harvey (1992), essa nova estrutura do mercado de trabalho facilita a exploração da força de trabalho feminina à medida que é mal paga e substitui a força de trabalho masculina, geralmente melhor remunerada. A presença da mulher no mercado é crescente no âmbito do trabalho precarizado que envolve a atividade manual e rotinizada.
A expansão da terceirização e a crescente precarização de grandes contingentes de trabalhadores apontam para o aprofundamento da pobreza em níveis elevados. Mesmo o trabalho cooperativado é precarizado, em se tratando de cooperativas populares. Essa situação não confirma “a tese de que quanto mais desregulado e flexível fosse o mercado de trabalho, mais comprometido ele seria com a geração de emprego e integração social” (Pochmann, 1999).
Por toda essa análise podemos inferir que tem tudo para dar certo em nossa sociedade.
Celso Torres é economista e professor de pós-graduação da Universidade Gama Filho. E-mail: econ.cel [email protected]