Este estudo se passa em torno de um assunto emergente. A solidariedade está na ajuda de uns aos outros. Nós ajudamos os companheiros, colocando a mala na calçada, ou dentro do carro. Quando ocorre um problema no ponto um ajuda o outro (…). A cooperativa só vai para frente se tiver o cooperativismo muito na realidade; se montar uma cooperativa de fachada, ela vai morrer. Tem que haver mentalidade de cooperação trabalhando em grupo e para o grupo. É o que eu falo para o pessoal: a cooperativa é uma panela onde todos comemos dela, se essa panela quebrar, todo mundo vai ficar com fome.
A idéia de solidariedade não é nova. Os homens vivem em comunidade movidos pelo instinto de sobrevivência, são levados a conviver em grupos compartilhando hábitos e costumes necessários para a manutenção da espécie. No final do século 19, Èmile Durkheim (1868–1917) consolidou um estudo sobre solidariedade, compreendendo-a como elemento intrínseco às relações sociais. Na obra “Da Divisão do Trabalho Social” (1995), Durkheim caracteriza a sociedade moderna pelo aumento da divisão do trabalho social, exigido pela crescente complexidade das atividades econômicas. Essa complexidade é instaurativa de um tipo de solidariedade que ele denominou de orgânica, baseada na diferenciação dos indivíduos. Esse tipo de solidariedade se contrapõe à solidariedade mecânica, característica das sociedades sem escrita, onde os indivíduos diferem pouco entre si e partilham os mesmos valores e sentimentos.
A solidariedade em Durkheim decorre principalmente da existência de trabalhos especializados. Ela não ocorre por conta da identificação entre os sujeitos ou seja, não possuí vínculo de dependência afetiva e valorativa. Para esse pensador a relação de interdependência da solidariedade se estabelece através das funções sociais dos sujeitos. É a partir da intensificação da divisão social do trabalho na sociedade moderna, sob a égide do sistema capitalista, que os homens tornaram-se cada vez mais interdependentes.
Esta pesquisa confirma o fato da cooperativa popular constituir-se num espaço sócio-político-cultural de afirmação da cidadania e de reinvenção de uma nova sociabilidade, baseada na solidariedade e na postura ética como expressão de uma nova identidade entre os sujeitos coletivos que formam a instituição. De acordo com Benato (1996, p.17) “a tendência à vida comunitária tem surgido em todos os continentes e se materializa como um traço indelével e bastante profundo em nossa sociedade”.
Castel (2003) também tem se ocupado do estudo do tema da solidariedade. Retoma na recente conjuntura francesa do final do século 20 as idéias de Durkheim, reafirmando que a base das relações sociais modernas repousa sobre a reciprocidade das funções sociais. Essa análise contribui para a compreensão dos acontecimentos políticos e sociais emergentes na atualidade, na medida em que mostra a interferência da divisão social do trabalho no quadro de exigências colocado às forças produtivas como a qualificação profissional, a especialização e um certo domínio de uma língua estrangeira.
Mostra, enfim, que o Estado de Bem-Estar Social é fundado nos laços de solidariedade entre os interesses mercantis e trabalhistas. Para Castel (2003, p. 28) solidariedade “é esse vínculo problemático que assegura a complementariedade dos componentes de uma sociedade a despeito da complexidade crescente de sua organização. É o fundamento do pacto social”.
O pacto fordista/social firmado no Welfare State que passou a vigorar no Pós-Guerra funda-se na responsabilidade coletiva, quando os direitos sociais passaram a ser legalmente reconhecidos. Uma vez estremecida a sociedade do trabalho assalariado, a economia se desagrega e o Estado social perde seu poder integrador.Com isso queremos mostrar que a economia solidária é uma alternativa viável de geração de renda e trabalho para as populações mais pauperizadas.
Celso Torres é economista e professor de pós-gra