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Setor de livros preocupa-se com a criação da CBS

Setor de livros preocupa-se com a criação da CBS

A criação da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), um dos principais pontos da proposta de reforma tributária do governo, deve tornar o cenário extremamente complexo para o mercado de livros do país. É o que mostra um estudo feito pela escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV) do Rio de Janeiro, que analisou os possíveis impactos da CBS no setor editorial.

“A incidência de um tributo com uma alíquota de 12% pode trazer consequências deletérias ao setor, sobretudo porque o mercado de livros vem enfrentando grave crise financeira, causada, entre outras coisas, por forte redução na demanda”, diz Carlos Ragazzo, professor de Direito da FGV-RJ e responsável pelo estudo feito a pedido da Associação Brasileira de Editores de Conteúdo Educacional (Abrelivros), Câmara Brasileira do Livro (CBL) e do Sindicato Nacional dos Editores de Livros (Snel).

Mas para entender melhor os efeitos da CBS, primeiro é necessário compreender como o tributo funciona.

O que é a CBS?

Como o próprio nome diz, a CBS é uma contribuição e não um imposto. “A diferença é que a receita obtida com o imposto não precisa ter um destino definido, não é vinculada a alguma despesa. Já a contribuição tem destinação certa, como é o caso do PIS e da Cofins, que são necessariamente destinados à seguridade social”, explica Ângelo de Angelis, economista e tributarista.

Nos moldes de um Imposto sobre o Valor Agregado (IVA), a CBS teria duas características principais: ela unificaria os tributos PIS e Cofins e incidiria isoladamente em cada etapa da cadeia produtiva, evitando que a empresa arque com o custo tributário da etapa anterior.

“A cobrança é feita sobre a parte que cada empresa da cadeia adiciona sobre os itens, sobre o valor agregado – o que enquadra o imposto em um regime não cumulativo, que não acumula impostos ao passar para a próxima etapa de produção”, explica Eduardo Natal, mestre em direito tributário pela PUC/SP, advogado e sócio do escritório Natal&Mansur.

“No fim do dia, a ideia do governo é deixar a contribuição igual para todo mundo, mas alguns setores vão sofrer mais. E a conta pode sobrar para o consumidor final”, complementa Eduardo Fleury, tributarista sócio do FCR Law.

Uma das principais críticas à CBS esbarra exatamente nesse ponto: ao unificar a alíquota são desconsideradas as nuances de cada setor. “As dinâmicas de mercado são diferentes. Tentar empacotar todo mundo na mesma caixa pode prejudicar alguns setores de forma mais severa e desencadear uma quebradeira de empresas”, ressalta Natal.

No caso do mercado de livros, a imunidade de impostos fornece o suporte necessário para o funcionamento da cadeia de produção, na avaliação de Ragazzo, da FGV.

Mas vale ressaltar que dentro do debate sobre incentivos fiscais também há muitos economistas que consideram que a desoneração de impostos para segmentos específicos impede o avanço natural da atividade comercial e a livre concorrência.

Efeitos no setor

O mercado editorial está justamente entre os setores que serão impactados mais severamente, porque hoje ele desfruta da chamada “imunidade de impostos”, ou seja, é protegido de qualquer tipo de imposto pela Constituição Federal. Embora essa proteção não inclua as contribuições, como seria o caso da CBS, a Lei 10.865 de 2004 também isenta os livros do PIS e da Cofins.

Por isso, se a CBS for aprovada, o setor, que hoje não é tributado, passará a contribuir com os 12% sobre o valor agregado em cada etapa da cadeia. O impacto será muito mais profundo do que em outros setores, que já pagam Pis e Cofins, como a construção civil, que contribui hoje com 3,65%, ou mesmo o varejo, com 9,25%.

Rui Campos, dono da rede Livraria da Travessa, exemplifica o efeito da tributação nos livros em uma analogia com o cigarro, cuja carga tributária total pode chegar a 82% (incluindo IPI, ICMS e PIS e Cofins).

“A tributação do cigarro é alta justamente para reprimir o consumo. É a mesma lógica para o livro. Como é um produto que não tem efeitos nocivos, incentiva à cultura e o conhecimento, foi isento. As mercadorias não têm o mesmo valor cultural ou agregado. O imposto pode e deve ser usado como ferramenta de incentivo ou inibição do consumo. Mas são escolhas”, afirma o empresário.

Segundo um outro estudo feito em conjunto pela CBL, Snel e Abrelivros, os preços ao consumidor final dos livros podem subir, em média, 20%.

Segundo José Angelo de Oliveira, diretor da Abrelivros, hoje as editoras definem o preço do livro e trabalham com diferentes canais de distribuição, principalmente livrarias, para vender as obras em um modelo de consignação.

Funciona assim: a editora fecha um acordo com a livraria e envia 50 livros para expor nas suas lojas. Passado o prazo definido em contrato, a livraria diz à editora quantos livros efetivamente foram vendidos e paga por eles. Se sobrarem 30 unidades, por exemplo, a livraria pode devolvê-los sem custo ou mantê-los por mais tempo até vendê-los.

“Esse modelo não é obrigatório, mas é o mais comum. As editoras têm interesse em repassar o estoque para as livrarias porque a exposição gera oportunidade de venda. E a livraria aposta na obra sem se comprometer. É um canal importante para as editoras porque proporciona o encontro presencial entre leitor e livro”, explica Campos, da Travessa.

Em 2019 a venda para livrarias representou 41,6% do faturamento das editoras – o maior entre todos os canais, segundo estudo da Nielsen Book, que analisa os resultados do mercado editorial.

Com a pandemia, no entanto, o peso do canal físico deve diminuir este ano, abrindo espaço para o mercado online, que já vem crescendo nos últimos anos. Prova disso é que o faturamento com produtos como e-books aumentou 115% em termos reais (descontando a inflação) entre 2016 e 2019, de acordo com uma outra pesquisa da Nielsen focada em conteúdo digital. No mesmo período, o acervo digital desse tipo de produto cresceu 37%.

Redação

Jornal mais tradicional do Estado do Amazonas, em atividade desde 1904 de forma contínua.
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