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Região do desaparecimento no Amazonas é estratégica para o tráfico e tem garimpo ilegal

O município de Atalaia do Norte, no Amazonas, onde desapareceram o indigenista Bruno Pereira e o jornalista inglês Dom Phillips no domingo (5), fica em uma região no extremo oeste do Amazonas marcada pela presença do maior número de indígenas em isolamento voluntário do mundo e pela rota de escoamento de tráfico de cocaína do Peru que é distribuída para o Brasil, Europa e África.
Segundo o pesquisador da UFPA (Universidade Federal do Pará) e do Fórum Brasileiro de Segurança Pública Aiala Colares, a região de fronteira por si só costuma ser uma área de conflito, mas as especificidades de Atalaia do Norte potencializam o quadro.
“Estamos falando de uma região com uma série de problemas e conflitos ambientais e sociais. Estamos mergulhados em conflitos sociais, na Amazônia. Temos, nestes locais, populações transfronteiriças e uma região que é estratégica para o tráfico de drogas, sobretudo do Peru”, afirmou o pesquisador.
As organizações criminosas diversificam sua atuação e, segundo o pesquisador, homicídios contra quem se contrapõe aos interesses delas integram a lista.
De acordo com estudo feito pelo procurador da República em Mato Grosso do Sul Ricardo Pael Ardengui sobre o impacto do crime transnacional organizado sobre as comunidades indígenas, delitos ambientais, também característica de toda Amazônia, se tornaram mais um braço do lucro para o crime organizado que usa a região como rota de tráfico.
Segundo o procurador, nos últimos anos se observa o aumento de registros de crimes na Amazônia relacionados ao tráfico de drogas, o desmatamento e a violência contra os povos indígenas. Ele afirma que o Estado costuma tratar os três de forma isolada, mas o crime organizado atua nas três frentes.
O procurador disse que, no início da atuação de facções criminosas na Amazônia, o objetivo era usar a região para criar rotas de escoamento e que os crimes ambientais eram praticados como forma de inserção nos locais para ter alternativas de trajetos. Atualmente, segundo ele, a exploração ilegal de recursos da floresta, como ouro e madeira, é feita para ampliar os lucros dos grupos criminosos.
“No início, o PCC entrou em choque com a Família do Norte no Amazonas e começou, na tríplice fronteira. Depois diversificou o mercado e suas aplicações. A gente vê, com isso, o risco grande que correm as populações tradicionais, como os yanomami, cujo choque é evidente entre garimpeiros e indígenas”, disse.
O pesquisador da UFPA afirma que nos últimos levantamentos da Cartografia da Violência na Amazônia a região da fronteira, em Atalaia, já registrava a presença de Crias, uma facção criminosa que surgiu do desmembramento de pessoas ligadas à FDN, ao PCC e a grupos do narcotráfico da Bolívia e do Peru.
“O PCC vem de uma atuação no crime que tem uma visão mais empresarial, mais ampla do capital. O contrabando de madeira e o garimpo são usados na mesma rota e diversificam os negócios”, disse.
Aiala Colares afirma que o crime organizado se aproveita de uma atuação estatal precária na Amazônia. Também critica o governo Bolsonaro por ter facilitado e incentivado muito a atuação de garimpeiros.
O procurador afirma que a ausência de Estado é um catalisador da atuação de facções criminosas maior do “que o conceito de vazio demográfico da região”.
Só o Vale do Javari, onde ocorreu o desaparecimento, tem área equivalente a 56 vezes o tamanho do município de São Paulo.
“Nos pelotões de fronteiras, há uma atuação de combate ao tráfico de drogas, mas não há a mesma preocupação da degradação do meio ambiente. A gente vê o Exército e a Polícia Rodoviária Federal fortalecidos em alguns pontos, mas onde há degradação ambiental, na demarcação de terras indígenas, a gente não vê o mesmo empenho.”
O procurador destaca ainda que o tráfico, como em qualquer região do mundo, faz cooptação da população para dominar a região. Algumas vezes atuando nas necessidades dela outras avançando sobre a cultura dos povos tradicionais.


Ele citou o exemplo do Acre, onde houve registros de narcotraficantes que buscaram casar com mulheres indígenas para passar a ter direitos sobre as terras e iniciar plantação de coca.
Todos esses conflitos cercam e ameaçam o direito e a decisão de vários grupos e etnias que optaram pelo não contato com não indígenas e até mesmo com populações indígenas, no Vale do Javari.
Em 2021, reportagem do jornal Folha de S.Paulo mostrou que Atalaia do Norte concentrava em sua área urbana precária um número desproporcional de igrejas e missionários para a população de 20 mil habitantes.
O interesse dos missionários era a evangelização dos indígenas isolados no momento em que o governo Bolsonaro havia nomeado o pastor, antropólogo e ex-missionário Ricardo Lopes Dias para chefiar a coordenação-geral de Índios Isolados da Funai (Fundação Nacional do Índio).
Ricardo Dias substituiu justamente o indigenista Bruno Pereira, que defende o direito os indígenas ao isolamento. Na ocasião, um grupo de 14 indigenistas denunciou que a exoneração de Bruno, um dos mais experientes da Funai em relação aos isolados, era prenúncio de problemas na proteção a esses povos. As informações são da Folhapress.

Redação

Jornal mais tradicional do Estado do Amazonas, em atividade desde 1904 de forma contínua.
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