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Pró-reitor da Ufam cobra libertação das amarras burocráticas

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“Eis o lema: Libertar as Universidades e instituições de ciência e tecnologia das amarras burocráticas estagnantes”. A frase é do Pró-Reitor de Inovação Tecnológica da UFAM (Universidade Federal do Amazonas), Waltair Vieira Machado, que em entrevista concedida ao Jornal do Commercio, falou dos principais desafios enfrentado pela universidade para produzir conhecimento na área de inovação tecnológica no Amazonas.

Entre as dificuldades de aporte financeiro para a pesquisa e inovação tecnológica à preparação dos alunos e pesquisadores para ao universo da indústria 4.0, o Pró-Reitor abriu as portas do atual cenário da pesquisa da UFAM, e fez uma pequena exposição dos trabalhos e desafios enfrentados pela universidade nos últimos anos. Em meio a um momento delicado da economia, onde o governo contingenciou recursos para o ensino superior, o professor defende novas alternativas de investimentos e destacou que o momento atual é de envolver todos os parceiros da sociedade para um trabalho em conjunto mais eficaz.

Waltair é professor titular da UFAM desde maio de 2014, e tem doutorado em Física Aplicada e Engenharias pela Essex University. Possui experiência em nível de Pós-Doutorado na Universidade de Brasília e é graduado em Física e em Matemática pela Universidade de Brasília. Atua também na área da Engenharia Elétrica, com ênfase em desenvolvimento de sensores, sistemas eletrônicos de controle e sistemas integrados. Concebeu e implantou o Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção na  UFAM em 1999, coordenando-o por onze anos intercalados. Atua na área da produção, com ênfases em Estratégias Organizacionais, Estratégias de Manufatura e Gestão da Qualidade e Competitividade. Foi Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-Graduação de 1989 a 1993), vice diretor e diretor da Faculdade de Tecnologia da UFAM entre 2002 e 2009, e Secretário Executivo Adjunto de Ciência e Tecnologia do Estado do Amazonas entre 2009 e 2010.

Tem dedicado tempo ao estudo do transporte hidroviário, do planejamento de transporte e construção naval na região Amazônica e coordenou o Núcleo de Pesquisa e Extensão em Engenharia de Produção de 2011 a 2016). Atualmente exerce o cargo comissionado de Pró-Reitor de Inovação Tecnológica da UFAM até julho 2021.

Jornal do Commercio – Como andam as pesquisas em Inovação Tecnológica na UFAM?

Waltair Machado: A Pró-Reitoria de Inovação Tecnológica da UFAM foi encarregada de zelar pela política de Inovação tecnológica da Universidade desde a sua criação em 2011. Por se tratar de uma Pró-Reitoria relativamente nova, assim como a definição de sua política de inovação tecnológica, as atividades, as quais poderiam ou deveria ser conformadas no âmbito da inovação tecnológica, embora razoavelmente representativas, ainda não representam majoritariamente o potencial de Inovação presente no âmbito da Universidade. Após sua implantação, por determinação da administração superior da UFAM, toda atividade de pesquisa, seja projetos ou acordos de cooperação, precisam passar pela PROTEC para analisar sua conformidade legal quanto ao possível acesso ao patrimônio genético da biodiversidade brasileira, além do acesso ao conhecimento tradicional difuso na região. Assim sendo, foi possível mapear cerca de 330 grupos de pesquisa presentes na comunidade, dos quais 268 encontram-se ativos, regularmente credenciados no CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico). Nosso maior desafio tem sido estimular esses grupos a produzirem inovação tecnológica em suas respectivas áreas de expertise, bem como manterem mente aberta quanto a possibilidades desejáveis de produção interdisciplinar, tendência inexorável no mundo científico altamente competitivo nos dias atuais.

Então, de forma mais objetiva, temos tido um significativo sucesso em parcerias com o setor industrial e setores incentivados por políticas públicas, nos permitindo interessante volume de resultados, dadas as condições nas quais ainda a Ciência e Tecnologia brasileira busca sobreviver.

Jornal do Commercio – Como a UFAM está se preparando para adequar novos profissionais à realidade da Indústria 4.0?

Waltair- De forma geral a Indústria 4.0 vem transformando o panorama industrial global, possibilitando por meio dos projetos que seguem as suas diretrizes, novos patamares de produtividade às organizações industriais. Os países mais desenvolvidos, entre eles o Brasil e mais especificamente o PIM (Polo Industrial de Manaus), articulam-se para promover e apoiar a adoção dos preceitos da Indústria 4.0. Dentre as tecnologias centrais a esse paradigma, pode-se destacar a adoção maciça de sensores que implementam a Internet das Coisas, as técnicas de Big Data e Analytics que permitem a consolidação dos dados coletados pelos sensores e da Inteligência Artificial, em suas diversas abordagens, que permitem de forma eficiente e automatizada a conversão dos dados em inteligência. A área de Inteligência Artificial, em parte pela confluência das tecnologias citadas, vem experimentando um renascimento depois de pelo menos duas décadas de estagnação. O mercado global voltado para soluções de inteligência artificial é dominado pelos Estados Unidos, China e Israel. O Brasil possui apenas uma parcela residual deste mercado. Entretanto, nota-se que as soluções hoje comercializadas utilizam tecnologias comparativamente simples, não se aproximando, portanto, da fronteira do estado da técnica. Considerando a urgência em se avançar na adoção dos protocolos da Indústria 4.0, o papel que a Inteligência Artificial desempenha nesta iniciativa, a dependência do Brasil nos mercados mais desenvolvidos para soluções desta tecnologia e as amplas oportunidades oferecidas pelo setor para o empreendedorismo, fica evidente que as ações das Instituições de Ensino e Pesquisa da região em relação ao treinamento de Capital Intelectual, seja em nível técnico, universitário ou mesmo da qualificação em nível de mestrado e doutorado dos profissionais brasileiros, não são apenas necessárias e justificáveis, como convenientes e oportunas. Tudo isso reveste-se de caráter urgente. Ademais, a UFAM ocupa espaço privilegiado para desenvolver tal projeto em decorrência de cursos já estabelecidos na área de engenharia de produção. Além disso, temos parcerias internacionais necessárias para a consecução dos objetivos pretendidos e por se situar em um polo industrial de relevância nacional. Temos introduzido disciplinas de empreendedorismo em vários de seus cursos em nível de graduação, e também introduzido linhas de pesquisa específica na área nos cursos de pós-Graduação, nos cursos de engenharia de produção, engenharia elétrica, informática e outros. Estamos buscando envolver também as imprescindíveis áreas de engenharia mecânica, ciência dos materiais, petróleo e Gás, bem como da engenharia química. Estamos celebrando acordos de cooperação com a Universidade do Porto, do Minho, Coimbra e outras em Portugal, bem como do Instituto Fraunhofer e IAS da Alemanha. Estamos também em tratativas para parcerias com importantes Universidades Chinesas também para nos preparar para o universo da indústria 4.0

Jornal do Commercio – De que forma a medida do Governo Federal prejudicou o campo de pesquisas na UFAM?

Waltair – Os Governos Brasileiros, apesar de alguns esforços concentrados e esparsos ao longo de nossa curta história de desenvolvimento científico, nunca priorizou adequadamente o desenvolvimento de uma comunidade científica forte e marcante, salvo, como dissemos, em momentos esparsos de nossa história, como a criação do CNPq, CAPES, FINEP e outros na década de 50 e 60. Recentemente, vários estados do Brasil criaram suas fundações de apoio, as quais, salvo raras exceções como a FAPESP, não desempenham o papel delas esperados por falta do suporte financeiro adequado de seus próprios governos. Dito isto, não parece razoável concluirmos que as atuais medidas do governo já tenham conseguido causar algum impacto nas referidas atividades de pesquisa, a não ser, obviamente, no que se refere ao impacto psicossocial pela apreensão de que, se consumados os cortes, ainda divulgados pelo governo como contingenciados, não podemos, ou devemos, considerá-los como efetivos. Os recursos do tesouro, normalmente destinados à pesquisa e desenvolvimento, geralmente são disponibilizados através de suas agências como CNPq, Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior)e outros. Além de ações junto às Fundações de Apoio Estaduais como a FAPEAM e outras. Dificilmente vemos, atualmente, as instituições de ensino superior conseguindo destinar recursos consideráveis em seus orçamentos provenientes dos recursos do tesouro nacional. Temos visto sim e com frequentes protestos da comunidade, contingenciamentos inexplicáveis de recursos próprios, aqueles alcançados através de acordos de cooperação, os quais, naturalmente, não provenientes do Tesouro Nacional, e mesmo assim não podendo executá-los por falta de autorização orçamentária do Governo Federal. Portanto, o temor de que os alegados contingenciamentos se configurem em realidade é real. E se confirmados, realmente afetarão bastante uma estrutura já fragilizada pelo histórico de descaso. Porque os “cortes” estão sendo realizados na parcela destinada ao custeio das atividades normais, como a manutenção dos laboratórios de ensino, bem como daqueles de pesquisa mantidos por recursos próprios dentre outros.

Jornal do Commercio – Quais as áreas mais afetadas e que medidas precisam ser tomadas para mudar o quadro?

Waltair – Como dissemos, as pesquisas mais relevantes do ponto de vista de resultados estratégicos, normalmente são realizadas em laboratórios que não podem depender das fontes escassas do Governo Federal no âmbito do orçamento de manutenção de suas atividades correntes. Normalmente, esses Laboratórios são mantidos majoritariamente com recursos provenientes de acordos de cooperação, seja de órgãos de fomento oficiais como CNPq, CAPES, FINEP, BNDES e outros. E outras de fundos setoriais como o Fundo Amazônia e também de empresas através das Leis de incentivos fiscais como as Leis de Informática e do Bem, ou mesmo de contratos diretos de desenvolvimento de tecnologia, atualmente em estágio crescente na UFAM. Assim sendo, não se parece configurar solução mais adequada que o Estado Brasileiro, Executivo, Legislativo e Judiciário, assumirem o papel deles esperado de alavancador de oportunidades ao bem estar do povo que supostamente eles representam. Além de destravar as possibilidades reais de captação de recursos diretos pelas universidades, sem os constantes constrangimentos e ameaças de cerceamento a seus gestores, no alegado afã de se impedir o mal uso de recursos, contrariando os preceitos constitucionais de que “Todo cidadão brasileiro, incluídos os gestores públicos, é de boa fé, até que se prove o contrário”. Não se advoga aqui, de forma alguma, o relaxamento quanto aos princípios de moralidade pública, mas sim, que se evite que o geralmente infundado receio do desvio de recursos seja motivo constante de cerceamento de iniciativas empreendedoras e de apoio ao desenvolvimento das atividades de pesquisa e desenvolvimento das universidades e centros de Pesquisa. O caso em tela, exemplifica o tão frequente resultado de escassez no qual vivem a maioria dos pesquisadores brasileiros, boa parte deles muito competentes e, até mesmo acima da média mundial, bem como a maioria dos laboratórios de pesquisa e desenvolvimento à eles vinculados. A proposta, por fim, é que seja revista a legislação específica envolvendo as instituição de ensino superior e instituição de ciência e tecnologia brasileiras, de forma a permitirem que realizem os acordos de cooperação e possam receber aportes financeiros ou doações para objetivos claros e específicos, bem como realizarem atividades conjuntas com quem quer que seja, desde que voltadas ao desenvolvimento social, econômico e cultural das comunidades que delas dependam direta ou indiretamente.

Jornal do Commercio – De que forma o Governo do Estado pode atuar de forma mais próxima à Universidade para que o processo de produção de conhecimento no Amazonas possa ser mais efetivo e conhecido?

Waltair – Embora o Executivo esteja sendo responsabilizado pelas atuais amargos do sistema de ciência e tecnologia brasileiro, na realidade, trata-se de um problema do Estado brasileiro. Como mencionei na resposta anterior, a necessidade de todo o Estado se conscientizar da natureza especial das Instituições de ensino pesquisa e extensão, não delimitando-as como se meras autarquias públicas ou mesmo privadas fossem. As universidades são entidades com finalidades especiais, muitas delas difusas e de risco. Investimento em pesquisa e desenvolvimento, embora fundamentais, não representam certeza de resultados palpáveis e incontestes. O sucesso das nações hoje consideradas por nós como desenvolvidas, já nos antecederam nesses procedimentos e são unânimes em demonstrar que as instituições de ensino superior e ciência tecnologia, precisam de liberdade para direcionar seus estudos em acordo com as demandas da sociedade à qual, supostamente elas servem. Em assim sendo, tem sido extremamente danoso ao desenvolvimento científico e sociológico brasileiro, o estado frenético de controle sobre nossas instituições, reduzindo-a a meras autarquias, impedindo-as de desempenharem seu fundamental papel de criadoras de soluções e fomentadoras de oportunidades aos brasileiros, como acontece nos países cujo Marco Legal conferem às suas Instituições a liberdade de ações como aqui advogadas, sem, novamente, abrir mão dos cuidados razoáveis que deve exercitar as sociedades desenvolvidas. Eis o Lema: Libertar as Universidades e instituições de ciência e tecnologia das amarras burocráticas estagnantes que as têm mantido em constante subutilização de suas competências e saberes, antes que seja tarde.

Jornal do Commercio – Quais as ações práticas que a UFAM está realizando para se aproximar mais da sociedade?

Waltair – A Universidade Federal do Amazonas foi uma das pioneiras, senão a pioneira, em criar uma Pró-Reitoria específica para cuidar da política institucional de Inovação. Além de aplainar os caminhos para que o relacionamento com a sociedade organizada no quesito empreendedorismo e inovação tecnológica possa se fortalecer e se consolidar como atribuição fundamental ao desenvolvimento lato sensu da sociedade. A atual administração vem atualizando toda a sua legislação interna, buscando acelerar seus procedimentos decisórios para reverberar as oportunidades preconizadas na legislação atualmente revigorada rumo ao amadurecimento que pudemos apontar nas discussões anteriores, embora ainda insuficiente, como já reclamado. Nosso ritual de tomada de decisão tem sido muito, talvez excessivamente, cauteloso com o que os órgãos de controle falam, provocando uma inevitável demora nos processos e, culminando em severas perdas de oportunidades, contra as quais lutamos ferrenhamente para evitar. No quesito ações práticas de aproximação com a sociedade, destacamos o florescimento de toda uma comunidade de empresas juniores criadas para agirem com berçários de empresas de base tecnológica, as chamadas “Start Ups” e, se bem sucedidas “Spin Offs”. Introduzimos várias disciplinas e linhas de programas em nossos cursos, tanto de Graduação quanto de Pós-Graduação, no afã de fomentar as iniciativas inovadoras e também transformá-las em empreendedoras. Como o tema “4ª Revolução Industrial ou Indústria 4.0 é muito recente, datando de não menos que 2009 na Alemanha, também no Brasil configura-se como novidade. Em virtude de nossas ligações óbvias e outras nem tanto, com o povo português que tem tido o privilégio de desenvolver-se perceptivelmente bem neste quesito, provavelmente pelas conhecidas ligações com a Alemanha (sabidamente nação ávida e grande consumidora de conhecimento e inovações tecnológicas), a UFAM tem buscado se valer dessas ligações com as universidades portuguesas, bem como de outras nações como a própria Alemanha e China. A finalidade é de celebrar acordos de cooperação que nos permita alinhar propostas para o desenvolvimento de cursos multiplicadores de conhecimento como mestrado e doutorado em Indústria 4.0, a coqueluche do momento. Além dos cursos de formação no quesito em tela, a UFAM tem conseguido apresentar propostas bem sucedidas de pesquisa, desenvolvimento e inovação tecnológica a várias empresas parceiras, o que tem reavivado bastante os potenciais dos grupos de pesquisa.

Jornal do Commercio – Como está a receita hoje da UFAM para a produção de conhecimento em novas tecnologias?

Waltair – Não é tarefa fácil dimensionar um número preciso de receita, uma vez que as propostas tramitam pela PROTEC no momento inicial, sendo as formalizações jurídicas e acompanhamento financeiro das propostas realizadas em outros setores. Das propostas analisadas durante 2018 e no ano corrente, catalogamos um total no entorno de R$ 140 milhões de reais, muitas das quais sequer chegam a ser contratadas por razões variadas, incluindo a demora na tomada de decisões. Algumas dessas oportunidades, infelizmente foram perdidas, por algumas das razões já apontadas. Temos, contudo, boas propostas em execução e em fase de iniciação envolvendo alguns dos Cursos de Pós-Graduação da área e projetos específicos de desenvolvimento de tecnologia sensível, algumas delas resguardadas de sigilo por questões de interesse industrial, os quais necessitam ser preservados.

Jornal do Commercio –  O que falta para a sociedade enxergar mais os projetos científicos produzidos pela Ufam?

Waltair – O resultado mais óbvio que a sociedade tem enxergado é a qualidade do Capital Intelectual que a Universidade tem disponibilizado à ela, sociedade. Parte considerável dos cidadãos que desempenham funções proeminentes na sociedade, seja nas organizações de Estado, seja em setores específicos como o industrial, testificam serem egressos da UFAM, muitos deles frequentadores dos laboratórios de desenvolvimento científico e tecnológico da Universidade. Quanto aos resultados de impactos diretos na sociedade, ainda não desenvolvemos mensuradores confiáveis, visto que as oportunidades criadas podem ser identificadas pelo número de oferta de empregos ou ações de contribuição ao desenvolvimento sócio-econômico, seja pela geração de riquezas com retornos em impostos e salários ou impactos indiretos da atividade econômica dinamizada. A sociedade pode e deve tomar conhecimento desses resultados através do trabalho sério e divulgativo da imprensa que tem desempenhado papel fundamental nesse particular, pelo que, nos colocamos à disposição para esses momentos de divulgação exitosa do trabalho da Universidade Federal do Amazonas em prol do desenvolvimento tecnológico, científico e social dos povos da Amazônia.

 

Redação

Jornal mais tradicional do Estado do Amazonas, em atividade desde 1904 de forma contínua.
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