Em 30 anos, os planos de saúde serão impagáveis. Pesquisa do Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor) aponta que o comprometimento da renda do consumidor, que hoje chega a 7%, passará a 73%. “A situação exige urgência, medidas precisam ser tomadas para que o consumidor não seja prejudicado e pague um valor justo pelo serviço prestado”, alerta a economista do Idec, Ione Amorim.
Uma consumidora que sentiu essa diferença foi a empresária Marina Santana, que nos últimos anos mudou de plano de saúde três vezes e em casos extremos acaba optando pelo serviço público. “A diferença de preços é bem grande, ainda mais para quem paga para toda a família, como é o meu caso e, além disso, a qualidade da maioria deixa muito a desejar”, disse a consumidora.
Já para a funcionária pública, Amanda Freitas, não compensa, exceto no caso de quem possui criança pequena ou idosa na família. “É claro que é essencial ter um plano de saúde, mas há meses que não usufruímos do serviço e mesmo assim pagamos, não acho justo, inclusive já aconteceu de eu precisar usá-lo e ele não cobrir”, lembra.
Mais que a inflação
Hoje, o consumidor gasta, em média, 7% de sua renda com planos de saúde. Segundo estudo do Idec, em 30 anos, esse custo será insustentável, representando 70% de seu salário. Há dois anos, o mesmo levantamento apontou 54,12%. Em apenas dois anos, o reajuste dos planos cresceu mais do que a inflação, sete pontos percentuais.
A relação entre o reajuste dos planos de saúde individuais e familiares e a inflação (IPCA) acumulada entre 2002 e 2012 apresentou uma diferença de 38,12%. Esse resultado indica que os planos de saúde continuam a ser corrigidos acima da reposição inflacionária, ampliando ainda mais o descasamento com a recomposição de renda do consumidor, feita pelo índice de inflação. “Isso mostra que para chegar a 70% não é difícil”, salienta Ione Amorim.
Segundo a economista do Idec se essa diferença entre os índices se mantiver nos próximos 30 anos, o consumidor perderá a capacidade de pagamento dos planos de saúde. “Projetando a diferença dos índices para as próximas três décadas, as mensalidades serão corrigidas em 163,49% acima do IPCA”, explica a economista.
Para Ione, com isso o consumidor irá acabar optando pelo serviço público, que já passa por gargalos como a dificuldade e lentidão de marcação de consultas. “E como os planos individuais são divididos por faixa etária, quem possui mais idade acaba sendo prejudicado, pois carece mais ainda, inviabilizando o consumidor de manter o pagamento, que é quando ele mais precisará”, explica Ione.
Simulação de plano de saúde levando em conta o reajuste
Um consumidor que tem, hoje, 30 anos, e que possui um plano individual em torno de R$ 210,07 (valor ilustrativo de um plano individual de uma grande operadora), com renda de R$ 3.000,00 por mês, compromete 7% de seus rendimentos para honrar seus compromissos com a operadora. Se forem mantidas as condições de reposição salarial e as regras atuais de reajuste dos planos de saúde, quando este consumidor completar 60 anos, terá, primeiramente, mudado de faixa etária, e seu plano de saúde terá sofrido um acréscimo de 296,79%.
“Além desse acréscimo, se aplicado o reajuste de 163,49% acima da inflação no período, seu plano passará dos R$ 210,07 para R$ 2.196,28, o que representaria 73,21% de sua renda, e inviabilizaria o pagamento do plano de saúde”, conclui Amorim.
“A simulação leva em conta somente o reajuste dos planos individuais/familiares, que são regulados pela ANS e representam cerca de 20% do total dos mais de 48 milhões de consumidores de planos e seguros de saúde no país”, lembra a advogada do Idec, Joana Cruz.
Note-se que esta projeção é baseada na diferença entre os reajustes de planos e a inflação dos últimos dez anos, não sendo necessário, assim, estimar a inflação do período. “Caso a projeção se concretize, a destinação de mais de 70% da renda de um consumidor ao pagamento do plano de saúde configura uma obrigação excessivamente onerosa, o que, de acordo com o CDC, é prática abusiva e passível de anulação pelo Poder Judiciário”, completa.
O Idec realizou essa mesma simulação em 2010, e na ocasião, o índice de reajuste da ANS acumulado no período entre 2000 e 2010, apresentava um crescimento de 31,36% acima da inflação. Na ocasião, a diferença projetada para os 30 anos apontava um comprometimento de renda de 54,12% da renda do trabalhador. Os resultados do último levantamento indicam que o reajuste dos planos individuais e familiares vêm se distanciando ainda mais em relação ao IPCA, pois em apenas dois anos, essa diferença cresceu em mais sete pontos percentuais.