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O reajuste das mensalidades dos planos de saúde

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A ANS (Agência Nacional de Saúde) autoriza a comercialização de 3 espécies de planos de saúde:o individual ou familiar; o coletivo empresarial,que oferece cobertura aos vinculados à pessoa jurídica por relação empregatícia ou estatutária; e o coletivo por adesão, que oferece cobertura aos vinculados à pessoa de caráter profissional, classista ou setorial. Esses planos sofrem reajustes anuais.

No Brasil existem 47 milhões de usuários de planos de saúde. 38 milhões estão vinculados aos planos coletivos por adesão, o que corresponde a 80% dos beneficiários, e 9 milhões são contratos individuais ou familiares. Apenas o plano individual está obrigado a implementar o reajuste anual no percentual fixado pela ANS (sempre muito acima da inflação do período) e as operadoras não estão obrigadas a ofertá-lo no mercado. O reajuste dos demais planos é estabelecido livremente pelas operadoras.

Neste ano, a ANS fixou o limite do reajuste dos planos individuais em 10%, enquanto a inflação medida pelo IPCA, nos últimos 12 meses, não alcançou três. Por sua vez, o reajuste dos planos coletivos fixado pelas operadoras é quase o dobro do previsto para os planos individuais. Não sem motivo, os planos individuais estão ficando escassos no mercado e cada vez mais os consumidores recorrem ao Poder Judiciário questionando, por exemplo, o reajuste das mensalidades.

Em recente auditoria (TC 021.852/2014-6) realizada pelo TCU (Tribunal de Contas da União) na ANS com o objetivo de avaliar as suas ações referentes aos reajustes anuais dos planos de saúde individuais e coletivos, concluiu-se, com relação aos planos coletivos,que não há procedimentos e mecanismos adequados e suficientes para prevenção, identificação e correção de reajustes abusivos e a atuação regulatória não é suficiente para mitigar o risco de que os reajustes onerem excessivamente o consumidor. Com relação aos planos individuais, afirmou-se que há falhas nos procedimentos e mecanismos utilizados na definição do teto dos reajustes, falta transparência na metodologia utilizada e insuficiência de mecanismos para evitar a ocorrência de duplo impacto de fatores exógenos no índice de reajuste.

Com fundamento nessa auditoria, em maio deste ano, Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor) ingressou com ação civil pública (Processo 5010777-40.2018.4.03.6100) contra a ANS na Justiça Federal de São Paulo requerendo a declaração de abusividade e ilegalidade, assim como a exclusão e a compensação dos índices máximos de reajustes dos planos individuais e familiares autorizados pela ANS desde 2009, em face da adição do impacto dos fatores exógenos no índice.
Interessante destacar que na ação o Idec elaborou gráfico demonstrando a evolução dos índices dos planos de saúde individual em relação à inflação medida pelo IPCA no período de 2007/2017. O percentual fixado pela ANS alcançou o patamar de 158,66%, enquanto que o IPCA chegou a 87,33%. Uma abismal diferença de 71,33%. Nos planos coletivos, cujo percentual é fixado pelas operadoras, essa diferença foi muito maior.

O juiz concedeu tutela provisória fixando como reajuste o percentual de 5,72% referente ao índice do “setor de Saúde e Cuidados Pessoais”, integrante do cálculo do IPCA, no período de maio de 2017 a abril de 2018. A decisão, porém, foi suspensa pelo TRF da 3ª Região.Essa é daquelas ações que o consumidor deve acompanhar de perto.
Ninguém em sã consciência defende o tabelamento de preços de planos de saúde, posto que o ato violaria a livre concorrência e iniciativa enquanto princípios da ordem econômica capitalista brasileira. Tabelar preços não é uma boa ideia como demonstra a história recente do país, com o Plano Cruzado. Por outro lado, é importante lembrar que a defesa do consumidor também é princípio informador da ordem econômica brasileira, em função de sua hipossuficiência e vulnerabilidade, e que os serviços de saúde, públicos e privados, são de relevância pública, daí a necessidade de sua regulamentação, fiscalização e controle pelo Poder Público e a justificativa para a criação da ANS. Esses princípios estão escritos em letras garrafais na Constituição Federal.

Por outro lado, é fato que milhares de pessoas abandonam seus planos de saúde e não é difícil imaginar o motivo. Reajustes em percentuais excessivos inviabilizam o pagamento da mensalidade, uma vez que os salários não são reajustados nos mesmos índices dos planos, e por certo, em médio e longo prazo, inviabilizarão o próprio serviço explorado pelas operadoras.

O certo é que “alguma coisa está fora da ordem”, como diria Caetano. Ou há intervenção de mais ou de menos do Estado na atividade impedindo a livre concorrência e com isso debilitando ainda mais o consumidor. Será? E você, se importa?

Júlio Brandão

É Advogado e Procurador do Estado
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