Como assegurar os direitos do trabalhador em um novo mundo em que cada vez menos se terá emprego com carteira assinada? Como gerar trabalho na era dos robôs e demais máquinas, que são mais rápidas, econômicas e nem pegam com coronavírus? Como financiar a previdência baseada em contribuições sobre folha quando salários deixam de ser a forma de renda dos trabalhadores? Como amparar trabalhadores sem direito ao seguro-desemprego se eles sequer tinham empregos? Não faltam questões por responder diante dos impactos sobre o trabalho das mudanças econômicas e sociais radicais promovidas pela revolução digital.
A Covid-19 acelerou tendências já postas para o futuro do trabalho. Surgirão com mais frequência oportunidades e postos de trabalho a serem exercidos e ocupados por trabalhadores, que, embora existam formalmente, não possuirão a carteira assinada. Já é uma realidade o trabalho em casa (home office) e a economia compartilhada (bem simbolizada pelo Uber). Muitas outras formas de trabalho virão e se acelerarão, ainda mais agora com a atual crise pandêmica.
Dois são os grandes fenômenos esperados da revolução já em curso: 1) haverá desemprego maciço provocado pela automação, o que já atrai muita atenção e preocupação há algum tempo, no exterior. Tido como inevitável, discutem-se cada vez mais paliativos; e 2) ainda que menos comentados, também são esperados arranjos mais flexíveis de trabalho para lidar com ocupações que ainda venham a ser criadas pelas novas tecnologias, cuja inovação e mobilidade não demandam empregados fixos. É um cenário terrível para o emprego: os que tendem a ficar imunes ao desemprego, por outro lado, não deverão ter emprego tradicional. Não devem se tornar informais e ilegais se leis e políticas públicas bem regularem o trabalho sem carteira.
É bom alertar que tais conceitos e contextos diferem do que se convencionou recentemente chamar no Brasil de “terceirização” e de “pejotização”. Não é só uma diferença linguística.
A nova dinâmica de trabalho irá muito além da “terceirização” porque ela contempla que o trabalhador seja formalmente empregado por um terceiro, no lugar do próprio demandante daquele trabalho. As novas funções tendem a pouco resultar em carteira assinada, nem mesmo indiretamente. Já “pejotização” é a expressão só usada no Brasil e mal colocada. Pressupõe que foi decisão exclusiva do trabalhador optar por se transformar em uma firma individual, como se ele fosse um grande masoquista que abrisse mão de ser remunerado com salário, e não quisesse receber férias e gratificação, décimo terceiro, proteção em caso de doença e aposentadoria, fora outros direitos. É premente reconhecer que é o empregador que contorna um dos custos mais caros no mundo para se empregar formalmente, sobretudo aquele de alto salário.
A revolução da tecnologia está a transformar de forma abrupta, rápida e constante a economia e a sociedade, em todo o mundo. Sem emprego, sem previdência, sem estado. Esse é um dos múltiplos desafios que o Brasil e o mundo precisarão equacionar.