A crise econômica global criada pelo rastro da pandemia do Covid 19 levou o governo brasileiro a reduzir novamente sua estimativa de crescimento para 2020, nesta sexta (20), ao apresentar o Relatório Bimestral de Avaliação de Receitas e Despesas. Embora tenha adotado um viés mais realista nesta nova revisão, a Secretaria Especial de Fazenda do Ministério da Economia ainda aposta que o país conseguirá encerrar o ano no azul e avançar 0,02%.
Na semana passada, a própria equipe econômica havia revisado para baixo, a estimativa de crescimento, mas em um patamar bem mais otimista: de 2,4% para 2,1%. Na ocasião, a Secretaria de Política Econômica, vinculada à Secretaria Especial de Fazenda, anunciou que o Covid 19 teria impacto de até 0,5 ponto percentual no PIB. As novas projeções apontam que a pandemia praticamente acabará com todo o crescimento orginalmente previsto.
Em sintonia, a Cepal (Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe), reviu sua estimativa para a economia do subcontinente em 2020 (+1,3%) – que já era pessimista – para uma queda de 1,8% do PIB latino-americano em decorrência do Covid 19. Nesse cenário, a taxa de desemprego pode aumentar em dez pontos percentuais.
Nesse cenário, o número de pessoas pobres da região subiria de 185 milhões para 220 milhões, enquanto a extrema pobreza passaria a contabilizar 90 milhões de cidadãos – contra os 67,4 milhões atuais. Em termos percentuais, as duas fatias subiriam para 35% e 14,5% do contingente latino-americano, respectivamente. Em nota distribuída à imprensa, a secretária executiva da Cepal, Alicia Bárcena, reforçou que a crise do Covid-19 “entrará para a história como uma das piores que o mundo já experimentou”.
“Tímido e errático”
O Brasil fechou 2019 com alta de 1,1% no PIB, enquanto o Amazonas subiu 5,76%. Mantidas a mesma dinâmica registrada no ano passada e as mesmas proporções para os desempenhos de ambos, um crescimento de 0,02% na economia nacional implicaria em uma expansão de 0,11%. Caso a taxa de desocupação do Amazonas – 12,9% ao final de 2019, segundo o IBGE – ganhasse dez pontos percentuais pelo avançar da crise, como a alerta a Cepal, encostaria em 23%.
No entendimento do presidente do Corecon-AM (Conselho Regional de Economia do Estado do Amazonas), Francisco de Assis Mourão Junior, o governo federal ainda está sendo ao mesmo tempo otimista em suas previsões e errático e tímido em suas ações para conter os estragos econômicos gerados pelo novo coronavírus, dado pelo isolamento e a contenção do consumo, impactando na queda de produção, vendas, investimentos, empregos e arrecadação.
“Uma hora o governo diz que é fantasia ou histeria, outra admite que a situação é grave e que exige medidas e revisões. Acho que dificilmente o PIB brasileiro deixará de fechar no vermelho neste ano. Já estamos vendo os efeitos da queda da circulação no varejo, em horários restritos: férias coletivas e planos de demissão voluntária. Se a situação se estender, veremos fechamento de lojas”, alertou.
Calamidade pública
O economista avalia que, a despeito da declaração de estado de calamidade pública – que possibilita a flexibilização dos gastos públicos em uma situação emergencial – e de ter tomado algumas medidas pontuais corretas, o governo federal ainda sinaliza timidez em suas resposta à crise, como se ainda estivesse em “compasso de espera” para ver o tamanho da mesma.
“Os efeitos da crise já são agudos e crescentes, exigindo medidas mais energéticas para conter, principalmente, o avanço do desemprego. O problema que já estamos com um índice alto de desemprego. O governo vai ter que liberar mais FGTS para injetar recursos na economia, além de tomar outras iniciativas, que incluem maior flexibilidade para as empresas não quebrarem, e até mesmo assistencialismo para manter as faixas mais baixas de renda consumindo. Em uma situação normal, o governo tem que ser eficaz. No ambiente de crise atual, vai ter que intervir mais e se endividar mais”, finalizou.
Gastos maiores, receitas menores
Em seu Relatório Bimestral de Avaliação de Receitas e Despesas, o governo aumentou em R$ 12,3 bilhões a previsão de arrecadação de Imposto de Renda Pessoa Jurídica e de Contribuição Social sobre o Lucro Líquido por causa do aumento do lucro de empresas em 2019. No entanto, a queda da atividade econômica fez o Ministério da Economia reduzir em R$ 16,9 bilhões a estimativa de arrecadação do PIS (Programa de Integração Social) e da Cofins (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social) e em R$ 3,5 bilhões a arrecadação de IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados).
Já se espera também uma elevação de R$ 6,331 bilhões nas despesas primárias. O governo levou em conta o aumento de R$ 12,636 bilhões nos gastos obrigatórios e a redução de R$ 6,306 bilhões nos gastos discricionários (não obrigatórios) do Poder Executivo. Originalmente, a redução nas despesas discricionárias acarretaria problemas para a manutenção de serviços públicos, como emissão de passaportes, fiscalização e estrangulamento das universidades federais. No entanto, o estado de calamidade pública dispensou a redução de verbas em 2020. Dessa forma, os serviços públicos têm espaço fiscal para funcionarem normalmente no ano.