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No meio do lago tinha um hotel

No meio do lago tinha um hotel

Manaus possui uma lista de hotéis que, desde o início do século passado marcaram, e marcam, na história da cidade com existência glamourosa por décadas até chegar o ocaso. Hotel Cassina, Grande Hotel, Hotel Amazonas, Tropical Hotel, Ariaú Jungle Tower e um quase desconhecido, mas que acompanhou o crescimento e o declínio do turismo em Manaus, até hoje combalido, o hotel Janauarylândia.

Tudo começou com o visionário empreendedor português Vasco Tavares Guimarães Vasques, que chegou a Manaus em 1944 como representante da empresa de aviação Panair do Brasil. Vasco Vasques tem seu nome, hoje, eternizado no centro de convenções ao lado da Arena da Amazônia não por acaso. Foi ele um dos primeiros a lançar luz sobre o turismo ecológico no entorno de Manaus.

“Em 1963, aproveitando ser o representante de uma empresa aérea que trazia muitas pessoas a Manaus, meu pai, junto com os sócios Fernando Câmara e Clóvis Vale, comprou o Hotel Amazonas e, nesse mesmo ano fundou a Selvatur, primeira agência de turismo da Região Norte, registrada oficialmente pela Embratur, em 1965, com o número 01”, lembrou Jorge Vasques, um dos quatro filhos de Vasco.

Jorge Vasques é um dos quatro filhos de Vasco Vasques

Mas o idealismo de Vasco Vasques não parou por aí. O turismo ecológico local evoluiu com ele quando a Selvatur começou a levar turistas para conhecer o rio e o entorno de Manaus, daí surgindo o hoje internacionalmente famoso passeio ao encontro das águas. Foi num desses passeios que Vasques conheceu o lago Janauari, local então repleto de vida selvagem, ribeirinhos, pequenos lagos com vitórias régias, águas piscosas, pássaros e mamíferos vistos facilmente nas matas. Nem demorou para ele idealizar e construir no lago um restaurante flutuante.

Piscina no meio do lago

“A Janauarylândia começou em 1966 com um restaurante, uma pequena lanchonete e uma loja de artesanato, tudo flutuante, sobre toras de assacu. Com a implantação da Zona Franca, em 1967, e a chegada de turistas a partir da década seguinte, visando comprar os artigos importados das inúmeras lojas de Manaus, o restaurante foi totalmente reformado, ganhando uma piscina e o hotel com 24 apartamentos, 12 em baixo e 12 em cima, todo construído com itaúba. Em cima, na frente, com varanda, havia duas suítes”, contou.

Área da piscina do Hotel Janauarylândia

Na parte de trás de todo o complexo, também flutuantes, ficava a casa de máquinas, geradores, a manutenção e rouparias.

“O hotel Janauarylândia recebia turistas não só da Selvatur, mas de outras agências, que começaram a surgir aos montes na cidade em virtude da quantidade de turistas que chegavam ávidos pelos produtos importados da Zona Franca”, disse.

“Os passeios podiam ser de um dia ou quantas pernoites o hóspede desejasse. Tinha gente que ficava para pescar piranhas, focar jacarés, ver as vitórias régias, visitar as casas dos caboclos ribeirinhos, fotografar orquídeas e outras flores, e praticar o bird watching. Vale lembrar que essa programação, mantidas até hoje pelas agências de turismo, surgiram a partir da Selvatur”, completou.

Da mesma forma que o hotel Janauarylândia, o restaurante flutuante fazia igual sucesso, tanto que, ainda no final da década de 1960, se criou o Jantar Flutuante às sextas-feiras e sábados, com cardápio de comidas, frutas e bebidas regionais.

“O restaurante ficava lotado tanto de manauaras, quanto de turistas, tinha música ambiente, às vezes música ao vivo e mesmo atrações nacionais. Chegávamos a receber de 250 a 400 pessoas numa única noite”, falou Jorge.

Rebocado para longe

O auge do turismo de compras começou na década de 1970 e durou por toda a década seguinte, com Manaus recebendo milhares de turistas brasileiros em busca dos produtos importados com preços bem mais acessíveis do que no resto do país. Foi o auge, também, do hotel e do restaurante flutuante, mais as lojinhas de artesanato, cujo complexo passou a ser conhecido por Janauarylândia.

“O hotel Janauarylândia viveu seu auge nesse período, pois muitos dos turistas que vinham para realizar compras, aproveitavam para fazer turismo ecológico, com os vários tipos de passeios citados antes, oferecidos pelas agências de turismo”, revelou.

Mas, seguindo a sina dos outros hotéis listados no início da matéria, o ‘boom’ de sucesso do hotel Janauarylândia também chegou ao fim.

Em 1990, o governo do presidente Fernando Collor de Mello (1990/1992) reduziu as tarifas de importação para todo o resto do país e Manaus perdeu aquele que era o ponto forte do modelo Zona Franca, impostos mais baixos barateando o custo dos importados.

“Imediatamente sentimos o ‘baque’. Os turistas brasileiros deixaram de vir para Manaus em grande quantidade. O Hotel Amazonas foi ficando vazio, e como extensão, o Janauarylândia. Foi então que a Petrobras fez uma oferta de compra do hotel flutuante, que seria levado do lago para servir de hospedagem para seus funcionários em algum dos rios da Amazônia onde estivessem trabalhando. Aceitamos”, recordou.

Em 1994 o majestoso hotel Janauarylândia foi levado embora do lago, rebocado, de forma triste, deixando para trás o restaurante e as lojinhas, que até hoje existem lá. Nunca mais Jorge Vasques soube de seu paradeiro.

Evaldo Ferreira

é repórter do Jornal do Commercio
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