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‘Não podemos repetir erros do passado’, diz Wilson Périco

‘Não podemos repetir erros do passado’, diz Wilson Périco

O presidente do Cieam (Centro da Indústria do Estado do Amazonas), Wilson Périco, avalia que as mudanças com a reforma tributária e questões envolvendo segurança jurídica estão entre os maiores desafios do Amazonas nas discussões em defesa da ZFM (Zona Franca de Manaus). Até lá, haverá muita ‘queda de braço’ em Brasília.

E, some-se a isso, como em 2020, a crise sanitária por conta da pandemia que deve ainda impactar negativamente nas atividades econômicas do País em 2021. Cogitado nos bastidores, o fim do auxílio emergencial do governo federal trará também mais dificuldades para as classes sociais de menor poder aquisitivo.

Segundo Périco, as lideranças industriais estão fazendo a sua parte para enfrentar a situação adversa causada pelo novo coronavírus, seguindo rigidamente os protocolos de segurança. Mas critica os gestores locais pela deficiência no sistema de saúde.

“A situação continua a mesma desde o começo do ano, agravada agora com uma possível segunda onda da pandemia. Foram enviados recursos, mas não cabe a mim julgar se eles foram aplicados ou não. Como cidadão, admito que estou muito preocupado”, afirma.  

Segundo ele, o ano que se inicia exigirá mais esforço de lideranças empresariais, políticas e governamentais do Estado no embate pela manutenção dos incentivos regionais, principalmente tendo no governo Jair Bolsonaro (sem partido) um ministro como Paulo Guedes, avesso a praticamente qualquer tipo de renúncia fiscal.

“O Ministério da Economia condiciona a aprovação de projetos e PPBs a iniciativas que gerem empregos. O País não tem grandes indústrias nacionais, mas sim multinacionais que replicam aqui todos os seus processos mundiais de mercado de consumo”, diz.   

De acordo com Perico, as indústrias desenvolvem hoje estudos com a FGV (Fundação Getúlio Vargas) sobre a ZFM que servem de subsídios para a bancada federal na luta pela preservação do modelo.

“Precisamos desmistificar esses absurdos de que a Zona Franca é prejudicial ao Brasil”, salienta. “A indústria repassa R$ 1,4 bilhão/ano para o Estado”, acrescenta. Perico revela que esse trabalho vem sendo desenvolvido com recursos das próprias empresas industriais, sem nenhuma participação financeira da prefeitura de Manaus e do governo do Amazonas.

“Nosso interesse é só preservar um projeto que representa hoje a maior receita do Estado. Sem ele, a economia regional não sobrevive. Temos que buscar outra matriz econômica que se some às atividades da ZFM”, afirma. “Não podemos repetir os erros do passado, como aconteceu com o ciclo da borracha”, acrescenta.

Wilson Perico falou exclusivamente ao Jornal do Commercio.

Jornal do Commercio – A pandemia afetou muito a economia em 2020. Qual o balanço da indústria sobre as atividades num ano tão adverso e o que se espera para 2021?

Wilson Perico – Mesmo em situações adversas, a indústria não parou. Mas seguimos rigidamente os protocolos de segurança. Essa ameaça de segunda onda da pandemia é motivo de muita preocupação para todos.

Nosso sistema de saúde continua muito deficiente. Deveria estar preparado para receber a população. A deficiência não acontece por conta da Covid-19. Ela se agrava porque não existe praticamente a mínima infraestrutura no setor. A situação continua caótica como no início de 2020, na fase mais aguda da doença.

A questão da saúde é de responsabilidade dos governantes. Para isso eles foram eleitos. Houve repasses do governo federal para todos os Estados, mas não cabe a mim julgar se eles foram aplicados devidamente ou não.

Nós, como indústria, estamos fazendo nosso papel. Contribuímos com mais de 240 toneladas de alimentos, fabricamos EPIs, álcool em gel. Mas os governos precisam fazer a sua parte.

JC – As unidades de saúde particulares estão com 100% de suas capacidades lotadas. Como cidadão e dirigente, como recebe uma notícia dessas?

Wilson Perico – Com muita preocupação. Eu tenho acompanhado muitos dados mostrando que o sistema público está com 70% das UTIs ocupadas. Tem uma grande ocupação no Delphina Aziz, que é um hospital de referência.

E essa foi uma das conversas que tivemos com o governo, a possiblidade de transferir pacientes desse hospital para outras unidades hospitalares. Existe muito esforço.

Mas tudo tem limites. Precisamos não deixar o sistema colapsar. Como cidadão e dirigente, posso afirmar que tudo aquilo que depender da indústria será feito, faremos tudo pra ajudar o sistema de saúde.

 JC – Espera-se que a vacina dê mais tranquilidade às indústrias para suas atividades em 2021, havendo ainda a possibilidade de um melhor ambiente político para o desenvolvimento de ações. Quais sãos os pontos fundamentais das empresas para que o PIM possa avançar nesse novo ano?

Wilson Perico – O que mais interfere na nossa atividade industrial é a insegurança jurídica, somando-se a isso a instabilidade política. Lembro que o nosso Estado teve quatro governadores nos últimos quatro anos. E vimos as dificuldades no relacionamento entre os poderes.

E, certamente, isso tem afugentado investidores. Com relação à ZFM, temos grandes desafio que é a reforma tributária, como o modelo será contemplado, se realmente serão mantidas as vantagens comparativas.

Temos outras demandas como a infraestrutura, como a questão da BR-319, uma história que se arrasta há mais de 15 anos.

Queremos que as vias do Distrito sejam olhadas com mais atenção pelo governo municipal. Aliás, o local já é um bairro, tem escolas, condomínios, conjuntos habitacionais, que gera grandes riquezas em uma área com poucos mais de 3 quilômetros. Liga a zona leste ao Centro de Manaus.

Não existe nenhum outro local no País que em poucos metros quadrados gere tanta riqueza, empregos, como o Distrito Industrial do Amazonas.

Mas temos demandas que não dependem direto de nós. São questões federais. Precisa haver prioridades para desenvolver soluções.

Tirar também o Estado da dependência de Brasília em relação à ZFM.

JC – Enfim, as ruas do Distrito estão sendo recuperadas. É possível fazer com que o local seja um cartão-postal da cidade?

Wilson Perico – É esse o grande mote. O Distrito deve ser buscado como o quarto cartão-postal da cidade. Temos o Teatro Amazonas, Encontro das Águas, Praia da Ponta Negra, como grandes pontos turísticos.

O Distrito Industrial tem que ser cuidado como bairro de Manaus. Tivemos que esconder o Distrito de dois grandes eventos, a Copa do Mundo e das Olimpíadas.

O Distrito tem que ser um orgulho e uma atração turística para navios de cruzeiro que  trazem pessoas interessadas em pesca esportiva,  pra conhecerem o local onde se gera tanta riqueza e melhoria social.

JC – Parte da fábricas da ZFM poderia funcionar como uma espécie de showroom…..?

Wilson Perico – Isso já existe no polo relojoeiro. A Suframa criou um programa chamado ‘fábricas de portas abertas’, onde estudantes, cidadãos, turistas e qualquer pessoa podem conhecer as atividades das indústrias.

Precisamos levar ao conhecimento da sociedade amazonense e brasileira o modelo ZFM que nós conhecemos. Desmitificar um monte de absurdos sobre o modelo, que é longe de ser um peso.

Ao contrário, a ZFM gera riquezas e proporciona uma infinidade de benefícios. Isso está comprovado por um estudo da FGV cujas informações dão subsídios para nossa bancada parlamentar em Brasília nas discussões sobre a preservação do modelo durante as discussões sobre a reforma tributária.

E todas essas atividades são custeadas por recursos da própria indústria, sem nenhuma participação da prefeitura e do governo do Amazonas.

Estamos assumindo uma responsabilidade que deveria ser também dos gestores municipal e do Estado. Eles deveriam ter tanto interesse como nós.

Não temos outros interesses que não defender aquilo que acreditamos como essencial para a região.

JC –Como o Cieam tem contribuído com a estruturação do ecossistema de bioeconomia?

Wilson Perico – São atividades que remetem à indústria. Sabemos que nosso modelo de atividade industrial está em constante mutação. A inovação tecnológica é permanente e muito rápida.

E tudo isso nos traz demandas urgentes para manter a sustentabilidade  socioeconômica  em nosso Estado

Essas questões passam pelo desenvolvimento de novas atividades no que temos com abundância que é a nossa biodiversidade.

A Suframa e institutos estão muito empenhados visando na aplicação de recursos para viabilizar novas ações visando um futuro próximo. Esse ecossistema tem vários atores. Não estamos engatinhando, mas sim andando a passos largos pra termos grandes alternativas.

JC – Já teremos um novo prefeito. Tem que mudar a postura dos governantes,  precisam estar mais antenados com a ZFM, Suframa….?

Wilson Perico – Eu torço muito pelo sucesso dos gestores, sejam eles quem forem, ninguém torce contra.

O que esperamos é que o prefeito e o govenador tratem a ZFM com a relevância que  o modelo tem para a sustentabilidade da economia do Estado.

A riqueza que geramos é uma coisa que o Estado não pode abrir mão. Existe um distanciamento da prefeitura em relação às indústrias com as questões do Distrito.

Cada vez mais, quando os resultados são positivos, todo mundo se arvora e diz que é seu. Mas quando precisa cuidar, todo mundo se distancia.

Esperamos que o prefeito David Almeida veja o Distrito como bairro da cidade. Nosso apoio estar em avaliar, criticar, fazer cobranças.

Recebemos muitas cobranças diariamente, mas tudo isso contribui para melhorar as atividades. Queremos que as ruas do Distrito sejam sempre preservadas, recuperadas.

Pleiteamos mais segurança, mais iluminação, a implantação de uma unidade da Polícia Civil, da Polícia Militar, para proteger mais toda a população que circula, reside e vive no local.

JC – Nesse momento de crise, ouve-se muito a palavra ‘reiventar-se”, buscar novos caminhos. Dá para se pensar na gestão de uma nova ZFM, estando o modelo preparado para essa reinvenção?

Wilson Perico – O bom resultado que tivemos na indústria veio principalmente do  auxílio emergencial do governo federal. Com o fim iminente, não sabemos como será o reflexo disso na economia e na questão do consumo.

Foram nove meses de crise, um tempo para gerar uma vida. Durante a pandemia, resgatamos alguns valores que tínhamos deixado guardados em algum lugar.

Um deles é a solidariedade, a indústria se empenhou muito pra ajudar tanto os órgãos de saúde e hospitais públicos e privados a superarem os momentos de pandemia.

JC – A crise econômica deve se agravar em 2021 com o fim do auxílio emergencial, agravando a situação em praticamente todos os segmentos. Como o sr. avalia esse  cenário?

Wiison Perico – As indústrias se reinventam demandadas pela inovação tecnológica. E assim acontece em qualquer crise.

Temos o nosso embate com o Ministério da Economia que insiste em aprovar só projetos com PPBs que deem a contrapartida em termos de geração de empregos.

Não temos grandes indústrias nacionais no País, mas sim multinacionais instaladas gerando empregos pra brasileiros.

Essas empresas replicam aqui os seus processos mundiais lançados mundialmente.

A indústria repassa para o governo do Amazonas R$ 1,4 bilhão/ano para fomentar atividades turísticas, interiorização da economia e suporte financeiro para a UEA (Universidade do Estado do Amazonas).

Esses recursos chegam via FTI, FMPE – turismo e micro e pequenas empresas. São fundos que podem desenvolver novos pilares econômicos que viriam a se somar às atividades da ZFM.

Queremos participar da elaboração da grade curricular da UEA para formação de capital intelectual.

Precisamos de mais vontade política. O Amazonas foi o Estado que mais contribuiu para a balança comercial do País, no passado, durante o ciclo da borracha. Só exportava o produto, corroborando para a derrocada da atividade.

Não queremos repetir os mesmos erros do passado. O Amazonas tem que tomar as rédeas do seu destino para ser cada vez melhor à nossa sociedade.

Marcelo Peres

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