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Meus tempos de criança

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Quem tem mais de 50 anos de idade e viveu sua infância em Manaus, com certeza conheceu uma cidade totalmente diferente dessa que vemos hoje. Crianças brincavam livres pelas ruas, muitas ainda de barro, e perigo era palavra pouco conhecida. Dia das crianças era todo dia.

A família do jornalista Caubi Cerquinho, 56, tinha tão poucos recursos que ele nem esperava brinquedo no Dia das Crianças. “Na realidade, eu que nem sabia que existia Dia das Crianças”, falou. “O primeiro e único brinquedo que eu ganhei num Dia das Crianças foi um robô automático, dado pelo meu irmão Arnoldo quando eu tinha 10 anos. Ele havia arrumado um emprego e me deu o brinquedo”, recordou.

“Como não tínhamos dinheiro para comprar brinquedos, nós mesmos os fazíamos. Meu irmão Mario Amazonas fazia caçambas de latas de óleo Salada”, falou.

“O que eu gostava mesmo era de jogar bola. Sempre gostei tanto que jogo minhas peladas até hoje”, disse. “Mudamos para a Carvalho Leal, na Cachoeirinha, no início dos anos de 1970, quando o bairro ainda era cheio de casas com grandes quintais. Brincávamos nas ruas Ajuricaba, Ipixuna, ali próximo, de manja, cemitério, barra bandeira, garrafão e camoni. No garrafão a gente ficava dentro de um círculo riscado na terra, pulando numa perna só e recebendo esbarrões dos outros colegas até sobrar só um dentro do círculo. O camoni era uma manja diferenciada. Bastava ver o colega e gritar ‘camoni’ e ele já estava fora da brincadeira”, explicou.

“Tenho um filho de doze anos e vejo que hoje as crianças têm mais opções de brincadeiras e brinquedos, mas não sei dizer se a infância é melhor do que no meu tempo. O estilo de vida é outro”, concluiu.

Criança só quer brincar
Dysson Teles, 61, é diretor do Museu Amazônico, da Ufam. Sua infância foi toda na rua Tapajós, numa época em que nem asfaltada a rua era. “Mas jogava bola assim mesmo, descalço, até nas ruas asfaltadas”, lembrou.

“Claro que lembro do Dia das Crianças. Era muita emoção. Ficava naquela expectativa de ganhar o brinquedo que havia pedido. Como o Natal, é uma data que me marcou muito. O brinquedo que ganhei e nunca esqueci foi um caminhão de madeira, dado pelo meu pai José Tibúrcio. Eu tinha uns dez anos. A mesma emoção que sentia naquela época, sinto até hoje quando dou um brinquedo para alguma criança”, disse.

“Além dos jogos de bola, tinha a bolinha de gude e as disputas para ver quem tirava mais bolinhas de dentro do círculo riscado na terra. Com o polegar, você arremessava uma bolinha nas outras tentando tirar uma de dentro do círculo. Se ela não saísse, passava a vez. Os carrinhos de rolemã eram os skates da época. O bom era deslizar com eles nas ladeiras. Até pneus viravam brinquedos. Uma pequena vareta em cada mão, metidas nas laterais de um pneu velho, os transformava no nosso carro. Assim saiamos dirigindo aquele pneu pelas ruas. Eram brincadeiras ingênuas, mas que divertiam muito”, afirmou.

“Essa é a vantagem de ser criança: só querer saber de brincar. Criança procura logo por outra, ou outras crianças, e vão logo inventando algum tipo de brincadeira”, falou.

“Hoje, infelizmente os valores mudaram. Pela insegurança das ruas, as crianças ficam isoladas, presas dentro de casa, cercadas pelos cuidados dos pais. Perderam a liberdade de outrora. Ficaram robotizadas, aí buscam os games, o celular, porque, para se satisfazerem, criam seu próprio mundo”, lamentou.

O fim da magia
A escritora Elza Souza lembra do pai Nilo Souza a levando e às duas irmãs para comprarem os brinquedos para o Dia das Crianças. “Lembro que as lojas ficavam na Sete de Setembro, da famosa 4 e 400, que depois virou Lobras e hoje é a Marisa, na esquina da Sete com a Eduardo Ribeiro. Gostava de passear com ele pelas ruas do centro da cidade, porque morávamos no São Raimundo, ainda distante e casario pobre, e tudo era diferente do centro, com suas lojas bonitas”, recordou.

“Aí comprávamos panelinhas, casinhas, bonecas, e depois era só festa em casa, com minhas irmãs. Fora de casa brincávamos na praça do São Raimundo, de roda, aquele monte de crianças, cantando músicas, boca do forno, anjo bom anjo mau. Quando eu era bem criança minha mãe brincava de anelzinho comigo, mas eu nem lembro direito mais como era”, revelou.

“Quando aprendi a ler, meus pais passaram a comprar gibis da Luluzinha, Bolinha, Disney, Zorro, Fantasma e livros de princesas e contos de fadas. Acho que nem existem mais esses gibis. Até as bancas de revistas estão se acabando”, lamentou.

“Sobre a infância nos dias de hoje? Lamentavelmente não tem mais conteúdo, aprendem muita coisa ruim. A infância perdeu a magia”, finalizou.

Redação

Jornal mais tradicional do Estado do Amazonas, em atividade desde 1904 de forma contínua.
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