Andreia leite
Centenas de motoristas que atuam na modalidade de transporte por aplicativos realizaram, nesta terça-feira (26), uma manifestação contra o PLP 12/2024 proposto pelo governo federal que cria um pacote de direitos trabalhistas que regulamenta a atividade. O movimento nacional, levou vários veículos em Manaus, a percorrerem várias avenidas da capital seguindo em carreata até a Aleam (Assembleia Legislativa do Amazonas).
Desde o anúncio da proposta, prevista para entrar em vigor após um período de 90 dias, alguns pontos do Projeto estão sendo criticados, pois trazem impactos financeiros e significativos aos trabalhadores.
Conforme informações, um dos pontos reivindicados pela categoria é a figura do “trabalhador autônomo por plataforma”. O PLP não prevê vínculo empregatício entre motorista e empresas, estipula um valor mínimo para remuneração por hora de corrida, prevê obrigatoriamente contribuição para a Previdência Social e determina a negociação via acordos coletivos – ou seja, via sindicatos.
associações do Brasil. Estamos envolvidos na Fembrap (Federação dos Motoristas por Aplicativos d“Organizamos um protesto conduzido pelas diversaso Brasil), que representa a união das associações de motoristas por aplicativos no país, percebemos que o PL é altamente problemático. Até mesmo os especialistas em leis têm dificuldades em entender as suas implicações. Isso porque ele nos obriga a contribuir com o INSS, ao mesmo tempo em que mantém nossa condição de autônomos. No entanto, essa autonomia é limitada, sem a possibilidade de definir o valor do serviço que prestamos. Além disso, o tempo de trabalho necessário para atender a demanda aumenta significativamente, passando de oito para 15 ou 16 horas por dia. Dessa forma, acabamos nos restringindo a trabalhar exclusivamente para um único aplicativo, o que torna inviável atender a múltiplas plataformas”, afirmou Alexandre Matias, presidente da Ameap-AM (Associação de Motoristas por Aplicativo de Manaus).
Trabalhar oito horas diárias através de um aplicativo, chegando até 12 horas, não é algo que favoreça os trabalhadores da categoria. Segundo o representante, afinal, ser tão dependente de um só aplicativo para a fonte de renda não é ideal. Isso comprometeria a autonomia e liberdade de escolha dos motoristas. Além disso, acabaria pagando a conta seriam os passageiros, já que todo desconto aplicado sobre os motoristas – que pode chegar a 40% a 55% pelas plataformas – certamente seria repassado a eles.
“Na verdade, o protesto deveria ter sido feito pelos usuários de aplicativos em vez dos motoristas. Se os usuários enxergarem essa situação como está, certamente refletirá no próprio bolso deles. Afinal, são os usuários que pagam à plataforma e esta, por sua vez, nos remunera, mesmo que através do PIX. É necessário que voltemos a essa perspectiva. Logo, é contraditório um governo que se auto-intitula defensor dos trabalhadores, pró-trabalho, acaba sendo contra o trabalhador. Na minha opinião, é imprescindível uma análise minuciosa para que essa regulamentação seja implementada de forma benéfica tanto para os usuários quanto para os motoristas”.
O objetivo da manifestação que ocorreu de forma simultânea em várias capitais é promover um diálogo entre a categoria e os proponentes do projeto através dos deputados estaduais e da Câmara Federal. “Tivemos uma conversa com o deputado Wilker Barreto, que se mostrou disposto a contatar algumas pessoas próximas a ele, considerando que parte de seu grupo ainda não possui representação federal. Além disso, dialogamos com o deputado Amom Mandel e o deputado Alberto Neto, que são parlamentares federais e se comprometeram a oferecer total apoio em Brasília para nossa categoria”, informou Alexandre Matias.
Opinião
Em material enviado ao Jornal do Commercio, Murillo Torelli é professor de Contabilidade Financeira e Tributária no CCSA (Centro de Ciências Sociais e Aplicadas) da UPM (Universidade Presbiteriana Mackenzie), destacou que no cenário político atual, a regulamentação do trabalho dos motoristas de aplicativos, torna-se uma medida controversa, gerando críticas pela sua abordagem questionável além de seus impactos.
Segundo ele, a trajetória até a assinatura do projeto de lei revela um processo de discussão que, ao invés de ser tripartite e inclusivo, parece ter sido influenciado por encontros bilaterais entre o governo e as empresas. O resultado apresentado, que contempla definições sobre piso mínimo, contribuição previdenciária e sindicalização, levanta preocupações sobre a verdadeira representatividade dos interesses dos motoristas
“O estabelecimento de um piso mínimo para os motoristas pode parecer uma medida positiva à primeira vista. No entanto, a implementação de uma contribuição previdenciária ao INSS com uma alíquota de 27,5% suscita questionamentos sobre a equidade dessa medida. Destes, 20% seriam recolhidos pelas plataformas, enquanto os trabalhadores contribuíram com 7,5%. Essa regra, aparentemente regressiva, especialmente para os entregadores, pode resultar em dificuldades para atingir a renda mínima necessária para serem segurados pelo INSS”, avaliou.
Outro ponto de discórdia avaliado por ele, é a inclusão de dispositivos que vinculam os motoristas a sindicatos, com a imposição do pagamento de contribuições para essas entidades. O atual cenário em que esses trabalhadores são representados por diferentes tipos de associações e federações já estabelecidas suscita questionamentos sobre a necessidade de impor uma mudança tão drástica, que, na prática, pode beneficiar mais os sindicatos do que os próprios motoristas.
“O resultado é claro: o governo arrecadará mais com as arrecadações previdenciárias, os sindicatos receberão suas contribuições, mas os trabalhadores verão uma redução significativa em seus ganhos. Ademais, os clientes, inevitavelmente, arcarão com os custos adicionais, tornando o serviço de transporte por aplicativo mais oneroso”.
Ele conclui que a necessidade de uma revisão cuidadosa e transparente dessas medidas é evidente, justamente para garantir que os verdadeiros protagonistas dessa história – os motoristas de aplicativos – não sejam prejudicados em nome de um aumento na arrecadação e nas contribuições sindicais. “O povo merece mais do que uma regulamentação que sacrifica os trabalhadores em prol de interesses políticos e sindicais”.