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Mais empreendedor e menos gastador

A pandemia mudou hábitos de consumo em todo o território nacional e o impacto foi maior na região Norte. Em síntese, o brasileiro reduziu o uso do dinheiro vivo em favor do PIX e passou a priorizar gastos domésticos –como TVs por assinatura –em detrimento de dispêndios com lazer externo. E, para o bem e para o mal, aumentou sua disposição para empreender. É o que apontam os dados da pesquisa “Pandemia e os Impactos Financeiros”, realizada pela Serasa, em parceria com o Instituto Opinion Box. 

O levantamento, que compara os resultados de fevereiro de 2021 e o mesmo mês de 2022, também mostra que as perdas financeiras impostas pela pandemia foram pesadas. A região Norte aparece em destaque, com uma queda de renda mais ampla, e menor capacidade de pagamentos em dia e de corte de gastos. Em média, o consumidor nortista também recorreu mais aos empréstimos e ao empreendedorismo do que o da média nacional, além de priorizar o acesso a serviços mais básicos.

A pesquisa constata que a renda diminuiu para 41% dos moradores do Norte, superando a média nacional (34%). O percentual de consumidores que verificou aumento nas despesas foi de 62% em ambos os casos, mas a pontualidade nos pagamentos é mais baixa nos Estados nortistas (38%). Para passar a pandemia sem dívidas, 46% dos entrevistados em âmbito local disseram ter cortado gastos desnecessários e apenas 36% adotaram o planejamento financeiro –contra 42%, no Brasil.

Para fazer frente às dívidas, 40% passaram a empreender. Ao menos 32% se tornaram filiados digitais, 25% começaram a vender produtos que não usavam mais, 19% foram trabalhar como freelancer e 17% fizeram comida ou doces para vender. Quando a renda extra não chegava, a alternativa mais frequente foi recorrer a acordos (48%). Para quitar os compromissos financeiros, 55% precisaram pegar um empréstimo, sendo que a maior parte financiou quantias de até R$ 3.500,00 (56%), e parceladas em até 24 meses (57%). Entre os que não conseguiram manter o pagamento em dia, o principal motivo apontado foi justamente ter novas dívidas (56%).

Para a conselheira do Corecon-AM (Conselho Regional de Economia do Estado do Amazonas), ex-vice-presidente da entidade, e professora universitária, Michele Lins Aracaty e Silva, a sondagem confirma que os consumidores mais vulneráveis foram mais severamente atingidos pela pandemia, conforme alerta da ONU de dois anos atrás. A economista observa que a perda dos rendimentos foi mais severa no Norte, em virtude da maior ocupação de postos de trabalho de baixa qualificação. 

“Com a queda da renda, ficou mais difícil cumprir os pagamentos em dia. As contas de água, energia e gás também sofreram elevados reajustes, e a inflação provocou alta generalizada no preço de quase todos os produtos da cesta de consumo das famílias. O empreendedorismo aparece mais como necessidade e é uma forma de complementar renda. Mas, o rendimento é muito inferior ao das famílias das demais regiões brasileiras, e fazer um planejamento financeiro com um rendimento muito baixo fica mais complicado. É um efeito em cascata”, lamentou.

Lazer em casa

Mesmo em meio às dificuldades, aumentou o número de brasileiros que conseguiram pagar as contas em dia. Mas, o Norte também apresenta percentual menor nesse quesito, sendo prioridade o aluguel (84%), plano de saúde (78%), financiamento de carro ou casa (76%), serviços de assinaturas como Netflix e Amazon (75%), empréstimos com instituições financeiras (75%) e seguros (71%). A prioridade é para contas básicas como água, luz e gás (40%), enquanto cheque especial (51%) e empréstimos com amigos, familiares ou conhecidos (53%) lideram as contas em atraso.

A Serasa avalia, por outro lado, que o maior tempo de permanência em casa implicou na migração das formas de entretenimento para os lares, colocando as plataformas de streamings na segunda posição do ranking de pagamentos dentro do prazo. Como as instituições de ensino encontraram no modelo digital a nova forma de dar continuidade aos cursos, aumentou o pagamento pontual das mensalidades. E a questão da moradia, mesmo com o desafio da redução de renda para muitos, também segue como uma das prioridades de pagamento dentro do prazo”, assinalou a empresa, no texto de divulgação da pesquisa.  

Em sintonia, 26% dos entrevistados do Norte declararam não gastar com lazer. Houve também uma redução nas atividades e apenas 28% preferem ir a shoppings, 38% a feiras e 24% a bares e restaurantes. Os dispêndios passaram a priorizar farmácias (59%) e hiper e supermercados (57%). Em contraste, embora os consumidores brasileiros também enfatizem a escolha pelos segmentos essenciais do varejo, a escolha do que fazer nas horas livres aponta aumento no gosto por viagens (28%). 

O consultor empresarial, professor universitário e conselheiro do Corecon-AM, Francisco de Assis Mourão Júnior, entende que a pandemia teve maior impacto econômico no Norte e aponta que isso se deve ao peso da ZFM, e da sensibilidade do modelo às oscilações do mercado interno. “As próprias questões da Covid, como o lockdown e vacinação, assim como medidas sanitárias, trouxeram impactos no mercado do Sul, gerando oscilações na economia do Amazonas, a partir da primeira onda”, resumiu, acrescentando que isso também gerou impactos nos hábitos do consumidor local.

Pix e lições

O mesmo ocorreu com os meios de pagamento: a chegada do Pix desbancou o dinheiro em espécie. Em sintonia com a maior preferência por lazer em casa e medidas de distanciamento social, o cenário local já mostra uma liderança folgada do novo meio de pagamento eletrônico franqueado pelo BC (Banco Central, 74%), em detrimento do cartão de crédito (60%), aplicativo do banco (41%), cartão de débito (38%) e dinheiro vivo (30%).

Lições de como lidar com o dinheiro foram assimiladas nos tempos de confinamento. Pelo menos 71% dos consumidores do Norte disseram que agora dão mais importância em ter dinheiro guardado, 70% admitiram ter aprendido a cuidar melhor do dinheiro e 61% perceberam que gastavam muito com o que não precisavam. Em sintonia com a piora do cenário econômico, contudo, a região registrou menor parcela de consumidores com dinheiro guardado (39%), quando confrontada com o restante do país (48%). 

“Contenção de despesas não é o forte do brasileiro. Ainda mais do nortista, que enfrenta preços acima da média nacional. Tudo por aqui é mais caro, então a perda quase sempre vai espelhar maior endividamento do que a média nacional. Ainda estamos sofrendo abalos das recessões. A expectativa é que isso venha a melhorar de forma tímida, tendo em vista que nada macroeconomicamente está sendo feito de forma significativa para ampliar nosso poder de compra e renda”, arrematou o professor universitário, consultor empresarial e conselheiro do Corecon-AM, Leonardo Marcelo Braule Pinto.

Marco Dassori

É repórter do Jornal do Commercio
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