Pesquisar
Close this search box.

Luta do primeiro sebo de Manaus

A leitura digital, através de um smartphone, abalou, mas até hoje, 14 anos depois do lançamento do iphone, por Steve Jobs, não conseguiu vencer os livros impressos. É o que garante o livreiro Evandro Barros Freitas com a propriedade de ter sido a primeira pessoa a montar um sebo de livros em Manaus, há 32 anos.

Banca está no mesmo lugar há 32 anos
Foto/Destaque: Divulgação

Evandro vem de uma família humilde. O pai, amazonense, foi soldado da borracha durante a Segunda Guerra Mundial. Quando a guerra acabou e seu esforço não foi mais necessário, ele ficou sem trabalho. Sem outra alternativa, morando na beira rio de São Raimundo, foi ser pescador.

“Ele trabalhava num barco geleiro, que ia para os altos rios pescar tambaquis. Passava meses fora. Além das longas viagens na ida e no retorno, só voltavam quando enchiam os porões do barco”, contou Evandro.

Esse foi o trabalho do ex-soldado da borracha nas décadas de 1950, 60 e 70. No final da década de 1960, Evandro era apenas um menino. Foi quando seu interesse pela leitura despertou através dos gibis. ‘Viajando’ nas histórias em quadrinhos o menino desenvolveu a leitura, pois, devido às dificuldades financeiras da família, de numerosa prole, não foi muito adiante nos estudos. Quando sobrava algum dinheiro, as irmãs mais velhas compravam revistas e não esqueciam de trazer gibis para o garoto.

Quando já estava rapaz, Evandro havia acumulado tantos gibis, que resolveu começar a vendê-los, tanto pra fazer algum dinheiro quanto para comprar novos. Vendia-os facilmente. Naquela época praticamente toda criança e adolescentes, e até adultos, liam os gibis da Disney, de Maurício de Souza e de super-heróis.

Começou na calçada

“Um dia, em 1985, fui vender os gibis para o dono da banca de revistas e, na mesma hora, e na minha frente, ele revendeu os gibis para outra pessoa, por um preço bem mais alto. Além de não ter gostado do que vi, também vi que dava para ganhar um bom dinheiro com aquele comércio, porém, naquele momento estava empregado e meu desejo era ser policial militar. No mesmo ano entrei para a Polícia Militar”, recordou.

Interessado em vender livros, nas horas de folga da caserna, Evandro começou a ficar na banca de revistas de um amigo, na av. Getúlio Vargas, próximo ao Colégio Amazonense D. Pedro II. Lá ele vendia apenas gibis e revistas, e aproveitava para se desfazer do estoque que tinha em casa. O negócio era tão bom, que Evandro chegava a ganhar mais do que o soldo recebido na PM. Foi então que resolveu sair da polícia e se dedicar apenas à venda de livros.

“Onde hoje é as Lojas Americanas, na Getúlio Vargas, existia o Banco Bic. Eu colocava os livros na calçada, sobre um pano, e assim comecei o primeiro sebo de Manaus, em agosto de 1989. No final do expediente, guardava os livros dentro do banco. Um dia o sargento Dutra, que era muito meu amigo e sabia que eu tinha vontade de trabalhar vendendo livros, me viu na calçada e foi lá comigo”, falou.

O sargento admirou a coragem de Evandro em largar a corporação militar para concretizar seu sonho e se prontificou a ajudá-lo. Com um dinheiro emprestado pelo sargento, Evandro mandou construir uma banca de revistas, então com 2m x 1m, o suficiente para proteger os livros de uma eventual chuva, e saiu da calçada, se mudando para o espaço que ocupa até hoje, próximo ao local anterior. Atualmente a banda mede 3,5m x 1,5m e também abriga Evandro em seu interior.

Quase fecha a banca

“O sargento, hoje tenente Dutra, na reserva, me pediu apenas que o deixasse ler livros quando passasse pelo local e que, se eu quisesse, colocasse o nome da banca de ‘Jesus me deu’, no que eu o atendi”, revelou.

“Não sei e nunca soube quantos livros eu tenho na banca, pois sempre tem gente aqui querendo vendê-los, e diariamente eu revendo os que tenho. As pessoas se desfazem de seus livros por vários motivos: não querem mais, estão ocupando espaço, os donos dos livros morreu, necessidade financeira, ou vão viajar, então, sempre chegam novos títulos”, explicou.

Evandro listou os segmentos que nunca deixam de vender: filosofia, sociologia, romances históricos, livros históricos e sobre a Amazônia, revistas que nem circulam mais como Playboy, Placar, Manequim, além dos romances Sabrina.

Autores imbatíveis são Sidney Sheldon, Agatha Christie, Machado de Assis e Mário Ypiranga Monteiro. Qualquer um dos seus livros ‘não esquenta lugar’ na banca de Evandro.

Coincidentemente, em 2007, ano do surgimento do iphone, foi quando Evandro conheceu sua primeira crise na venda de livros.

“As vendas caíram tanto, coisa que nunca tinha acontecido antes, que eu pensei em fechar a banca. Foram seis meses muito difíceis, quase sem vendas. Várias pessoas me fizeram propostas para comprar a banca, mas relutei e resolvi enfrentar a situação. Até que as vendas voltaram a acontecer”, disse.

Muitos dos clientes de Evandro são saudosistas em busca de títulos antigos, material que ele sempre tem.

Livros de história continuam entre os mais vendidos
Foto: Divulgação

“De dois anos para cá as vendas melhoraram bastante, mas nunca mais se igualaram a antes de 2007. Diariamente eu vendo livros. Enquanto tiver vendendo, um que seja por dia, eu continuo aqui”, avisou.           

Foto/Destaque: Divulgação

Evaldo Ferreira

é repórter do Jornal do Commercio
Compartilhe:​

Qual sua opinião? Deixe seu comentário

Notícias Recentes

Pesquisar