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Grãos de ouro do Andiroba

Evaldo Ferreira: @evaldo.am

Quem já participou de uma farinhada em algum dos interiores amazônicos sabe bem como é fabricada a nossa tão apreciada farinha. Um imenso tacho de metal assentado sobre um forno de barro dentro do qual se acendem lenhas. Alguém, com um remo de madeira, mexe e remexe a massa da mandioca. Só depois de ralada, espremida no tipiti e passada na peneira, a massa está pronta para ir pro tacho, ser torrada. Nova peneirada e retorno para o tacho quando, então, a farinha está pronta para ser consumida. Esse é um processo milenar utilizado pelos indígenas e assimilado pelos caboclos sem muita alteração. Pois uma família do Manaquiri, da comunidade Andiroba, mostrou que toda essa trabalheira pode ser mecanizada e melhorada, facilitando o trabalho e resultando, inclusive, numa melhor qualidade da farinha.

Tudo começou com seu Francisco Siqueira, há 36 anos, quando ele chegou ao Manaquiri, vindo do rio Juruá, e resolveu se estabelecer naquelas terras. Vivendo da pesca no belo lago do Andiroba, além da plantação de mandioca e fabricação de farinha, seu Francisco criou os filhos e nem imaginou que um deles, Gean, o mais velho teria ideia de modernizar o processo de fabricação de farinha, envolvendo o restante da família. Hoje doze pessoas, entre pai, filhos, genros, noras e sobrinhos trabalham na fabricação da farinha que, desde o ano passado, ganhou uma marca, Grãos de Ouro. Com a qualidade ovinha, a Grãos de Ouro é apresentada em dois tamanhos distintos de grãos. Além da plantação de mandioca, que seu Francisco mantém desde que chegou à comunidade, hoje os Siqueira compram a produção de outros comunitários para atender à demanda.

Cinco minutos no embolador

O que chama a atenção na fabriqueta construída pelos Siqueira em seu terreno à beira do lago, é a organização e a tecnologia do maquinário, o mesmo, utilizado em outros interiores, porém, com um ‘quê’ de modernidade. Todos os equipamentos são limpos, bem cuidados e pintados. Uma grande logomarca da empresa estampa a parede de fundo do estabelecimento, a família se veste com uniforme e cada saco de farinha, de um litro, recebe um adesivo também com a logomarca da Grãos de Ouro. Gean começou essa ‘revolução’ na empresa familiar há três anos, desde então, com visão empreendedora, não para de querer melhorar a qualidade da farinha que produzem.

A labuta artesanal continua. A mandioca recém extraída é acondicionada em tanques com água para amolecer a casca. Passadas 36 horas a casca é retirada facilmente com as mãos. Em seguida as raízes são trituradas se transformando na massa puba. Depois de 12 horas, substituindo o tipiti, essa massa é prensada para extração do líquido, seguindo após isso para outro equipamento, que eles chamam de gamela, onde irá ‘descansar’ antes de ir para a peneira.

Da peneira a massa é colocada no embolador e é aí que surge a engenhosidade dos Siqueira. Quem nunca comeu a famosa farinha ‘baguda’, agora quase inexistente devido o sucesso da ovinha? O embolador transforma a massa na farinha ovinha, mas os Siqueira desenvolveram uma técnica, que preferem não revelar, que faz essa transformação acontecer em apenas cinco minutos, quando nos emboladores já existentes esse tempo chega a 20 minutos.

“É um segredo industrial. A massa deve estar no ponto, nem muito seca, nem muito molhada”, disse.

Três toneladas/mês

Saindo do embolador, a ovinha está pronta, em dois tamanhos. O próximo passo é o forno, onde ela será torrada por cerca de uma hora, no mesmo processo milenar de mexer e remexer com um remo.

“Outro segredo nessa torra é a quantidade de calor. Tem que verificar o fogo, senão a farinha queima, e o ideal é que seja amarelinha, pois são grãos de ouro”, acrescentou Gean.

Após torrada, a farinha é peneirada, quando se definem seus dois tamanhos em peneiras com diferentes tamanhos dos furos na tela. Mas nesse meio, vai muito talo e pó. Mais uma vez surge a engenhosidade dos Siqueira para que sua produção tenha qualidade. Toda a farinha, então, é peneirada diante de um ventilador que joga para longe os talos e o pó, que servirá de adubo.

O processo final é o empacotamento, um litro por saco, que recebe o adesivo e está pronto para a venda. Atualmente os Siqueira produzem três toneladas/mês de farinha, praticamente toda vendida no Andiroba e no comércio de Manaquiri. Alguma quantidade chega até Manaus através de Nazaré, uma das irmãs, que mantém um comércio na Cidade Nova.

“Pelos projetos do meu pai, vamos ampliar a nossa plantação de mandioca e adquirir uma maior quantidade de produtores locais. Queremos chegar aos grandes supermercados de Manaus, mas para isso temos que aumentar bastante a nossa produção. Estamos trabalhando para isso”, concluiu.

A comunidade Andiroba fica distante 25 km da sede do Manaquiri, seguindo pelo ramal do Andiroba.            

Evaldo Ferreira

é repórter do Jornal do Commercio
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