A construção civil enfrenta o risco de um apagão nos próximos dois anos por falta de mão de obra qualificada. O setor, que em 2010 tinha 3,2 milhões de empregados diretos no país e mais de 10 milhões em toda a cadeia, hoje conta com 2,7 milhões de trabalhadores em um momento de alta demanda imobiliária.
Mestres de obra, pedreiros, eletricistas, carpinteiros e até engenheiros estão próximos da escassez. Segundo o setor, a falta de mão de obra começou em 2018, mas ganhou força na pandemia, quando muitos profissionais decidiram se aposentar ou trocar o serviço pesado da construção por trabalhos informais, como o de motorista por aplicativo.
Com a retomada de obras paralisadas entre as prioridades do governo federal, a corrida das prefeituras para entregar projetos até as eleições municipais e um mercado imobiliário aquecido, o quadro piora. Levantamento do Sintracon-SP (Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção de São Paulo), aponta a falta de 30 mil postos para atender ao mercado imobiliário.
Além do êxodo de profissionais experientes para outros setores, a construção não está atraindo novos talentos na proporção que a demanda exige. Entre os motivos estão a baixa remuneração e o dia a dia nos canteiros de obra: trabalho sob sol, chuva, poeira e com máquinas pesadas.
O setor tem feito uma força tarefa para reverter o cenário, enquanto empreiteiras e construtoras disputam os profissionais nos canteiros. Enquete da CBIC (Câmara Brasileira da Indústria da Construção) com 800 empresas, realizada em maio deste ano, já apontava a dificuldade em contratar profissionais qualificados. De acordo com a amostra, 7 em cada 10 construtoras sofrem com a escassez.
Uma nova pesquisa será feita em fevereiro de 2024 e, segundo a entidade, não terá números mais positivos.
“Estamos também preparando uma comissão para entender na profundidade quais são as causas [da falta de mão de obra] e como podemos resolver. Pelos resultados das pesquisas, não estamos conseguindo suprir as necessidades atuais”, diz Renato Correia, presidente da CBIC.
Em outubro, a CBIC se reuniu com o ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, para defender uma parceria entre o poder público e a iniciativa privada para garantir a formação e a qualificação dos profissionais.
Outra preocupação do setor é com a reforma tributária. A expectativa é pelo fim do regime de cumulatividade, um obstáculo à industrialização plena do setor, afirma a entidade.
Segundo Correia, o Brasil precisa passar da “construção 2.0” para a “4.0” com urgência. “A questão tributária nos deixa atrasados. A construção ficou em condição específica [na reforma] e irá entrar em lei complementar. Foi um pleito do setor também para manter a carga tributária e não encarecer os imóveis na ponta para o consumidor”, afirma.
A curto prazo, o setor aposta na capacitação dos trabalhadores entrantes (em geral, ajudantes de obras), incluindo engenheiros, como solução.
O presidente do SindusCon-SP (Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado de São Paulo), Yorki Estefan, afirma que, por causa da alta taxa de juros, o volume de obras neste ano foi 10% menor do que no ano passado. Ainda assim, é um momento ruim para encontrar profissionais experientes.
Sindicatos da indústria e dos trabalhadores têm parcerias com Senai e Sebrae para cursos gratuitos de capacitação. Em São Paulo, o Sintracon forma dez turmas todos os meses há cerca de dois anos e meio, e os profissionais costumam sair empregados. “As construtoras vêm buscar”, diz Antônio Ramalho, presidente da entidade.
“Tem uma concorrência aí que, às vezes, é bom para o trabalhador. Porque muitas empresas ficam tirando o profissional da outra. Os empreiteiros acabam oferecendo alguma coisa a mais, o trabalhador larga tudo, às vezes até pede a conta, para ganhar mais”, conta Ramalho.
Segundo o sindicalista, o salário médio em um canteiro de obras é de R$ 2.500, mas a crise tem ampliado a contratação na informalidade. Sem registro em carteira, o trabalhador recebe dinheiro por fora para compensar os direitos que não serão pagos, como férias, fundo de garantia e INSS.
“O engenheiro não quer que o filho seja engenheiro, porque ele sai da faculdade ganhando R$ 3.500, enquanto um carpinteiro pode faturar R$ 15 mil por mês trabalhando por hora de tarefa empreitada”, diz Antônio Ramalho, presidente do Sintracon-SP.
Há ainda construtoras com programas próprios de qualificação. A Trisul criou, em 2022, um voltado a profissionais de empresas terceirizadas atuantes em seus canteiros.
“Até o momento, foram formadas quatro turmas, representando cerca de 7% do efetivo de cada canteiro. Embora o número não pareça tão expressivo em um primeiro momento, a ação é de longo prazo para mitigar o risco de falta de profissionais qualificados dentro de nossos canteiros”, diz Roberto Junior, diretor técnico da Trisul.
A Abrainc (Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias) diz que as obras conduzidas pelas empresas associadas à entidade estão prosseguindo conforme o planejado, sem interrupções significativas.
A escassez de mão de obra qualificada na construção não é um desafio exclusivo do Brasil. Em Portugal, há 70 mil posições disponíveis, e na Espanha, esse número ultrapassa os 700 mil.
No Reino Unido, o governo britânico relaxou as regras de visto para pedreiros, carpinteiros, reparadores de telhados e gesseiros estrangeiros para enfrentar a crise.
“Ninguém mais quer trabalhar no setor. No Brasil, temos mais de oito milhões de desempregados, mas não estão qualificados e muitos não querem o serviço pesado. [Se mantiver as condições atuais na atividade], a tendência é piorar.
Falta de mão de obra qualificada afeta 7 em cada 10 construtoras


Redação
Jornal mais tradicional do Estado do Amazonas, em atividade desde 1904 de forma contínua.
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