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Entrevista: “precisamos estar no centro do debate”, diz Ranilson Reis

Olho FRASE – “Mas adivinha quem será, novamente, um dos vilões da história nos eventos climáticos que ocorrerão?”, Ranilson Reis – Escritor

Evaldo Ferreira: @evaldo.am

Trata-se do primeiro livro do coronel do Exército, Ranilson Reis Ferreira, mas ele já vasculha um tema polêmico: a Amazônia. Com vasta experiência na área da defesa, com ênfase em operações militares nos níveis estratégico, operacional e tático, atualmente o militar amazonense dedica-se aos estudos e pesquisas sobre a geopolítica da Amazônia. Na entrevista que deu ao Jornal do Commercio, Ranilson aponta rumos para que a Amazônia transforme o Brasil numa potência mundial.   

Jornal do Commercio: Por que resolveu escrever ‘A selva nos une! A Amazônia por um amazônida’?

Ranilson Reis: Ao longo da minha vida, cresci assistindo especialistas de renome nacional e internacional discutirem sobre os problemas da Amazônia, apresentando soluções para uma região que conheceram, muitas vezes, apenas por viagens esporádicas. Indignado, me perguntava por que os amazônidas não são escutados? E se são escutados, por que não são ouvidos? Por que as soluções para os desafios amazônicos sempre são externas à região? Será que os amazônidas são considerados incapazes, intelectualmente, de apresentar soluções para seus próprios problemas? E, a partir destas questões, decidi, como amazônida, publicar alguns pensamentos sobre minha região. Assim, nasceu ‘A selva nos une! A Amazônia por um amazônida”

JC: Países europeus sempre estiveram de olho na Amazônia, desde que Colombo descobriu a América. Na sua visão, o que tanto daqui interessa a eles, já que esse interesse tem mudado ao longo dos séculos?

RR: Os interesses foram, são e serão sempre econômicos. E o Brasil pode, sabiamente, se beneficiar desse momento histórico. Uma Aliança Amazônica, que reúna os nove países amazônicos num esforço coordenado em realizar uma reconversão econômica neutra em carbono da Amazônia, seria um ponto de partida. O discurso da luta contra as mudanças climáticas caiu como uma luva para os ideólogos de um novo modo de vida e de um novo mercado mundial.

JC: Explique o que seria essa reconversão econômica?

RR: Seria a criação de alternativas econômicas neutras em carbono mais rentáveis, para o setor privado e os cofres públicos, quando comparadas àquelas que necessitam da supressão vegetal, como a agropecuária. Essa reconversão econômica se apoiaria em produtos tecnológicos duráveis voltados para as energias renováveis, transportes elétricos ou híbridos, bioalimentos, construção civil não energívora, biotecnologias. Não é um processo que será completado por um único governo. Talvez, se leve 15 anos ou mais.

JC: Você acha que tem cabimento europeus e americanos dizerem que a Amazônia é internacional, e não do Brasil?

RR: Nenhum país do mundo renuncia à sua soberania. E o Brasil, muito menos. A Unidade Nacional foi, é e sempre será uma cláusula pétrea constitucional, não admitindo qualquer discussão ou negociação sobre um palmo que seja do nosso território na Amazônia. A melhor forma de o Estado brasileiro fortalecer sua soberania na região é incentivar a criação de alternativas econômicas mais rentáveis que as atuais.

JC: Você morou na França há dois anos. Por que se preocupam tanto com as queimadas na Amazônia se não conseguem nem evitar um incêndio em Notre Dame?

RR: É verdade. Nesse verão europeu, também assistimos a incêndios devastadores nas florestas da França e da Espanha sem nenhuma comoção ambiental internacional. Pelo contrário, lá o discurso é que as queimadas europeias são resultado do aquecimento do planeta provocado pelas emissões dos gases do efeito estufa. Esquecem que os EUA e a Europa, juntos, representam cerca de 33% das emissões; e o Brasil, menos de 3%, mas adivinha quem será, novamente, um dos vilões da história nos eventos climáticos que ocorrerão, como a Conferência das Partes sobre o Clima (COP 27), no Egito, em novembro; e a COP 15 sobre a Biodiversidade, no Canadá, em dezembro?

JC: A água não seria a maior das riquezas que a Amazônia possui?

RR: Sem dúvida é uma das maiores riquezas da Amazônia e, no futuro, poderemos até nos tornar grandes exportadores de água doce. Lembro-me de quando morei no Nordeste, na década de 1990, assistir navios carregados de água doce abastecerem Recife, que, àquela época, sofria uma escassez hídrica sem precedentes. Este ano, os europeus estão passando por um severo período de seca. Mas, acredito que a principal riqueza da Amazônia, como bem defendia o professor Samuel Benchimol, são os seus serviços ambientais prestados ao planeta, seja pela fotossíntese das árvores, regulação climática, estoque de carbono, banco genético, conservação da biodiversidade, rios voadores, entre outros.

JC: Há cem anos a Amazônia era praticamente intocada. Consegue vê-la daqui a cem anos?

RR: O Brasil mantém ainda, aproximadamente, 84% da Amazônia preservada. Os índices de desmatamentos, ao longo dos anos, ora caem, ora se estabilizam e ora aumentam. Mas, nunca foram zerados. E é uma utopia acreditar que um dia serão. Nós, amazônidas, precisamos estar no centro do debate de qualquer proposta de desenvolvimento sustentável da região, e não colocados em segundo plano. Daqui a cem anos, independente dos governos que virão ou das pressões internacionais que sofreremos, uma realidade será imutável: a soberania brasileira na Amazônia. Nossos antepassados a defenderam; nós a defenderemos; e, acredito que os brasileiros que virão não serão diferentes.

Onde adquirir o livro: www.magazineluiza.com.br; www.submarino.com.br; www.americanas.com.br

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Evaldo Ferreira

é repórter do Jornal do Commercio
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